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Covid-19: os pontos fracos e fortes das vacinas mais adiantadas

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Imagem: Getty Images

André Biernath

Da BBC News Brasil em São Paulo

19/11/2020 13h52

Com os anúncios recentes, a aprovação da primeira vacina contra o coronavírus parece estar mais próxima.

A comunidade científica recebeu com grande entusiasmo a notícia de que a vacina desenvolvida pelas farmacêuticas Pfizer e BioNTech atingiu os 95% de eficácia, não causou efeitos colaterais preocupantes e ainda foi capaz de oferecer uma boa proteção para pessoas com mais de 65 anos e de diferentes raças e etnias.

O anúncio se baseou numa análise com 170 voluntários dos testes clínicos de fase 3 que foram diagnosticados com covid-19. Ao comparar os resultados, os cientistas viram que a esmagadora maioria dos participantes infectados pertenciam ao grupo placebo, que tomaram doses de uma substância sem nenhum efeito terapêutico.

Isso significa, portanto, que aqueles que foram imunizados de verdade parecem ter ficado protegidos do Sars-CoV-2, o coronavírus responsável pela pandemia atual.

O estudo, que analisa mais de 43 mil indivíduos espalhados por África do Sul, Alemanha, Argentina, Brasil, Estados Unidos e Turquia, vai continuar por vários meses. Porém, em razão da urgência da pandemia, esses achados iniciais já servirão de base para que Pfizer e BioNTech peçam uma liberação emergencial de seu produto ao FDA, a agência regulatória dos Estados Unidos. De acordo com as empresas, essa requisição vai acontecer "nos próximos dias".

Mas essa candidata à vacina não é a única que está à beira da aprovação: em comunicado divulgado essa semana, o laboratório Moderna também garantiu que o seu imunizante possui uma taxa de eficácia de 94%.

Com esse avanço nas pesquisas, muita gente pode estar se perguntando: quais são os pontos fortes e os pontos fracos de cada competidor nessa corrida por uma vacina? Chegou a hora de conhecê-los.

BNT162 (Pfizer e BioNTech)

Pelo que sabemos até o momento, a vacina BNT162 é uma das mais adiantadas e deve ser aprovada nos Estados Unidos nas próximas semanas. Um de seus maiores diferenciais está no fato de que ela é baseada em RNA.

Em resumo, esse produto contém uma pequena sequência genética criada em laboratório que "ensina" as próprias células do corpo humano a produzirem proteínas parecidas com o Sars-CoV-2. A partir daí, o sistema imune reconhece a ameaça e cria uma resposta que protege o organismo de uma futura infecção.

É preciso ponderar que os resultados anunciados por Pfizer e BioNTech ainda precisam ser publicados em algum periódico científico para serem avaliados por especialistas independentes.

Se eles forem realmente consistentes, representarão uma mudança de paradigma na ciência: essa seria a primeira vacina genética da história.

Mas qual a vantagem disso? Em primeiro lugar, elas são muito mais fáceis e rápidas de serem produzidas. As exigências de laboratório e equipamentos são menores em comparação com os imunizantes que temos até o momento.

O maior ponto negativo por aqui está na necessidade de manter as doses numa temperatura de menos 70 °C para evitar que a substância perca seu efeito. Isso pode se tornar um grande empecilho em regiões remotas ou muito quentes.

Em entrevistas recentes, os representantes da Pfizer disseram que estão pensando em soluções e tecnologias para garantir essa temperatura tão baixa, que chega a ser mais fria que o inverno da Antártica.

Outro problema seria a disponibilidade desse imunizante no Brasil. Por ora, não há nenhum acerto para compra ou transferência de tecnologia ao país. Mesmo se o governo brasileiro e as duas empresas fecharem um acordo, as primeiras doses só chegariam aqui a partir do primeiro trimestre de 2021, uma vez que outras nações já garantiram os primeiros lotes.

mRNA-1273 (Moderna)

Essa candidata também integra o grupo das vacinas baseadas em RNA. O anúncio recente feito pela Moderna se baseou em 95 participantes dos testes clínicos que foram diagnosticados com covid-19. Os resultados mostram que 90 deles eram do grupo placebo, o que permitiu estipular a taxa de eficácia de 94%.

Há outras boas notícias relacionadas a essas primeiras boas-novas: o imunizante não provocou eventos adversos dignos de nota e gerou uma resposta consistente do sistema imunológico mesmo em idosos ou indivíduos com doenças crônicas. Por fim, ele também parece prevenir contra quadros grandes de covid-19, que necessitam de internação e intubação.

