Como funciona a técnica que põe pacientes de covid-19 de bruços
Procedimento é feito em muitos casos graves de covid-19 que precisam de uso de respirador.
É uma cena que se repete em hospitais de todo o mundo diante da pandemia: dezenas de pacientes em leitos, conectados a respiradores artificiais, enquanto são atendidos por profissionais de saúde protegidos por roupas e máscaras especiais.
Em meio a tantas imagens, é possível encontrar algo curioso: muitas das pessoas com covid-19 estão deitadas de bruços. Por quê?
É uma técnica antiga que provou ser eficaz no combate a doenças respiratórias graves.
Conhecida como "posição de bruços", ela começou a ser administrada com crescente frequência nos milhares de pacientes vítimas da pandemia tratados em unidades de terapia intensiva.
Este método ajuda as pessoas a aumentar a quantidade de oxigênio que entra nos pulmões, explica o professor de medicina pulmonar e terapia intensiva Panagis Galiatsatos, da Faculdade de Medicina da universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos.
"Muitos dos pacientes com coronavírus não têm boa oxigenação nos pulmões e isso os danifica. Damos oxigênio a eles quando estão internados, mas às vezes isso não parece ser suficiente" diz ele.
"Então o que fazemos é colocá-los de bruços para permitir que os pulmões se expandam novamente", diz ele.
O pesquisador explica que a parte mais pesada dos pulmões fica nas costas e se o paciente estiver de costas, a dificuldade em respirar será maior.
Maior fluxo sanguíneo
"A abertura dos pulmões na posição de pronação permite maior fluxo sanguíneo. A mudança é notável e a confirmamos com muitos pacientes", explica.
A técnica —também chamada de "pronação"— foi recomendada em março pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para pacientes com covid-19 que sofrem de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA).
"A ventilação mecânica em decúbito ventral (posição de bruços) é altamente recomendada em pacientes adultos com SDRA grave (...). Recomenda-se ventilação mecânica em decúbito ventral por 12 a 16 horas por dia", afirma a organização.
Quais são os riscos da pronação?
No entanto, o que parece ser um procedimento simples pode ser demorado na prática, porque mudar uma pessoa doente de posição pode ter uma série de complicações.
"A obesidade é uma das maiores preocupações. Cuidados também devem ser tomados com pessoas com lesões no peito. E é preciso ter cautela caso o paciente tenha um tubo de respiração ou um cateter no pescoço", explica Galiatsatos.
A OMS ressalta que, para executá-lo com segurança, "é necessário um número suficiente de profissionais experientes".
"Não é fácil. São necessárias de quatro a cinco pessoas para fazer isso de forma eficaz", acrescenta Galiatsatos.
Ele conta que, pela primeira vez, o Centro Médico John Hopkins criou uma equipe dedicada à pronação.
"Dessa forma, se os pacientes com covid-19 estiverem em uma unidade de terapia intensiva onde a equipe não está acostumada a executar esse procedimento, eles ligam para a equipe especializada que colocará o paciente na posição", diz ele.
Estudos iniciais
Mas de onde vem esse método?
Acredita-se que os benefícios da pronação tenham sido observados pela primeira vez em meados da década de 1970. Mas só em 1986 a prática realmente se expandiu.
Um dos médicos que liderou os primeiros estudos foi o italiano Luciano Gattinoni, que atualmente trabalha como professor emérito na Università Statale em Milão e é considerado autoridade em anestesiologia e reanimação.
Ele e a equipe começaram a usar essa técnica regularmente e a publicar estudos científicos que sustentam seus benefícios.
Em conversa com a BBC, o pesquisador afirma que, a princípio, esse método "teve muitas objeções", já que a comunidade médica é "muito conservadora", mas agora é amplamente utilizado.
O italiano também explica que a pronação não é apenas eficaz porque facilita uma maior oxigenação dos pulmões, mas também porque "na posição de bruços as forças são distribuídas no pulmão de maneira mais homogênea".
"Pense em um pulmão sujeito à energia mecânica do respirador, é como se fosse continuamente chutado. Obviamente, quanto mais essa força é distribuída uniformemente, menos danos ela causa", diz ele.
Surgiram outros estudos nos anos 2000 que deram mais evidências sobre da eficácia da pronação.
"Um estudo realizado na França em 2000 mostrou que os pacientes não apenas melhoraram sua oxigenação, mas também tiveram maiores chances de sobrevivência", Galiatsatos.
"Como ainda não temos uma cura contra esse coronavírus, até agora, o melhor que podemos fazer é aplicar terapias como essa", conclui o acadêmico da universidade Johns Hopkins.
*Com reportagem de Angelo Attanasio.
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