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Paulo Chaccur

REPORTAGEM

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Existem profissões perigosas ao coração? Como o trabalho afeta o órgão

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Imagem: Unsplash

Colunista de VivaBem

30/04/2023 04h00

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Embora a maioria das pessoas não associe as doenças cardíacas com os riscos ocupacionais, certas características de alguns tipos de trabalho podem elevar os riscos de ataques cardíacos e outros problemas relacionados à saúde cardiovascular.

Fatores como longas jornadas, excesso de pressão, muitas horas sentado, rotina estressante, horário irregular e exposição a produtos químicos ou poluição podem trazer consequências prejudiciais ao coração.

Vamos começar por um dos pontos mais críticos: o estresse!

Quando pensamos em um emprego estressante, a lista que vem à cabeça geralmente é extensa. Isso porque diversos tipos de trabalho podem apresentar diferentes níveis de estresse —que variam também de acordo com as características e percepção individual de cada um.

Dependendo do grau, há interferência na qualidade do sono, na prática de exercícios físicos, no consumo de álcool e medicamentos, no tabagismo, na alimentação, entre outros aspectos que são considerados fatores de risco para o coração.

O estresse no trabalho, quando presente de forma constante, estimula a produção de hormônios, como a adrenalina, responsável por aumentar o ritmo da respiração e da frequência cardíaca, alterando a pressão arterial.

Outra substância que passa a ser produzida em excesso é o cortisol, o chamado "hormônio do estresse", capaz de elevar o nível de insulina, o que causa desequilíbrio em todo o sistema metabólico. O cortisol também pode levar a uma resposta inflamatória no organismo que predispõe problemas no coração.

O quadro como um todo incita a evolução de uma aterosclerose (acúmulo de placas de gorduras nas paredes das artérias), a ocorrência de arritmias e da doença arterial coronariana, podendo desencadear até um infarto do miocárdio ou AVC (acidente vascular cerebral).

Enquanto os outros dormem...

De modo geral, nós não estamos adaptados para nos mantermos ativos cotidianamente durante a noite e dormir de dia.

Estimativas apontam que quem trabalha em período noturno tem cerca de 30% mais risco de apresentar problemas cardíacos. Uma das explicações é a falta ou a má qualidade do sono, uma vez que quem dorme durante o dia sofre a influência de diversos estímulos, como claridade e barulhos.

Essa privação do sono pode gerar cansaço, mau humor, estresse e irritabilidade, além da elevação da pressão arterial e até uma predisposição à obesidade, aumentando o trabalho do coração e a possibilidade de aparecimento de doenças cardíacas.

Entre os muitos exemplos que cabem aqui, podemos citar: garçons, bartender, seguranças, porteiros, motoristas, profissionais da área de tecnologia e da saúde.

Trabalhar durante a noite pode perturbar o nosso ciclo circadiano, o popular relógio biológico, que, além de regular o metabolismo e nos induzir a dormir, também participa do processo de reparação das nossas células —expostas ao estresse, poluição e outros elementos prejudiciais.

Ficar muito tempo sentado

Mulher trabalho computador - iStock - iStock
Imagem: iStock

Permanecer muito tempo sem movimentar o corpo pode estimular o ganho de peso, faz mal para a coluna, dificulta a circulação do sangue, aumenta o risco de varizes e ainda pode complicar a saúde cardíaca.

Ao permanecer horas sentado, a tendência é o corpo inchar, especialmente os membros inferiores, uma vez que o fluxo sanguíneo até os pés fica reduzido. A posição faz as veias dilatarem e exercerem mais pressão para bombear o sangue.

Nesses casos, o retorno do sangue dos pés ao coração é mais difícil. Além do inchaço, também é comum sentir desconforto nas pernas ao levantar, como se estivessem mais pesadas.

Portanto, para empregos como de recepcionistas, pessoas que desempenham funções em escritório ou que precisam passar longas jornadas em frente ao computador e até os motoristas profissionais (de ônibus, caminhões, táxis, etc), a recomendação é fazer pausas e, de tempos em tempos, dedicar alguns minutos para movimentar o corpo, nem que seja uma breve caminhada.

No caso dos profissionais que atuam no trânsito, há ainda mais agravantes: além da tendência ao sedentarismo ligado à ocupação, eles precisam estar o tempo todo alertas para evitar acidentes e, em alguns casos, manter os passageiros seguros, o que pode gerar níveis elevados de estresse. Isso sem falar da poluição a que são expostos, especialmente ao trafegar pelas grandes cidades.

