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Paola Machado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Lipoaspiração: por que 'ser emagrecido' não tem efeito tão duradouro

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Imagem: iStock

Colunista do VivaBem

08/04/2022 04h00

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A ideia de remover gordura rapidamente e sem esforço atrai muita gente para a lipoaspiração. No entanto, evidências científicas (e observações à nossa volta) revelam que o efeito pode não ser tão relevante, nem duradouro.

De acordo com a Mayo Clinic, a lipoaspiração é um procedimento cirúrgico que utiliza uma técnica de sucção para remover gordura de áreas específicas do corpo, como abdome, quadris, coxas, nádegas, braços ou pescoço. A lipoaspiração também "molda" (contorna) essas regiões.

Vale reforçar que, normalmente, a lipoaspiração não é considerada um método geral de emagrecimento ou uma alternativa de perda de peso. Se você está acima do peso, é possível ter bons resultados de emagrecimento com uma rotina disciplinada, alimentação regrada e prática de exercícios (tudo orientado por especialistas) —entretanto, cada caso deve ser avaliado individualmente e, para determinadas pessoas, procedimentos bariátricos podem ser recomendados.

O procedimento de lipoaspiração é indicado se a pessoa tiver muita gordura corporal em pontos específicos (a tal da gordura localizada), mas, por outro lado, é preciso ter um peso corporal "normal" e estável.

Quando você ganha peso, as células de gordura aumentam de tamanho e volume. Por sua vez, a lipoaspiração reduz o número de células de gordura em uma área específica. A quantidade de gordura removida depende da aparência da área e do volume de gordura. As mudanças de contorno geralmente são permanentes —desde que o peso corporal permaneça estável e o indivíduo organize sua rotina de alimentação e exercícios.

Após o procedimento, é esperado um pouco de dor, inchaço e hematomas. O cirurgião pode prescrever medicamentos para ajudar a controlar a dor e antibióticos para reduzir o risco de infecção. Pode haver introdução de drenos temporários para promover a drenagem do fluido. Além disso, é necessário utilizar cintas de compressão, que ajudam a reduzir o inchaço, por algumas semanas; e ainda realizar drenagem linfática, para redução de edema e prevenção de fibrose.

Será que há mesmo necessidade? Será que funciona e é uma estratégia duradoura?

De acordo com o pesquisador e doutor Paulo Gentil, um estudo realizado por pesquisadores do Colorado com mulheres que possuíam distribuição desproporcional de gordura na parte inferior do abdome, quadril e coxa mostrou que, uma lipoaspiração de pequeno porte (menos que 5 litros), houve redução de 2,1 pontos no percentual de gordura, após 6 semanas. Mas o percentual de gordura aumentou após 6 meses e voltou ao normal após um ano (12 meses depois).

Além disso, as análises de cada segmento revelaram que a gordura não retornou por completo na coxa e quadril, mas retornou —com sobras— no abdome.

O corpo parece ter 'gravado' em sua memória um determinado percentual de gordura e, se não der para voltar em um local, ele compensa em outro —e a região do abdome parece ser especialmente favorável para isso. O problema é que esse acúmulo também ocorreu na gordura visceral e o grupo que fez lipoaspiração teve a tendência em acumular mais gordura nessa região que o grupo controle. Isso é preocupante, dadas as associações da gordura visceral com problemas metabólicos e cardiovasculares. É importante reforçar que as participantes tinham o peso estável, nunca foram obesas e possuíam hábitos saudáveis.

Gentil reforça que "retirar gordura por intervenções externas não deve ser visto como um procedimento salvador. É necessário promover modificações sustentáveis no metabolismo, para que o corpo entenda que não precisa daquela gordura. Isso também não as torna inúteis, pois ela pode ser usada em casos específicos para fazer correções que não foram alcançadas por dieta e exercício, especialmente na região do quadril e coxas".

Mas é possível direcionar a perda de gordura para determinada região com dieta e treinamento?

