Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
A humanidade está prestes a dar a segunda mordida na maçã
Depois de 59 artigos, este é o último texto que escrevo em minha coluna no UOL. Para finalizar esse mergulho intenso na filosofia da saúde integral e no treinamento consciente, hoje o assunto é o corpo e sua relação com a saúde mental e a espiritualidade.
Vida é movimento. Sendo assim, estar em movimento representa estar em sintonia com a própria vida. O nosso corpo se transforma em um caminho profundo de conexão e espiritualidade quando nos integra à energia vital do universo, este mistério que dá vida a tudo, a que chamamos de Deus.
Como isso ocorre, efetivamente? Sempre que realizamos atividades corporais equilibradas que exigem atenção plena, que necessitem de toda a nossa atenção e concentração, desligamos automaticamente nossa mente, o ego e o sentido de "eu". Esse é o conceito daquilo que atualmente chamamos de moviment meditation.
Quando a nossa mente está funcionando a todo vapor, nós nos desconectamos do todo, entramos em um mundo virtual que nos tira do momento presente, o mundo dos pensamentos, expectativas, angústias e ansiedades.
Eu ando pelas ruas e vejo uma geração de jovens sem corpo. Como o celular e a internet raptaram o foco e a atenção, o próprio corpo foi ficando cada vez mais esquecido. Junte a isso, a cultura do "corpo perfeito" que transforma tudo aquilo que temos de mais precioso em apenas um objeto de consumo, uma simples finalidade estética, e você irá entender o drama do corpo contemporâneo.
O computador é uma prolongação da nossa mente, a materialização de um mundo virtual, que veio nos desconectar efetivamente do mundo natural à nossa volta.
Isso representa, atualmente, o maior risco à saúde física e à sanidade mental já vivido por nossa espécie. O celular e o computador prometem nos afastar definitivamente do mundo natural, representando, para a humanidade, a segunda mordida na maçã, e assim, segunda a conhecida parábola bíblica, seremos expulsos pela segunda vez do paraíso (mundo natural).
Não é incrível pensar que uma maçã mordida seja o principal símbolo e berço dessa transformação virtual? O nosso corpo é o nosso refúgio, a nossa materialidade, o que nos mantém conectados e integrados com o mundo natural. O nosso corpo é sagrado porque ele é a própria materialização do milagre da vida.
O nosso corpo é sagrado porque ele é a nossa antena com o divino
Os nossos ossos possuem um efeito "piezoelétrico", isso quer dizer que são incríveis condutores de eletricidade. Eles funcionam como uma antena, permitindo-nos conectar e acessar diferentes energias, ondas e formas de vibrações.
Só podemos experimentar a espiritualidade através do corpo. Somente quando entramos em um modo de funcionamento corporal e mental específico, seja através da respiração, da meditação, da reza ou da meditação em movimento, ativamos estímulos e hormônios essenciais, que desligam a nossa mente e nos conectam, automaticamente, à natureza, à fonte primordial a qual chamamos de Deus.
Aquela história bíblica sobre nossa expulsão do paraíso ao morder a maçã do conhecimento é uma parábola, uma fábula que tenta resumir a nossa realidade. Não é à toa que na Bíblia a mente racional é simbolizada por uma cobra.
A cobra é entendida em certas culturas como um ser perigoso, traiçoeiro, ela nos enreda, enrola-se em torno de nós, nos domina e nos paralisa, ela pode nos esmagar. Porém, em muitas culturas, como no caso dos hindus ou do povo do antigo Egito, a cobra é vista como um ser divino.
Curioso, já que o método Cobra surge como uma forma efetiva de desligar a mente (a cobra traiçoeira que nos enreda) e nos reconectar com a nossa própria essência.
A inteligência e o conhecimento nos trouxeram, como um custo adicional, a perda da nossa inocência e naturalidade. Cada vez mais separados do mundo natural, tentamos refazer esta ligação através da religião e da espiritualidade.
Os animais não precisam de religião porque vivem conectados à natureza de uma forma permanente. O significado da palavra religião nada mais é do que "religar", refazer essa conexão com o divino.
Portanto, o que seria o estado de epifania, de júbilo, o sentimento de conexão com o Todo, tão propagado nas religiões de todo o mundo?
Efetivamente, isso ocorre porque fazer orações ou entoar mantras são formas de meditação que desligam a mente, o sentido isolado do "eu", e nos conecta com o Todo, com o universo integrado a nossa volta. No catolicismo, unimos as mãos quando rezamos. O conceito é básico em todas as formas de meditação, já que perdemos muita energia através das mãos, que representam, aliás, uma forma de terapia curativa por si só.
Não devemos lamentar esta perda do paraíso. Essa é a nossa realidade. E, assim como tudo na vida, existem vários aspectos positivos em torno dessa realidade. Criamos um mundo novo, cheio de infinitas possibilidades; criamos a música, a dança, os livros, o cinema e todas as formas de arte e expressão. O homem é um animal extremamente criativo. Criamos um novo universo a partir do nosso próprio universo particular.
Podemos e temos potencial para criar universos infinitos durante nossa existência. Por meio do livre-arbítrio, cabe a nós determinarmos como faremos uso de todo esse poder enquanto vivermos.
Chegamos ao fim da estrada, agradeço o carinho e a audiência durante todo esse percurso!
Para aqueles que se sentirão órfãos desse espaço de reflexão e contracultura, sugiro um mergulho em meu livro, um estudo sobre treinamento consciente e saúde integral que durou 12 anos, chamado, "O músculo da alma, a chave para a sabedoria corporal", veja um resumo: https://nunocobrajr.com.br/livro/.
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