Altos níveis de atividade física

O inverso também pode ser danoso. Um estudo realizado com cerca de 17 mil trabalhadores nos EUA indicou que as pessoas com altos níveis de atividade física no trabalho, especialmente levantando e carregando peso, estão mais propensas a ter doenças cardiovasculares.

A atividade física realizada no emprego é potencialmente diferente para a saúde quando comparada com o exercício feito fora do trabalho.

Uma hipótese que explica isto é que quando nos exercitamos durante o tempo livre, "estressamos" o organismo por períodos específicos, permitindo a recuperação do corpo. As atividades realizadas no trabalho muitas vezes não dão esse tempo suficiente de recuperação por serem constantes e rotineiras.

Longas jornadas e ritmo intenso

Ser produtivo é bom, mas trabalhar 24 horas por dia leva a exaustão e até a um possível burnout. Pesquisa de instituições renomadas como a OMS e a OIT (Organização Internacional do Trabalho) revela o impacto da carga e ritmo intenso de trabalho na saúde (estudo publicado na revista científica Environment International).

Segundo o levantamento, a cada ano, 750 mil pessoas morrem de doenças cardíacas isquêmicas (a doença arterial coronariana) e AVC, devido às longas jornadas de trabalho —definidas como 55 horas ou mais por semana. E o principal vilão nessa história é o estresse, que, como relatado acima, provoca uma série de consequências à saúde do coração.

Outra pesquisa, realizada pela Universidade do Texas (EUA), aponta que ultrapassar 45 horas semanais trabalhando durante 10 anos, eleva em 16% as chances de desenvolver problemas cardíacos. A experiência crônica do estresse associado às longas horas de trabalho pode levar a casos de depressão e crises de ansiedade —ambos fatores que também interferem no funcionamento do sistema cardiovascular.

Assédio moral

Assédio moral por chefes feministas - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Viver uma situação de assédio moral constante no ambiente de trabalho é mais um dos fatores que eleva os riscos de problemas cardiovasculares, segundo pesquisa publicada no European Heart Journal. Isso porque novamente esse cenário propicia o aumento dos níveis de estresse crônico, de colesterol ruim (LDL), da proteína C reativa e da pressão sanguínea.

O levantamento revelou que quem trabalha em um ambiente no qual o assédio moral de chefes e colegas é constante tem um risco 59% maior de sofrer doenças cardíacas em comparação aos que não foram expostos a nenhum tipo de bullying ou assédio.

Já a probabilidade de ter um AVC é 40% mais alta. E aqui não podemos esquecer a saúde mental: casos de assédio podem desencadear crises de ansiedade e depressão, entre outras questões relacionadas à saúde mental e que interferem igualmente no funcionamento do coração.

Atividades radicais: na ficção e na vida real

Alguns trabalhadores enfrentam no dia a dia momentos de adrenalina, tensão e ação. São profissões de alto risco, marcadas por uma rotina que envolve saltos, voos, perseguições, alta velocidade, exposição à altura e ao fogo. Podemos citar os dublês, policiais e bombeiros, por exemplo.

Estimativas apontam que cerca de 22% das mortes no trabalho em policiais e 45% em bombeiros acontecem em decorrência de doenças cardiovasculares —em comparação com 15% em outros empregos (pesquisa publicada no site health.com).

São funções que combinam a inatividade com episódios de altos picos de estresse —como o combate ao crime ou a incêndios. Situações extremas que podem provocar a hipertensão e aumentar o risco de arritmias cardíacas, doenças coronarianas, aterosclerose, infarto e AVC.

O que fazer?

Nem todo mundo tem a opção de reduzir a jornada de trabalho, mudar de emprego ou até de ramo de atividade, mas é preciso achar saídas, pois uma hora o corpo pode mandar a conta —e nem sempre ele dá sinais antes de um acidente vascular cerebral ou ataque cardíaco fatal. Por isso, a dica é: concentre-se nos fatores de risco que você pode controlar.

Procure cuidar da saúde mental, evitar hábitos prejudiciais (como consumo de álcool e o tabagismo), investir em uma alimentação de qualidade, manter a prática de exercícios físicos, ter boas noites de sono na maioria dos seus dias, reservar espaço na rotina para atividades e momentos de lazer e com que você gosta.

Ter um hobby, por exemplo, ajuda a tirar a mente do trabalho e relaxar. Além disso, mantenha os cuidados e o monitoramento da sua saúde em dia, com a realização de avaliações médicas e exames de rotina.