Pedra no rim causa dor intensa; hábitos de vida e dieta podem preveni-la
A grande fama das pedras nos rins —ou cálculos renais—, enfermidade também chamada de litíase urinária, decorre da dor que ela pode causar. Aguda, em cólica e intensa, ela é descrita como uma sensação pior do que o parto natural.
O que a maioria das pessoas não sabe é que, em boa parte dos casos, esses cálculos não apresentam sintomas, e o famoso mal-estar só aparece quando eles se deslocam em direção ao ureter.
Considerada a doença mais comum do sistema urinário, as pedras nos rins afetam cerca de 12% da população mundial, e nos últimos anos tem-se observado um aumento de sua prevalência, especialmente nos adultos com idades entre 20 a 49 anos, embora possam também se manifestar na infância e adolescência.
Em 80% dos casos, essa enfermidade é o resultado da formação de cristais de oxalato de cálcio, relacionados a determinadas enfermidades, hábitos de vida e composição da urina. Muitos desses quadros podem ser tratados por meio de medidas simples como mudanças na dieta e determinadas práticas e uso de fármacos específicos.
Já a cirurgia só tem indicação nas situações mais graves ou quando os cálculos não são eliminados espontaneamente.
O que são pedras nos rins ou cálculos renais?
A sua urina é um composto formado de água e uma série de outras substâncias. Algumas delas podem predispor à formação de pedras, como o cálcio, o ácido úrico e o sódio; outras, são protetoras, como o citrato e o magnésio, que atuam para evitar que elas se formem.
O desequilíbrio desses elementos tem como resultado a agregação de cristais que se transformam em estruturas sólidas —conhecidas como cálculos ou pedras— que poderão ser encontrados em três segmentos das vias urinárias: rins, ureteres (canais que ligam o rim e a bexiga) ou bexiga.
A depender de seu tamanho esses cálculos podem levar à obstrução do sistema excretor renal e até à perda de suas funções se houver demora na desobstrução.
Conheça os vários tipos
Os cálculos podem variar em formato, cor e tamanho. A maioria das pessoas, ou seja, 80% delas, incluídas as crianças, apresentam pedras compostas por oxalato ou fosfato de cálcio.
Elas também podem ser formadas por outras substâncias. Confira:
- Ácido úrico
- Estruvita ou fosfato amoníaco magnesiano (associados a infecções)
- Cistina (menos comum e mais frequente entre os jovens)
Existem ainda os cálculos mistos e os decorrentes do uso de alguns medicamentos, como determinados antibióticos e drogas antirretrovirais.
Por que isso acontece?
As causas mais comuns e os fatores de risco para a manifestação desse problema se relacionam a determinadas enfermidades como, por exemplo, o hiperparatireoidismo, doenças inflamatórias intestinais e obesidade, além de histórico familiar (ou pessoal) e a composição da urina.
Conheça as outras possíveis origens do problema:
- Baixo consumo de líquidos
- Excessos na dieta (proteína, sal)
- Problemas metabólicos (gota, síndrome metabólica, diabetes, hipertensão)
Quanto ao histórico pessoal, quem já teve um primeiro episódio de litíase urinária tem 15% de chance de novo evento no primeiro ano, e 50% em 5 anos.
Quem está mais suscetível?
O problema pode acometer pessoas de qualquer idade, inclusive na infância e adolescência. É mais frequente nos homens, mas atualmente tem sido observado um aumento de sua incidência entre mulheres e crianças.
Ainda não existe uma explicação estabelecida para isso, mas a hipótese é que hábitos da vida moderna expuseram o grupo feminino aos mesmos fatores de risco observados entre os homens.
Entre os pequenos, o aumento do número de casos, nos últimos 10 anos, tem sido atribuído à dieta, baixa ingesta de líquidos e excesso de sais, em especial o sódio, bem como o maior acesso ao diagnóstico.
Saiba como reconhecer os sintomas
Quando a litíase urinária se limita ao rim, geralmente ela é assintomática, isto é, não apresenta sinal algum. Mas ela pode se manifestar das formas que você vê a seguir:
- Dor intensa e aguda em cólica, intensa, aguda e irradiada dos rins (região lombar) para a virilha (neste caso a pedra está migrando para os ureteres) - e pode ser também associada a náusea e vômito;
- Sangue na urina (visível ou identificado por meio do exame de urina);
- Infecção urinária (pode estar associada a febre e calafrios, que caracterizam a pielonefrite aguda e indicam maior gravidade).
