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Os riscos das lentes de contato dentais, moda entre famosos e jogadores de futebol

dente - Getty Images
dente Imagem: Getty Images

Bruna Alves - De São Paulo para BBC News Brasil

08/12/2022 19h26

Em geral, os laminados são indicados para casos específicos e considerados mais graves - para maioria dos pacientes, ortodontia e técnicas estéticas menos invasivas são tratamentos mais adequados

Sucesso entre famosos e jogadores de futebol, as lentes de contato dentais tornaram-se uma esperança para quem almeja ter um sorriso branco e uniforme rapidamente —mas não sem custo.

Além de ter preço elevado, a técnica não é indicada para qualquer pessoa e pode oferecer riscos se for realizada por profissionais pouco qualificados.

"As lentes são indicadas para correções de anatomia defeituosa dos dentes, como dentes conoides (em formato de cone), muito comum nos incisivos laterais superiores; dentes em forma de barril e microdentes, que dão um aspecto infantil e desproporcional ao adulto", explica o dentista Cláudio Ximenes, especialista em prótese dentária, implantodontia e estética.

De acordo com Ximenes, elas também são bem-vindas para pacientes com dentes mais escuros, cujo clareamento e outras técnicas não alcançaram o efeito desejado.

Além disso, alterações na textura por defeitos estruturais congênitos, fechamento de diastemas (dentes afastados) e correções após finalização do tratamento ortodôntico também são possíveis indicações.

Por outro lado, as lentes são contraindicadas para pacientes muito jovens, devido aos desgastes necessários para a realização do procedimento.

"Isso porque o dente, uma vez desgastado, não tem mais volta. Pacientes com grandes apinhamentos (dentes encavalados), também devem fazer o tratamento ortodôntico prévio e assim diminuir a quantidade de desgaste dos dentes", ressalta a dentista Viviane Valverde, especialista em dentística e estética e professora assistente no curso de Cirurgia Oral da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas (APCD Central).

Pessoas com bruxismo (hábito de apertar e ranger os dentes durante o sono), que roem unhas ou tampas de caneta também não devem aderir às lentes dentais.

'Não recomendo o procedimento para ninguém'

Contudo, o sorriso está intimamente ligado à autoestima, e nesse quesito as lentes têm conquistado um papel social importante.

Por isso, há um ano, mesmo sendo contraindicado pelo seu dentista, a paulista Julia de Oliveira Gratão, de 20 anos, colocou as lentes de contato com outro profissional.

Desde criança, além de ter um conoide, Julia se incomodava com o formato dos seus dentes que, segundo ela, eram desalinhados e muito pequenos. Ela usou aparelho ortodôntico duas vezes e eles ficaram ordenados, porém, a forma era a mesma.

Motivada pelas redes sociais e vários famosos que estavam fazendo o procedimento, ela começou a buscar dentistas no Instagram, fez orçamentos, juntou dinheiro e colocou as lentes.

"Eu levei um susto quando me vi pela primeira vez, porque a cor realmente faz muita diferença. E a lente de resina que coloquei eu não recomendo, porque ela é bem artificial. Mesmo assim, eu saí de lá me achando linda e tirei várias fotos", conta Julia.

"Mas, no outro dia, quando acordei e me olhei no espelho, eu me assustei de novo, e comecei a pesquisar uma forma de escurecer a lente para deixar com mais cara de dente", confessa.

O plano, contudo, não deu certo e a jovem permaneceu com os dentes extremamente brancos. Ela lembra que, inicialmente, chegou a sofrer bullying por causa da sua nova aparência. Esse porém, em pouco tempo, tornou-se o menor dos seus problemas.

"No começo eu não sentia quase nada, mas uns meses depois minha gengiva começou a sangrar e comecei a ficar com muito mau hálito. Eu escovava muito os dentes, usava enxaguante bucal, mas nada resolvia", recorda-se, lembrando que uma das lentes de um dente do fundo chegou a cair e ela não repôs novamente, por receio da dentista que fez o procedimento.

Por meio de buscas na internet, ela deduziu que estava com gengivite, diagnóstico confirmado por seu dentista pouco depois. Julia conta que não pesquisou quais eram os possíveis riscos e a dentista responsável pelo procedimento também não chegou a falar sobre isso. "Ela só me falou que a manutenção era a cada cinco anos e pediu para eu trocar a escova por uma que tivesse as cerdas finas", diz.

"Eu fui ao meu dentista, que era totalmente contra eu colocar as lentes, para fazer uma limpeza. Mas ele disse que não tinha como fazer e que primeiro eu tinha que tratar a gengivite. Daí ele passou um creme dental para eu usar provisoriamente e disse que quanto mais sangrasse, mais eu deveria usar esse creme e passar o fio dental. E recomendou que eu tirasse as lentes, porque se eu não conseguisse controlar a gengivite, ela iria virar uma periodontite", desabafa a jovem.

Entretanto, pensando no investimento financeiro e no quanto havia mudado de aparência, ela se recusou a seguir a orientação e, como consequência, sua rotina mudou drasticamente. Hoje, ela não pode deixar de escovar os dentes depois de nenhuma refeição, mesmo se estiver viajando ou fazendo um passeio.