Gentil pontua que há alguns pontos interessantes, pois "sabemos que a gordura da região glúteo femoral é muito resistente, principalmente nas mulheres, que têm baixa resposta lipolítica e uma meia-vida mais longa. Sendo assim, é uma região que há muita dificuldade na redução de gordura e, se essa diminuição ocorrer, será uma das últimas".

Já sobre a gordura localizada nas extremidades, existem evidências controversas. Gentil diz que seu grupo fez um estudo recente, em que analisaram um desenho contra lateral e não se percebeu um favorecimento de uma ou outra região. Alguns outros estudos sugerem que os treinos intervalados de alta intensidade reduzem o percentual de gordura na região central, principalmente a intra-abdominal, ou seja, àquela que pode prejudicar a saúde.

Outro ponto que o pesquisador reforça é que "existem características do tecido adiposo e suas particularidades hormonais, como o hormônio masculino impede o acúmulo de gordura na região glúteo femoral, pois a testosterona desativa a atividade da proteína lipase na região. Por esse motivo que os homens têm o quadril mais estreito". Por isso, temos que levar em conta a individualidade.

Posso ainda adicionar alguns estudos sobre essa questão. Um estudo com pessoas que realizaram apenas exercícios voltados para a musculatura abdominal por seis semanas não encontrou redução na gordura da região. Outro estudo que acompanhou mulheres com sobrepeso e obesidade por 12 semanas mostrou que o treino de abdominal não teve efeito na redução de gordura na barriga, em comparação com a intervenção dietética isolada.

Um estudo focado na eficácia do treinamento de resistência da parte superior do corpo teve resultados semelhantes. Este trabalho de 12 semanas incluiu 104 participantes que concluíram um programa de treinamento que exercitava apenas os braços não dominantes. Pesquisadores descobriram que, embora tenha ocorrido alguma redução de gordura, ela foi generalizada —para todo o corpo—, não somente para braço exercitado. Vários outros estudos tiveram resultados semelhantes, concluindo que o trabalho local não é eficaz para utilizar a gordura em áreas específicas do corpo.

Foque sempre na sua alimentação e na prática regular de exercícios físicos. Tenha como propósito melhorar sua saúde em geral, pois, com certeza, terá mudanças positivas na sua composição corporal por um todo. "Se a gordura não saiu após fazer dietas malucas, não é o caso de se fazer lipo e, sim, é o caso de começar a fazer a coisa certa!", afirma Paulo Gentil.

*Colaboração de Paulo Gentil, doutor em ciências da saúde, professor de educação física, sócio da franquia Personal e pesquisador e autor de best sellers sobre emagrecimento e hipertrofia.

Referências:

- Mayo Clinic. Liposuction. Disponível em: https://www.mayoclinic.org/tests-procedures/liposuction/about/pac-20384586

- Hernandez T.L., Kittelson J.M., Law C.K., Ketch L.L., Stob N.R., Lindstrom R.C., et al. Fat redistribution following suction lipectomy: defense of body fat and patterns of restoration. Obesity, 19 (2011), pp. 1388-1395

- Campillo, R.R.; Andrade, D.; Clemente, F.M.; Afonso, J.; Pérez-Castilla, Alejandro; Gentil, P. A proposed Model to test the hyphotesis of exercise-induced localized fat reduction (spot reduction), including a systematic review with meta-analysis. Human movement. 23(3):1-14. 2022.

- Schulz, T.J.; et al. Brown-fat paucity due to impaired BMP signalling induces compensatory browning of white fat. Nature. 2013 Mar 21;495(7441):379-83. doi: 10.1038/nature11943. Epub 2013 Mar 13.

- Mekary, R.A.; et al. Weight training, aerobic physical activities, and long-term waist circumference change in men. Obesity (Silver Spring). 2015 Feb;23(2):461-7. doi: 10.1002/oby.20949. Epub 2014 Dec 19.

- Schugar RC, et al. (2017). The TMAO-producing enzyme flavin-containing monooxygenase 3 regulates obesity and the beiging of white adipose tissue.