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Paulo Chaccur

REPORTAGEM

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Anemia não tratada pode afetar a saúde cardiovascular; entenda como

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Colunista de VivaBem

19/03/2023 04h00

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A anemia é o nome genérico de uma série de condições caracterizadas pela deficiência nos níveis de hemoglobina, uma proteína presente nos glóbulos vermelhos (também conhecidos como hemácias), responsável pela coloração vermelha do sangue. É dela também a função de transportar e distribuir o oxigênio por todo o corpo. E é aí que mora o perigo.

Como consequência da falta de hemoglobina no organismo, tecidos e órgãos sofrem com a baixa oxigenação, gerando diversos sintomas, complicações e danos.

Uma anemia não tratada pode ocasionar do cansaço progressivo aos mínimos esforços a questões cardíacas e até neurológicas.

Apesar de ser a causa mais frequente, engana-se quem acredita que a anemia tenha a ver somente com a escassez de ferro. Na realidade, o problema surge, especialmente, em decorrência de uma doença de base, condição de saúde ou carência nutricional.

O que leva a um quadro de anemia?

A OMS define anemia como um nível de hemoglobina abaixo de 13,0 g/dL para os homens e de 12,0 g/dL entre as mulheres.

Um quadro anêmico pode ser motivado por diferentes razões que levem a falta de produção ou taxas elevadas de destruição de glóbulos vermelhos ou ainda a perda de sangue expressiva. A condição pode ser temporária ou de longo prazo, e sua gravidade em geral varia dependendo do que a motivou.

Os fatores que podem levar à anemia incluem:

  • acidentes
  • cirurgias e sangramentos gastrintestinais (que provoquem perda expressiva e acelerada de sangue)
  • períodos menstruais intensos
  • gravidez
  • úlceras
  • pólipos ou câncer no cólon
  • desordens hereditárias
  • distúrbios do sangue e metabólicos
  • doenças autoimunes
  • insuficiência de um ou mais nutrientes --além do ferro, podemos destacar também a vitamina B9 (ácido fólico) e a B12

Uma anemia não tratada pode afetar o coração

Tomemos como exemplo a anemia mais comum, aquela provocada por falta de ferro, denominada ferropriva —estima-se que 90% das anemias sejam causadas pela carência do mineral devido a condições que impedem sua absorção ou por uma dieta deficiente.

O ferro está presente em muitos alimentos e é absorvido no corpo através do estômago. O organismo precisa dele para produzir a hemoglobina.

Sem hemoglobina não há o transporte adequado de oxigênio pelo sangue, um dos nossos mais importantes mecanismos biológicos. E é do coração a função do bombeamento e distribuição sanguínea. Quando há problemas na oxigenação, o órgão começa a trabalhar mais depressa para suprir essa necessidade e garantir o fornecimento a todas as células do corpo. Ou seja, passa a ser mais exigido.

Esse aumento do esforço, em médio e longo prazos, pode afetar seu funcionamento, desencadear problemas mais sérios e levar a resultados ainda piores em pessoas que já tenham questões cardiológicas.

A resposta do corpo à anemia pode resultar em:

  • aumento da espessura do músculo cardíaco
  • dilatação do coração
  • batimentos anormais e acelerados (taquicardia)
  • e, por consequência, em uma insuficiência cardíaca --quadro em que o coração é incapaz de bombear sangue suficiente para o corpo

A anemia e a insuficiência cardíaca

A anemia e a insuficiência cardíaca estão, portanto, relacionadas: pessoas com insuficiência correm mais risco de anemia e vice-versa. Pesquisas indicam que um quadro anêmico é comumente observado em pacientes com insuficiência cardíaca.

De acordo com um estudo publicado na revista Circulation (2018), a anemia, particularmente por deficiência de ferro, é bastante comum nesses pacientes, com taxas de incidência variando de 30% entre indivíduos estáveis a 50% no grupo que inclui os hospitalizados por insuficiência cardíaca. E uma das explicações vem do que ocorre nas funções cardíaca e renal.