Nas crianças, em geral, há pouco ou nenhum sintoma. Quando há queixa de dor, muitas vezes, o problema só é descoberto após a investigação por meio de exame de imagem.
Quando é a hora de procurar ajuda?
Na maioria dos casos, o quadro que apresenta dor aguda não é possível ser controlado com o uso de analgésicos em casa. Trata-se de uma situação emergencial que requer a ida ao pronto-socorro para controle da dor (analgesia) e diagnóstico.
Fora o caso agudo, os sinais de alerta que indicam a necessidade imediata de uma avaliação médica é o sangue na urina, ou mesmo uma infecção urinária.
Os especialistas treinados para avaliá-lo são o urologista ou o nefrologista. Na infância, a avaliação inicial deve ser feita pelo pediatra.
Como é feito o diagnóstico?
Na hora da consulta, o médico vai ouvir sua queixa, levantar seu histórico de saúde e fará o exame físico.
O diagnóstico geralmente é feito por meio de exames de imagem, como a radiografia do abdome, ultrassonografia e tomografia de vias urinárias.
O urologista Antonio Corrêa Lopes Neto, coordenador do Departamento de Litíase Urinária da SBU-SP e integrante do corpo clínico do HCor-SP, explica que, em ambiente de pronto-socorro, após o controle da dor, a tomografia é sempre solicitada porque ela permite visualizar todas as vias urinárias.
Considerado completo, o exame mostra a posição da pedra e ainda traz outras informações precisas como o seu tamanho e dureza. Contudo, Lopes Neto adverte que este exame deve ser feito com critério, especialmente entre pacientes que já sabem que têm a doença.
"Por mais avançado que seja o equipamento, ele emite radiação. Nas possíveis recidivas, essas pessoas poderiam se expor aos efeitos deletérios dela ao longo da vida, o que teria um efeito cumulativo indesejável. A ultrassonografia é a opção para a avaliação inicial. Já a tomografia deve ser reservada aos diagnósticos não conclusivos".
Outros possíveis exames a serem solicitados são os de sangue, urina e urocultura —que investigam infecções associadas e eventuais prejuízos à função renal.
Como é feito o tratamento em crianças?
De acordo com o médico Alberto Araújo, especialista em urologia pediátrica e professor da UFPE, o objetivo do tratamento é sempre a eliminação do cálculo. Ele explica que a sua permanência, com o passar do tempo, propiciaria o aumento de seu volume, o que levaria ao processo obstrutivo e à infecção.
Araújo afirma que, entre as crianças, a conduta é sempre expectante, isto é, deve-se esperar pela eliminação de cálculo, porque os pequenos têm maior facilidade para esse fim.
"Para facilitar o processo, indica-se o aumento da ingesta de líquidos e ainda podem ser utilizados medicamentos como o analgésico e o alfabloqueador —que relaxa o ureter e a pelve renal— facilitando a saída da pedra", acrescenta.
Em casos mais complexos, a fragmentação dos cálculos pode ser obtida com o auxílio de ondas de choque, o que é feito por meio de uma técnica não invasiva conhecida como LECO (Litotripsia Extracorpórea por Ondas de Choque).
Conheça o tratamento entre adultos
Nesse grupo, com exceção dos casos agudos, a estratégia terapêutica abrange a educação do paciente sobre a importância de acompanhamento médico e orientações sobre os cuidados para afastar o risco da formação de novos cálculos e infecções urinárias.
O tratamento medicamentoso dependerá das causas e do tipo de cálculo. Por exemplo, para aqueles cuja origem do problema é o ácido úrico, podem ser indicados o citrato e o bicarbonato de sódio, porque eles reduzem a acidez da urina.
Além disso, são usados medicamentos que controlam a concentração do composto no sangue. Já para os casos de cálculos de estruvita, os antibióticos são necessários para controle da infecção.
Quando o cálculo ureteral é pequeno, não esteja trazendo complicações e nem dor, a conduta é aguardar a eliminação espontânea por algum tempo. Nesses quadros, para auxiliar no processo, pode ser indicado o alfabloqueador.
Grande parte dos formadores de cálculos serão beneficiados com o citrato de potássio —que aumenta a solubilidade do cálcio e reduz sua agregação com outros elementos formadores de pedras— e a hidroclortiazida, que diminui a quantidade de cálcio na urina.
Quando a cirurgia é indicada?
