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Paulo Chaccur

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Fazer jejum intermitente é saudável? Entenda riscos e benefícios ao coração

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Imagem: iStock

Colunista de VivaBem

18/06/2023 04h00

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Se você já pesquisou sobre dietas e maneiras de eliminar quilos extras, provavelmente deve ter lido ou ouvido falar sobre o jejum intermitente. De uns anos para cá, a prática ganhou mais adeptos e passou a ser adotada especialmente por pessoas que desejam perder peso rápido. Mas será que a proposta do jejum intermitente é realmente essa? E a que custo para a saúde?

A estratégia de emagrecimento

Esse plano alimentar sugere alternar períodos de jejum com o de consumo de alimentos. E para isso, há diferentes métodos, que variam conforme a periodicidade e duração dos intervalos de jejum e janelas de alimentação.

Exemplificando, é possível fazer o jejum em dias alternados, isto é, você faz as refeições típicas em um dia e jejua ou come bem pouco no dia seguinte.

Ou ainda ter a alimentação com restrição de horário, como fazer jejuns diários por algumas horas e ter uma janela de alimentação com duração determinada —entre elas a de 16 (horas de jejum)/8 (horas de alimentação) e 12/12.

Normalmente, durante o jejum intermitente apenas água e bebidas não calóricas (como chás e café sem açúcar) podem ser ingeridas. No entanto, de modo geral, não há uma orientação específica sobre o que comer ao terminar o tempo determinado. Para muitos adeptos, o jejum intermitente, portanto, se resume apenas a quando comer e não a o que consumir.

De onde vem a energia para o funcionamento do corpo durante o jejum?

A ideia do jejum intermitente para quem busca emagrecer é forçar o corpo a utilizar suas reservas como principal fonte de energia nas atividades diárias, tendo como foco a diminuição da massa gorda. Isso porque o organismo está sempre em funcionamento, mesmo quando estamos parados ou dormindo. Precisamos de energia para tudo, até para respirar e pensar.

Quando nos alimentamos, damos ao corpo esse combustível através dos carboidratos, por exemplo, encontrados em grãos, cereais, frutas, legumes e açúcares.

Durante a digestão, eles são quebrados em glicose, que é usada como energia imediata.

A gordura (também conhecida como lipídio) presente em produtos de origem animal e vegetal é outra fonte.

Ao não comer nada, o corpo usa a energia que já está armazenada.

Em resumo, funciona assim: primeiro, o organismo busca a glicose; em seguida, vai começar a queimar a gordura e, por último, a proteína do músculo —considerada uma medida de emergência que pode levar à perda de massa muscular.

Para o coração, o jejum é benéfico ou prejudicial?

Existem muitas evidências sobre os impactos positivos do jejum intermitente na saúde do coração. Diversos estudos sugerem que a prática pode ter benefícios cardiovasculares, influenciando na melhora da sensibilidade à insulina, redução da pressão arterial, dos níveis de triglicerídeos e colesterol "ruim" (o LDL - lipoproteína de baixa densidade), além da diminuição do peso, circunferência abdominal e inflamação no organismo.

Entretanto, é importante ter em mente que o jejum intermitente é capaz de gerar efeitos colaterais ruins, entre deficiências e complicações, como:

  • hipoglicemia
  • baixa imunidade
  • desidratação
  • anemia
  • dor de cabeça
  • constipação
  • fome excessiva
  • irritabilidade
  • dificuldade de concentração
  • alterações no humor
  • desconforto físico
  • tonturas
  • fraqueza
  • fadiga

O jejum pode ainda levar a desequilíbrios nos níveis de eletrólitos no corpo —especialmente sódio, potássio, cálcio, magnésio e cloreto—, afetando negativamente o coração. Os eletrólitos são minerais que possuem carga elétrica e desempenham papel fundamental no equilíbrio dos líquidos e na função dos tecidos, incluindo os nervos e músculos.

A falta de potássio pode, por exemplo, causar fraqueza muscular, cãibras e alterações no ritmo cardíaco.

Precisamos considerar que essas descobertas são preliminares e nem todos estão de acordo com os resultados. Muitos dos estudos disponíveis até agora são observacionais e ensaios clínicos de curto prazo, com um número limitado de participantes.

Portanto, são necessárias mais pesquisas para compreender os efeitos do jejum intermitente na saúde cardiovascular. O que não deve, no entanto, nos fazer ignorar certos aspectos e sinais de alerta.

Emagrecer está entre as suas metas?

O fato é que nem sempre a forma escolhida para se alcançar esse objetivo é a melhor. Há quem sacrifique a saúde e até o processo de emagrecimento ao apostar em medidas drásticas. Quando o jejum intermitente é feito na busca de eliminar quilos extras, especialmente sem a orientação de um especialista, um dos maiores riscos é o famoso vai e vem na balança, o chamado efeito sanfona.

É claro que jejuando é possível perder peso rapidamente, mas a primeira consequência pode ser sua recuperação ainda mais veloz. Em grande parte dos casos, o problema é o que é ingerido após o jejum, quando a fome bate.