Para onde vai, a escova e o fio dental precisam acompanhá-la para que o problema não se agrave e vire uma periodontite (que provoca a destruição dos tecidos periodontais e do osso alveolar).

"Eu uso esse creme dental até hoje, passo fio dental mais de cinco vezes por dia. Se eu pulo um almoço, quando vou escovar à noite já está sangrando. Então é uma limpeza que exige muito e qualquer vacilo já dá dor de cabeça. Não recomendo o procedimento para ninguém, você fica refém", afirma Julia.

Valverde explica que há muitos casos em que há a necessidade de remoção das lentes por trabalhos malfeitos, com excessos de materiais, infiltrações nas emendas das lentes com os dentes. E, tudo isso, segundo ela, ainda pode causar cáries, além de deixar o paciente frustrado.

"Essa remoção pode ser feita com desgastes das cerâmicas, resinas com brocas ou com aparelhos de lasers de alta potência que "derretem" o cimento que as colou no dente. Este último é um aparelho de custo elevado que vai onerar ainda mais o retrabalho", alerta a dentista, ressaltando que toda vez que se remove uma lente, é preciso colocar outra no lugar, pois o dente não será mais o mesmo após o desgaste que é feito na maioria dos casos.

"Há profissionais que prometem trabalhos sem desgastes prévios, porém, os casos em que isso é possível são muito raros e devem ser muito bem avaliados", orienta a professora da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas.

O que são as lentes de contato dentais?

São laminados que podem ser feitos com cerâmica ou resinas compostas. Elas têm esse nome popular justamente devido à sua espessura ultrafina, semelhante a uma lente de contato para os olhos. Contudo, a espessura do laminado, que será "cimentada" é atrelada a fatores individuais como, por exemplo, a cor do dente. "Se um dente é muito escurecido, ele vai necessitar de maior desgaste, para um laminado mais espesso mascarar esse escurecimento", explica Valverde.

O procedimento em si precisa ser bem planejado para diagnosticar qual a melhor indicação individualmente. Na maioria dos casos, há necessidade de desgaste dos dentes, para que não haja excesso de material restaurador, seja ele resina ou cerâmica. "Caso isso ocorra, o paciente terá problemas como a gengivite, mau hálito, cálculos dentais (tártaros)", alerta a especialista.

Após esses preparos, os dentes são moldados com materiais precisos à base de silicone ou escaneados em um processo digital. As cerâmicas são confeccionadas em laboratórios de próteses, utilizando esses modelos.

A chamada técnica direta permite que as lentes em resinas sejam feitas diretamente na boca dos pacientes. Isso pode baratear o processo, porém, o resultado depende muito mais da habilidade do dentista.

Em suma, quando bem indicado e realizado corretamente, os riscos são baixos e o trabalho fica bom. "Se for realizado dentro das indicações e com respeito às especificações técnicas de cada passo como os preparos adequados, moldagem, perfeita adaptação dos laminados aos dentes, cimentação e ajuste oclusal, os riscos são minimizados", diz Ximenes.

Mesmo assim, o paciente terá que ter alguns cuidados para evitar o surgimento de problemas, como manter a higiene bucal adequada e não morder/quebrar alimentos muito rígidos. Caso contrário, o paciente pode ter sensibilidade, dor e até a necessidade de tratamento de canal, gengivites, periodontites, mau hálito por acúmulo de sujeira e por aí vai. "É imprescindível deixar claro que a higienização diária por parte do paciente é tão importante quanto as visitas ao dentista para maior durabilidade dos laminados cerâmicos", pontua Ximenes.

As visitas ao dentista devem ser recorrentes?

De acordo com os especialistas, se estiver tudo bem, sem manchas nas emendas, gengivas sangrando ou sensibilidades excessivas, consultas semestrais ao dentista, ou seja, duas vezes por ano são suficientes para avaliação de polimentos e averiguar a presença de infiltrações nas emendas dos trabalhos.

Outro ponto importante de ser mencionado é que não existe um tempo pré-determinado para substituição das lentes de contato. "Normalmente, os laminados cerâmicos precisam de menos manutenção do que os feitos em resina", avalia Valverde.

Já os preços podem variar entre R$ 500,00 (feitos em resina) até R$ 3.000,00 (cerâmica) por dente. "Desconfie quando os valores são muito baixos", comenta a dentista. Por outro lado, ela diz que não é necessário colocar em todos os dentes? mas tudo vai depender do planejamento do sorriso com o profissional.

Por fim, pessoas que não têm indicação devem seguir a orientação de seu dentista. E a ortodontia, apesar de ser mais morosa, não deve ser menosprezada, pois problemas de oclusão podem acabar com o sucesso de qualquer tratamento estético.

"Eu sempre deixo claro que o tratamento não é brincadeira e não deve ser feito para que o paciente tenha os dentes ultra brancos, com aspecto de cerâmica sanitária, e sim que fique o mais natural possível em anatomia, cores e texturas, mimetizando os dentes naturais", conclui Ximenes.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63824258