Antes de pedir a aprovação, a farmacêutica precisa aguardar mais um pouquinho para completar a meta de 150 eventos (ou 150 participantes do estudo que pegaram covid-19) para ter dados mais robustos. Isso deve acontecer nas próximas semanas.

Em comparação com o concorrente de Pfizer e BioNTech, o produto da Moderna tem a vantagem de um armazenamento a menos 20 °C. Essa é uma temperatura muito mais fácil de garantir com os congeladores e freezers que temos atualmente.

Não há muitas informações sobre a possível chegada dessa vacina ao Brasil. Um caminho para obter o produto pode ser o Fundo de Acesso Global à Vacina para a Covid-19 (Covax), criado pela Organização Mundial da Saúde com o objetivo de distribuir doses aos países menos desenvolvidos. Nosso país faz parte da iniciativa.

AZD1222 (Universidade de Oxford e AstraZeneca)

Testada no Brasil, essa candidata pertence ao time das vacinas de vetor viral não-replicante. Em resumo, ela foi construída a partir de um adenovírus, um tipo vírus que não prejudica nossa saúde. No interior dele, os cientistas inseriram alguns genes do Sars-CoV-2. Essa junção tem como objetivo suscitar uma reação do sistema imune.

A candidata está caminhando bem nos ensaios clínicos: as informações completas do estudo de fase 2 foram publicados nesta quinta-feira (19/11) no The Lancet e confirmam que o imunizante é seguro e não provoca efeitos colaterais graves, inclusive nos mais velhos. Outro destaque está no fato de que a aplicação das doses suscitou a produção de anticorpos, o que é um ótimo sinal.

Resta saber se essa produção de anticorpos está mesmo relacionada a um efeito protetor contra o vírus em si. Mas essa taxa eficácia só será conhecida na fase 3, cujos resultados preliminares estão programados para sair em breve.

Tanto o ponto forte quanto o ponto fraco da AZD1222 estão em seu ineditismo: até o momento, não existe nenhuma vacina aprovada que utiliza esse tipo de metodologia. Por um lado, isso pode dar certo e revolucionar o conhecimento da área. Por outro, é preciso aguardar os resultados com calma para ver a eficácia e a segurança do produto.

Uma vantagem da candidata desenvolvida pela Universidade de Oxford, na Inglaterra, e pela farmacêutica AstraZeneca está em sua disponibilidade. Há um acordo com o Ministério da Saúde para a compra e a transferência de tecnologia. O laboratório Bio-Manguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz, está sendo capacitado para fabricar e distribuir as doses pelo país.

No cenário mundial, os responsáveis por essa vacina garantem que terão a capacidade de entregar 3 bilhões de unidades ao longo de 2021. As empresas ainda não divulgaram a necessidade de refrigeração de seu produto.

CoronaVac (Sinovac)

Ela foi destaque nas manchetes da semana passada, após a paralisação dos testes clínicos no Brasil por causa da morte de um voluntário. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Instituto Butantan trocaram farpas numa série de notas e entrevistas coletivas.

Passados alguns dias da disputa, tudo acabou esclarecido (o óbito nada teve a ver com a vacina) e o estudo foi retomado normalmente.

Polêmicas à parte, a farmacêutica Sinovac apostou na estratégia do vírus inativado. Os cientistas utilizaram algum método, como calor ou substâncias químicas, para incapacitar o Sars-CoV-2, de modo que ele não cause infecção ou se replique dentro do organismo. Mesmo assim, quando aplicado numa vacina, ele é reconhecido pelo sistema imune, que cria uma resposta protetora.

O ponto forte aqui está na confiabilidade. A ciência trabalha com vacinas de vírus inativados há quase sete décadas. Então já se sabe muito bem como produzi-las e os principais problemas que podem aparecer pelo caminho.

Na contramão, o ponto fraco é a demora. A fabricação exige um rigor elevadíssimo e uma planta industrial mais equipada. A formulação também não rende muito em doses por litro.

O produto está na fase 3 de testes e espera completar o número mínimo de eventos (voluntários infectados com a covid-19) para calcular sua taxa de eficácia, como aconteceu recentemente com Pfizer/BioNTech e Moderna.

A refrigeração parece não ser um problema por aqui, já que outras vacinas de vírus inativados podem ficar numa geladeira convencional.

Outro ponto positivo é o acordo entre Sinovac e o Instituto Butantan, em São Paulo, que deve facilitar o acesso à CoronaVac no Brasil.