O rim também é afetado

Quando o coração não é capaz de bombear sangue como deveria, os órgãos do corpo não recebem oxigênio suficiente, levando a consequências danosas. Uma delas é a insuficiência renal ou doença renal crônica, cenário em que os rins não conseguem filtrar o sangue adequadamente.

A função renal debilitada provoca então a redução de eritropoietina (EPO), hormônio sintetizado nos rins responsável pela criação dos glóbulos vermelhos.

Portanto, a insuficiência cardíaca leva à disfunção renal, e a disfunção renal leva a baixos níveis de EPO, o que pode causar anemia.

E essa relação não acaba por aí. Há outros caminhos nos quais a insuficiência cardíaca gera um quadro anêmico. Evidências sugerem, por exemplo, que a insuficiência cardíaca grave leve à ativação pró-inflamatória de citocinas (ativação de moléculas inflamatórias que acionam o sistema imunológico).

Situação que tem como possível resultado o desenvolvimento da anemia por doença crônica com utilização defeituosa de ferro, diminuição da produção de eritropoietina e doença da medula óssea —que, por sua vez, também causa anemia grave.

Riscos de um infarto

Em um estudo, publicado na revista científica Frontiers in Cardiovascular Medicine (2021), pesquisadores examinaram 960 pacientes com doença arterial coronariana para investigar como a anemia afeta os casos de quem tem o problema no coração: os resultados apontaram que 17% tinham anemia e ela estava associada a uma maior gravidade da doença, pior função cardíaca e mais eventos adversos, tais como ataque cardíaco e acidente vascular cerebral.

Outra pesquisa, realizada com 193 homens, pelo SUNY Downstate Medical Center (Nova Iorque/EUA) apontou que as pessoas com anemia apresentam um risco maior de infarto do miocárdio após dois anos do surgimento de uma síndrome coronariana aguda. O estudo —publicado no American Journal of Cardiology— ainda revelou que os pacientes com a doença coronária manifestaram uma probabilidade 86% maior de morrer no período de dois anos, quando comparados com homens que não apresentavam anemia.

Quais os sinais mais comuns?

No início, a anemia pode ser tão leve que o indivíduo nem perceba, no entanto, os sintomas pioram conforme o quadro se agrava.

Os mais importantes sinais da anemia aguda (uma queda súbita das hemoglobinas na circulação) são provocados pela redução no volume de sangue circulante. O principal deles é a queda da pressão arterial.

Nas anemias crônicas (ou seja, aquelas de maior duração), a baixa na produção de hemoglobina causa ainda:

  • palidez cutânea e nas mucosas
  • fraqueza generalizada
  • fadiga e cansaço
  • sonolência
  • falta de ar e dificuldade para recuperar o fôlego
  • dor ou desconforto no peito
  • batimento cardíaco rápido ou anormal
  • sensação de frio (especialmente nas mãos e pés)
  • problemas de memória e concentração
  • falta de apetite
  • dores de cabeça
  • tontura

Esteja atento

Como esses sinais são comuns a várias outras questões de saúde, só uma avaliação clínica e exames laboratoriais mais detalhados podem dar o diagnóstico preciso de um quadro anêmico.

O tratamento pode variar de acordo com o que motivou a condição e gravidade do problema —e vai desde mudanças na dieta e suplementação de ferro ou vitaminas do complexo B até procedimentos médicos, como o transplante de medula óssea.

Herança genética, crianças e adolescentes em fase de crescimento, gestantes, idosos, mulheres com fluxo menstrual intenso, pessoas que seguem dietas restritivas ou pobres em nutrientes, pacientes com doenças crônicas, autoimunes ou que causam sangramentos estão no grupo de maior risco e precisam ter atenção redobrada aos sinais da anemia.