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Adenomiose: apesar de frequente, a doença ginecológica é pouco conhecida
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A menstruação sempre foi associada à dor. Não conheço mulher em idade reprodutiva que nunca tenha tido ao menos um episódio de cólica menstrual mais intensa. No entanto, como a capacidade de suportar a dor é subjetiva, é difícil avaliar quando ela sinaliza problemas mais graves.
Por incrível que pareça, a menstruação ainda é tabu. Assim, são inúmeras as meninas e mulheres que sofrem em silêncio com dores e sangramentos intensos todos os meses, sem ter parâmetros para saber que, bem, sentir dor incapacitante ao menstruar não é normal.
A dismenorreia, termo médico para cólicas menstruais, principalmente quando acompanhadas de sensação de peso no baixo ventre, fluxo menstrual intenso e dor na relação sexual (dispareunia), pode ser sinal de adenomiose.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada dez mulheres apresentará adenomiose durante o período reprodutivo.
Apesar de frequente, a condição ginecológica ainda é pouco conhecida, e não é incomum que seja confundida com a endometriose, doença inflamatória que guarda semelhanças com a adenomiose e pode ocorrer concomitantemente a ela.
Para compreender ambas, primeiro é preciso uma breve introdução acerca da anatomia do útero, um dos órgãos mais importantes do aparelho reprodutor feminino. O útero tem formato de pêra, e sua parte externa é constituída de uma espessa camada de musculatura lisa, o miométrio. Sua cavidade interna é revestida por uma mucosa chamada endométrio, que sofre as alterações mensais do ciclo menstrual e onde, em caso de gravidez, o óvulo fertilizado se implanta.
Todos os meses, na fase logo após a menstruação, o endométrio, sob a ação do estrogênio, se torna mais espesso, preparando-se para receber o óvulo fertilizado e nutrir o embrião. Quando a gravidez não ocorre, entra em ação outro hormônio feminino, a progesterona, que faz com que o endométrio se desprenda do útero e seja eliminado com o sangue menstrual.
Na adenomiose, as células do endométrio se infiltram no miométrio, causando dores fortes, fluxo intenso, ciclos menstruais prolongados e irregulares e, em casos mais avançados, dificuldade para engravidar.
Tanto a adenomiose quanto a endometriose são caracterizadas pela presença de células do endométrio fora do interior do útero. Na adenomiose, como foi explicado, as células se encontram no miométrio; na endometriose, há presença de endométrio em outros órgãos, como ovários, bexiga e intestino. Na linguagem leiga, podemos dizer que as doenças são "primas".
Essas células do endométrio que migram para outras regiões, como no caso da adenomiose e da endometriose, continuam sofrendo a ação dos hormônios femininos, por isso as duas condições costumam provocar dor pélvica.
Como os sintomas não são específicos, ambas as doenças são subdiagnosticadas: estima-se que pacientes levem até 8 anos para conseguir o diagnóstico correto. Isso significa, muitas vezes, anos de dores intensas, tentativas frustradas de engravidar, idas a diversos especialistas diferentes, exames desnecessários, gastos consideráveis e um grande impacto na qualidade de vida dessas mulheres, o que afeta seus relacionamentos afetivos e sexuais, sua vida emocional e social e a produtividade na escola e no trabalho.
De um modo geral, tudo que envolve a saúde ginecológica costuma ser tabu. As queixas de dor são pouco valorizadas pelos profissionais de saúde: ainda hoje é comum escutarmos que sentir cólica intensa é assim mesmo, que ser mulher dói. Muitas de nós também acreditam nisso e acabam deixando de valorizar a dor durante a menstruação ou a relação sexual.
Como falamos pouco sobre menstruação, mulheres com fluxo muito intenso nem sempre identificam o problema, pois não sabem o quanto de sangue é considerado normal perder mensalmente.
Além disso, o diagnóstico da adenomiose e da endometriose é feito por meio do ultrassom transvaginal ou ressonância magnética pélvica, exames que, para sua realização, exigem profissionais qualificados que nem sempre estão disponíveis em todos os centros de saúde do Brasil.
O que fazer, então? A primeira atitude é observar o próprio corpo. Não é normal sentir dor durante o sexo, não é normal sentir cólicas incapacitantes, não é normal deixar de realizar as atividades diárias porque está menstruada.
Depois, procurar um médico, que pode ser o médico de família ou ginecologista, e relatar os sintomas e sua intensidade. Diga que suspeita que algo não vai bem. Não deixe que diminuam suas queixas.
Apesar de ainda existirem profissionais de saúde que subestimam os sintomas, hoje a maioria dos ginecologistas está preparada para identificar os casos suspeitos e encaminhá-los corretamente.
Existem tratamentos, como a suspensão da menstruação por meio de pílulas ou dispositivos intrauterinos hormonais, que aliviam muito os sintomas. O que não podemos é aceitar viver com dor.
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