Sputnik V (Instituto de Pesquisa Gamaleya em Epidemiologia e Microbiologia)

Por muito tempo, a palavra que melhor definia a Sputnik V era mistério. As primeiras notícias vindas da Rússia, onde fica o Instituto de Pesquisa Gamaleya, já diziam que a candidata estava em fase avançada de pesquisas. Logo em seguida, ela foi aprovada pelo governo daquele país.

Os especialistas ficaram bastante apreensivos, pois os testes clínicos que garantem confiabilidade ao processo de pesquisa não haviam sido registrados ou publicados em qualquer periódico científico.

De lá para cá, muitas informações vieram à tona: a vacina é baseada no vetor viral não-replicante (o mesmo tipo da Universidade de Oxford/AstraZeneca) e está sendo testada em cerca de 40 mil voluntários em países como Rússia, Emirados Árabes Unidos e Belarus.

Numa dessas análises preliminares, os pesquisadores da Sputnik V revelaram uma eficácia de 92%, com base em 20 eventos registrados. É preciso esperar o estudo evoluir um pouco mais para que essa taxa seja consolidada.

Há especulações de que o imunizante não requer congelamento, mas essa informação ainda precisa ser confirmada.

O governo do estado do Paraná anunciou acordo com os russos há quase dois meses. O Ministério da Saúde também disse manter conversas a respeito da Sputnik V, mas sem definições por enquanto.

JNJ-78436735 (Johnson & Johnson)

África do Sul, Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Estados Unidos, México e Peru são os países onde a vacina da Johnson & Johnson é testada atualmente. São mais de 60 mil voluntários nesses países.

Baseada na tecnologia do vetor viral não-replicante (a mesma utilizada por Universidade de Oxford/AstraZeneca e Sputnik V), ela parece estar um pouco atrasada, uma vez que ainda não foram feitos anúncios de análises preliminares pela farmacêutica. A expectativa é que isso ocorra nas próximas semanas.

A principal vantagem aqui estaria nos números: uma parte dos estudos de fase 3 dessa candidata avalia uma única aplicação da vacina. As demais concorrentes carecem de duas doses para surtir efeito. Se esse esquema der certo, isso pode significar uma economia de bilhões e bilhões de dólares.

Até o momento, não foram oficializados acordos entre Brasil e Johnson & Johnson para a compra desta vacina contra a covid-19.

NVX-CoV2373 (Novavax)

Falamos aqui da representante mais avançada da classe das vacinas de subunidade proteica. Em vez de usar o vírus inteiro, ela foi desenvolvida a partir de um pedacinho do Sars-CoV-2 capaz de ativar uma resposta imune.

Em relação aos competidores listados anteriormente, o desempenho da Novavax demorará mais para ser conhecido. Uma parte dos estudos de fase 3 são realizados no Reino Unido com 15 mil voluntários, onde os resultados preliminares são aguardados para janeiro ou fevereiro de 2021.

Há uma outra parcela desta pesquisa que vai ser feita com dezenas de milhares de participantes nos Estados Unidos. Mas a etapa está prevista para começar apenas no final de novembro ou início de dezembro.

Como o produto da Novavax faz parte do Covax (aquele consórcio da OMS para compra e distribuição de doses aos países menos desenvolvidos), é possível que ela chegue ao Brasil em algum momento, se tudo der certo.

Ad5-nCoV (CanSino)

Também feita a partir de vetor viral não-replicante (a exemplo das candidatas de Universidade de Oxford/AstraZeneca, Sputnik V e Johnson & Johnson), ela foi aprovada emergencialmente para uso entre militares chineses, mesmo antes dos estudos maiores de segurança e eficácia.

Nos testes de fase 3, a Ad5-nCoV é atualmente aplicada em mais de 40 mil voluntários do Paquistão, da Arábia Saudita e do México.

São poucas as informações a respeito desta vacina. Portanto, é necessário aguardar os responsáveis para novos anúncios e novidades.

Covaxin (Bharat Biotech)

Desenvolvida na Índia, é uma das últimas candidatas a entrar na fase 3 dos testes clínicos. Assim como a CoronaVac, ela também utiliza vírus inativados em sua formulação.

Como dito anteriormente, há uma grande experiência mundial no uso dessa tecnologia, apesar de ela ser custosa e demorada quando comparada aos métodos mais modernos.

Os responsáveis pretendem recrutar mais de 25 mil participantes em território indiano. De acordo com uma reportagem da Reuters, a expectativa é que a distribuição das doses se inicie a partir de fevereiro de 2021.

Mais detalhes sobre a Covaxin devem ser divulgados em breve.