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Vacina contra coronavírus: como é a Soberana 01, fórmula que Cuba começa a testar

Nos últimos dias, a ilha começou a realizar uma média de cerca de 4 mil testes diários de coronavírus - Robson Mafra/AGIF/Estadão Conteúdo
Nos últimos dias, a ilha começou a realizar uma média de cerca de 4 mil testes diários de coronavírus Imagem: Robson Mafra/AGIF/Estadão Conteúdo

Boris Miranda

BBC News Mundo

24/08/2020 17h57

Cerca de 700 pessoas serão as primeiras a testar uma vacina contra o coronavírus que está sendo desenvolvida em Cuba.

Autoridades e cientistas da ilha — onde o impacto da covid-19 tem sido menor do que em outros países latino-americanos — fizeram o anúncio no dia 18 de agosto e batizaram o projeto de Soberana 01.

Se todas as fases de testes forem concluídas e se sua segurança e eficiência puderem ser provadas, essa pode ser a primeira vacina contra o coronavírus desenvolvida na América Latina.

Especialistas de diferentes institutos de saúde e ciência da ilha caribenha apresentaram a vacina cubana em uma reunião com o presidente Miguel Díaz-Canel há poucos dias.

A etapa de testes em humanos começará no dia 24 de agosto e em fevereiro de 2021 saberemos se Cuba acredita ter um produto biofarmacêutico para imunizar ou pelo menos minimizar os efeitos do coronavírus.

Os cientistas que desenvolveram a Soberana 01 estão otimistas, embora também existam vozes fora da ilha pedindo cautela.

Os testes

Vicente Vérez Bencomo, diretor do Instituto Finlay de Vacinas, com sede em Havana, explicou no dia 18 de agosto ao chefe de Estado cubano como a fórmula será testada em diferentes fases e que podem terminar em meados de fevereiro.

Os primeiros a receber a vacina terão entre 18 e 80 anos, e essa fase de testes em humanos vai até o final de outubro.

O recrutamento de voluntários começa hoje, com pessoas sem alterações clinicamente significativas e que atestem seu consentimento por escrito confirmando sua participação no estudo, detalha um relatório publicado no site do Registro Público de Ensaios Clínicos de Cuba.

Os participantes receberão duas doses da fórmula e o acompanhamento de sua evolução em "segurança, reatogenicidade e imunogenicidade" ficará a cargo do Instituto Finay.

Uma próxima etapa, cujo número de participantes não foi detalhado, acontecerá até janeiro de 2021. Cuba anunciará os resultados que a Soberana 01 produzirá até 15 de fevereiro.

Na maioria das vacinas atualmente em teste no mundo, as duas últimas fases de testes envolvem centenas e, às vezes, milhares de pessoas.

"Esse é o caminho a seguir. Conseguimos superar a primeira etapa em três meses. Uma etapa que, em termos de coronavírus, é uma etapa importante", disse Vérez Bencomo em entrevista à televisão cubana.

O cientista destacou que existem apenas 30 vacinas aprovadas para estudos clínicos e uma delas é a cubana.

Pelo menos 150 fórmulas de imunização estão sendo desenvolvidas em diferentes países para conter a pandemia.

Rússia e China registraram vacinas, embora ambas sejam questionadas por especialistas devido à rapidez do processo e à falta de testes massivos.

Os desafios de Cuba

Felipe Lobelo, especialista em epidemiologia e pesquisador da Universidade de Emory (Atlanta), reconhece que Cuba tem pontos fortes e, ao mesmo tempo, algumas limitações para tornar a Soberana 01 uma alternativa viável.

"Eles podem ter capacidade científica e tecnológica, mas outra coisa é desenvolver uma vacina que passe por todos os filtros de segurança e eficácia. Esses filtros exigem não só capacidade técnica e tecnológica, mas também logística", diz.

O médico acrescenta que o aspecto logístico pode ser onde Cuba tenha mais problemas, já que não faz parte dos circuitos públicos e privados entre governos e empresas farmacêuticas de todo o mundo.

"Há uma grande colaboração global e talvez Cuba tenha menos acesso a essas redes científicas", acrescenta.

Lobelo afirma que "não confiaria" em uma vacina que não foi testada pela primeira vez em milhares de pessoas e com os diversos estudos de segurança. Esse é o desafio que Cuba enfrenta, segundo ele.

E outro grande desafio que o entrevistado aponta é a busca por candidatos para realizar os testes, já que a população da ilha é comparativamente menor que a de outros países que estão trabalhando em suas fórmulas de imunização.

O pesquisador ressalta que é importante que existam diferentes fórmulas de vacinas, pois podem ter diferentes níveis de eficácia em grupos populacionais por idade, condições de saúde ou localização geográfica distintas.

A esse respeito, o cubano Vérez Bencomo afirma que Cuba tem experiência e capacidade para desenvolver uma fórmula para imunizar a população contra o coronavírus.

"Já tínhamos o conhecimento, sabíamos que tínhamos que 'pegar o facão' e competir pela vacina", disse ele à televisão cubana no dia 20 de agosto.

O cientista acrescentou que a "Soberana é a primeira (candidata) da América Latina e a primeira de um país pobre em recursos econômicos, mas grande em espírito".

"É também a razão pela qual temos tido sucesso", concluiu.

Soberana 01

No encontro com cientistas da ilha, Díaz-Canel lembrou uma reunião anterior que ocorreu em maio, na qual apresentou seus argumentos para que Cuba desenvolvesse sua própria fórmula.

"Embora existam vacinas de outros países, precisamos da nossa para termos soberania", disse.

Até 18 de agosto, Cuba relatou 3.482 infecções confirmadas e 88 mortes por covid-19 desde que o vírus chegou à ilha em março.

Nos últimos dias, a ilha começou a realizar uma média de cerca de 4.000 testes diários de coronavírus.

Os pacientes com covid-19 no país são tratados com medicamentos que, em sua maioria, são desenvolvidos ou produzidos pela indústria biofarmacêutica cubana.