Muitos acabam optando por alimentos processados, cheios de gordura, sódio e açúcares. Assim, além da frustração em ver os quilos voltarem, é preciso estar atento aos riscos que isso pode trazer à saúde, inclusive do coração.

No início a perda de peso pode ser realmente significativa, no entanto, depois de um tempo esse ritmo tende a diminuir. O fato é que sem o planejamento correto para a conquista do resultado em longo prazo, o corpo acaba eliminando aquilo que não deveria e mantém o que era para eliminar.

Quem vence essa batalha?

O organismo, percebendo uma mudança radical na ingestão de alimentos, começa a agir de modo a proteger e reservar a energia necessária para manter o seu funcionamento. Ou seja, se emagrecer parece difícil, manter-se magro pode ser ainda mais desafiador!

Como reação a menor ingestão calórica, o corpo passa a lutar para voltar ao peso original. Estudos já mostram que o organismo reage quando há a eliminação de 5% a 10% do peso. É uma forma de tentar conservar o máximo de energia possível, inclusive na forma de gordura. Para isso, ele diminui a produção de hormônios que tiram o apetite e eleva a liberação daqueles que aumentam a fome.

Além disso, reduz a atividade metabólica e, por consequência, a queima de gordura passa a ser muito mais lenta.

Nesse processo, ocorre uma diminuição de massa muscular e de água nos tecidos.

Assim, quanto mais privação de calorias, mais ele ativa o "modo economia".

O número na balança diminui, mas não da maneira como deveria para se manter. Com o tempo e o retorno da alimentação menos restritiva, o ganho de peso será maior e mais rápido, causando o tal efeito sanfona.

E o coração nessa história?

O excesso da gordura que não foi eliminada com adoção da dieta radical pode acarretar em um processo inflamatório que leva à formação de placas nas artérias e ser responsável por gerar dislipidemia (presença de níveis elevados de gorduras no sangue), hipertensão arterial e aumento da resistência à insulina —quadro que pode provocar o descontrole permanente da glicose e o aparecimento do diabetes.

Em qualquer uma dessas situações, crescem os riscos do surgimento de uma doença arterial coronária ou cerebrovascular, como o AVC.

No caso do efeito sanfona, o impacto pode ainda gerar alterações na saúde emocional, levando a depressão, ansiedade e distúrbios alimentares, cenários que também interferem no agravamento ou desenvolvimento da doença coronária e vascular cerebral.

Transtornos alimentares

Os transtornos alimentares, como anorexia e bulimia, surgem de modo geral a partir desses comportamentos e atitudes extremas relacionadas à alimentação. Como vimos, o organismo precisa de combustível, conquistado especialmente na forma de alimentos, que são quebrados em glicose e circulam por todo corpo através da corrente sanguínea —isso sem mencionar os nutrientes, vitaminas e demais substâncias ingeridas através das refeições.

Cada célula depende desse fornecimento para seguir trabalhando. Assim como o coração. O órgão é a bomba que nos mantém vivos, o motor que alimenta todos os outros sistemas. Porém, também necessita de energia. Por isso, distúrbios alimentares podem ser extremamente prejudiciais ao sistema cardiovascular.

Ao limitarmos o fornecimento de comida ou exigências nutricionais mínimas diárias, como é frequente em casos de certos transtornos restritivos, o corpo percebe —e, como explicado acima, reage e passa a operar em modo de conservação.

A restrição alimentar pode levar, entre outras questões, ao aumento do tônus vagal e a bradicardia (redução do ritmo de batimentos do coração), hipotensão ortostática (queda excessiva da pressão arterial), síncopes, arritmias, insuficiência cardíaca congestiva e até a morte súbita.

Quanto mais grave ou duradouro for o transtorno alimentar, maior a probabilidade de complicações sérias.

Jejum intermitente não é uma dieta milagrosa

Portanto, é preciso ficar claro que não existe uma maneira milagrosa de emagrecer rapidamente sem riscos. O ideal é incorporar na rotina novos hábitos tanto no que diz respeito à alimentação quanto em relação a atividades físicas. Boa parte dos benefícios apontados do jejum intermitente para a saúde cardiovascular são conquistas de quem já segue uma dieta equilibrada há um tempo e têm hábitos alimentares saudáveis.

Além disso, esse tipo de prática pode não ser adequado a todos. Em geral, não é recomendado para crianças, idosos, gestantes e mulheres amamentando, além de indivíduos que estão abaixo do peso, tenham algum distúrbio ou histórico de transtorno alimentar, questões de saúde mental, diabete e certos problemas preexistentes, como cardíacos.

Cada pessoa é única, e o que funciona para um pode ser extremamente prejudicial a outro organismo.

Por isso, se você está considerando adotar o jejum intermitente, é recomendável conversar com um profissional de saúde, como um médico ou nutricionista, que possa avaliar sua situação e histórico clínico e fornecer orientações seguras e adequadas às suas necessidades individuais.