A intervenção cirúrgica tem indicação nos quadros em que as pedras são mais volumosas e dificilmente serão eliminadas espontaneamente, bem como nas situações nas quais o cálculo esteja obstruindo a via urinária e trazendo complicações.
As técnicas cirúrgicas utilizadas hoje são as endourológicas. Pouco invasivas e sem cortes, elas utilizam laser ou fibras óticas para acessar as vias urinárias, como a ureteroscopia e a cirurgia renal percutânea.
Nos últimos anos, a LECO teve sua indicação reduzida, dado o desenvolvimento das técnicas endourológicas. No entanto, ela permanece como uma boa opção para cálculos nos rins não muito volumosos.
O papel da dieta
Faz parte do tratamento clínico realizar mudanças no estilo de vida com a adoção de hábitos saudáveis como a prática de exercícios físicos para combater a obesidade —porque ela predispõe à formação de pedras—, além de dieta balanceada que deve incluir frutas, legumes, verduras e redução do consumo de proteína animal e sal.
As explicações são de João Estrela, integrante da equipe de urologia do Hospital Municipal de Salvador e Hospital Geral Ernesto Simões Filho.
"Outros itens a serem evitados são os que contenham oxalatos, como espinafre cozido, beterraba, cacau em pó, pimenta, macarrão com molho de tomate, biscoitos de soja e nozes. Outra boa conduta é consumir de forma equilibrada alimentos ricos em cálcio", sugere o especialista.
Além disso, a hidratação é essencial. Capriche na ingestão de líquidos —pode ser água, água de coco, sucos como o de maracujá, melão, laranja e limão (ricos em citratos)—, além de chás. Só não vale a cerveja, que leva à desidratação.
A quantidade ideal é a que permite urinar cerca de 2 litros ao dia. A urina deve ser bem clara e diluída, o que revela a boa hidratação. Caso note que ela está mais concentrada e amarela, aumente o consumo de líquidos.
Devem ser evitadas as bebidas gaseificadas —ricas em oxalatos e sódio, bem como os sucos adocicados.
O que esperar do tratamento e possíveis complicações
Mesmo sabendo das chances de repetição do quadro (recidivas), a adesão ao tratamento é baixa, e mesmo após um evento traumático. Porém, quando a terapia é seguida de forma correta, os resultados levam à redução da dor e da necessidade de internação e cirurgia.
Nas situações nas quais a intervenção cirúrgica seja necessária, o resultado terapêutico do procedimento geralmente é muito eficiente, com baixa morbidade. É bom saber que pedras maiores podem levar a intervenções mais longas e trabalhosas.
Por vezes é indicada mais de uma intervenção para a resolução completa do cálculo. Já as pedras menores, na maioria das vezes, requerem apenas uma cirurgia.
Consideradas seguras, essas intervenções têm baixíssimos índices de complicações, mas quadros infecciosos são muito temidos e devem ser monitorados.
Uso de suplementos
Aos formadores crônicos recomenda-se bom senso no consumo de suplementos típicos de academia, que podem combinar cálcio, creatina, líquidos energéticos, proteína e se somam aos demais nutrientes consumidos na dieta do dia a dia.
Antes de aderir a eles, leia os rótulos para saber da quantidade de sais minerais, principalmente o sódio. O ideal é sempre consultar seu médico para saber se esses itens poderiam potencializar a formação de pedras.
Dá para prevenir?
A prevenção se resume em reduzir as chances da formação de cálculos, o que pode ser feito por meio das mudanças de hábitos de vida acima indicadas, além do acompanhamento médico que poderá associar o uso de medicações específicas, a depender do seu tipo de pedra.
Fontes: Antonio Corrêa Lopes Neto, urologista, integra o corpo clínico do HCor (SP), professor de urologia do Centro Universitário FMABC (Faculdade de Medicina do ABC) e coordenador do Departamento de Litíase Urinária da SBU-SP (Sociedade Brasileira de Urologia de São Paulo); Alberto Araújo, médico especialista em urologia pediátrica, professor da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e chefe da disciplina de cirurgia pediátrica da mesma instituição; João Estrela, médico especialista em cirurgia geral e urologia, integrante da equipe de urologia do Hospital Municipal de Salvador e Hospital Geral Ernesto Simões Filho, é também docente da Unime-Salvador (União Metropolitana de Educação e Cultura). Revisor técnico: Antonio Corrêa Lopes Neto.
Referências: Nojaba L, Guzman N. Nephrolithiasis. [Updated 2020 Aug 10]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2021 Jan-. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK559227/.
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