Covid na China: 3 pontos-chave sobre o explosivo aumento de casos após fim de restrições
Desde a suspensão das rigorosas medidas de combate à covid na China, foi reportado um aumento de novas infecções --embora haja dúvidas sobre o número real de casos.
Os hospitais da China estão enfrentando uma forte pressão com o aumento no número de pacientes com covid-19 que dão entrada nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), de acordo com informações que chegam da nação asiática.
No início de dezembro, o governo de Pequim anunciou um relaxamento da sua política de covid zero —até então a mais rígida do mundo—, e começou a suspender os lockdowns obrigatórios e o extenso programa de testes, após uma série de protestos da população contra as restrições.
Com o fim dos testes obrigatórios, tornou-se impossível monitorar os novos casos no país, ao mesmo tempo que as autoridades chinesas têm dificultado a contagem de mortes por covid ao registrar nessa categoria apenas os óbitos causados por pneumonia ou insuficiência respiratória.
Em um relatório do Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China (CCD, na sigla em inglês) que vazou para a imprensa, as autoridades estimam que cerca de 250 milhões de pessoas foram infectadas nos primeiros 20 dias de dezembro.
No entanto, a Comissão Nacional de Saúde (CNS) da China reclassificou a covid-19, até então considerada uma doença do tipo A, para doença do tipo B —ou seja, que geralmente não representa uma ameaça à vida de pessoas saudáveis. Também anunciou no domingo (25/12) que não publicaria mais os números de casos.
A falta de informações oficiais levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) e alguns governos a exigir maior transparência de Pequim sobre novos casos, assim como a gravidade dos mesmos e o número de internações.
1. O que se sabe até agora?
O panorama completo não é muito claro. À censura que existe nos meios de comunicação, se soma a decisão do governo de não divulgar os números de novas infecções.
A imprensa estrangeira depende de depoimentos, fotos e vídeos postados nas redes sociais por usuários dentro da China para fazer sua cobertura.
Em alguns dos mais recentes, vemos cenas alarmantes nas emergências dos hospitais, com pacientes —muitos deles idosos— deitados em macas, lotando os corredores à espera de um diagnóstico ou de serem internados.
Um jornalista do jornal americano The Washington Post gravou um vídeo mostrando pacientes amontoados em corredor após corredor, com familiares parados perto deles, dificultando a passagem.
Esse contato próximo entre pacientes com covid e pessoas supostamente não infectadas poderia desencadear os casos.
De acordo com o jornal americano, a imprensa estatal chinesa informou que a unidade de emergência do Hospital Zhongshan, um dos principais da China, estava atendendo cerca de 1.000 pacientes por dia, entre 700 e 800 a mais do que na mesma época do ano passado.
Quando o governo chinês decidiu suspender as rígidas restrições para controlar a doença, os surtos já estavam aumentando. Mas, desde então, as infecções dispararam, aumentando a perspectiva de uma alta taxa de mortalidade entre os idosos.
A Comissão Nacional de Saúde pediu recentemente aos hospitais que convocassem os profissionais de saúde aposentados para ajudar na enxurrada de casos —e para substituir médicos e enfermeiros que foram infectados com covid.
Também existe a preocupação de que muitos hospitais não tenham mais estoques de medicamentos específicos para tratar a covid e estejam oferecendo apenas medicamentos contra sintomas específicos como tosse, disse ao jornal asiático The Strait Times, uma funcionária da farmácia de um hospital da cidade de Chengdu.
Além disso, a China deixou a desejar no seu programa de vacinação contra covid. E as vacinas que desenvolveu e produz são consideradas menos eficazes na proteção contra infecções graves do que as vacinas de mRNA usadas no resto do mundo.
2. Há quantos casos e mortes?
O número real de infecções por covid e mortes relacionadas é desconhecido porque as autoridades pararam de publicar os dados. A decisão foi anunciada no domingo passado pela Comissão Nacional de Saúde.
"Informações relacionadas à covid-19 serão divulgadas pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China para referência e pesquisa", afirmou a CNS em comunicado, sem dar mais detalhes.
Antes de tomar essa decisão, o governo de Pequim estava reportando cerca de 4 mil novos casos por dia e poucas mortes.
O baixo número de óbitos registrados pode ser devido à nova forma como as autoridades classificam as mortes por covid, atribuindo-as apenas às causadas por pneumonia ou insuficiência respiratória.
Em 21 de dezembro, o número oficial de mortos no mês era de apenas oito. Ao mesmo tempo, porém, os crematórios da capital enfrentavam dificuldades com o aumento de corpos que chegavam para cremação.
No relatório do Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China vazado para a imprensa, as autoridades estimam que quase 250 milhões de pessoas foram infectadas com covid-19 nos primeiros 20 dias de dezembro, após o relaxamento das rígidas restrições impostas desde 2020 para controlar a doença.
Os números foram revelados por Sun Yang, vice-diretor do CCD, em reunião a portas fechadas no dia 21 de dezembro, segundo informaram ao jornal britânico Financial Times as pessoas que vazaram a informação.
Sun Yang afirmou que seus cálculos incluíam 37 milhões de pessoas infectadas só no dia 20 de dezembro, acrescentando que a taxa de propagação da covid continuava a aumentar —e estimou que mais de metade da população de Pequim e Sichuan já estava infectada.
Alguns dias depois, em uma notícia incomum publicada por um jornal controlado pelo Partido Comunista da China, o diretor de saúde da cidade de Quigdao, que tem cerca de 10 milhões de habitantes, afirmou que estavam registrando até meio milhão de novos casos por dia.
A revelação inédita de que a onda de infecções não estava sendo refletida nas estatísticas oficiais foi rapidamente censurada e republicada sem os números.
Especialistas em saúde preveem que a China vai registrar pelo menos um milhão de mortes por covid em 2023. O Airfinity, site britânico especializado na pandemia, estima que pode passar de dois milhões.
3. O que dizem a OMS e a comunidade internacional?
A OMS manifestou "muita preocupação" com a evolução da situação na China e com as informações que indicam um aumento de casos graves da infecção.
O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse que pediu à China que compartilhe os dados sobre a gravidade da doença, as hospitalizações e a capacidade de suas UTIs.
Em seu comunicado, Tedros insistiu que a China deve realizar as investigações solicitadas para chegar a uma avaliação de risco completa da situação em campo.
Ele disse também que a OMS continuará a apoiar a China para que concentre seus esforços na vacinação das pessoas em maior risco em todo o país.
O diretor do programa de emergências da OMS, Mike Ryan, afirmou que eles fariam um apelo à China para que o país importe vacinas de mRNA, como as da Moderna e da BioNTech, que se mostraram mais eficazes contra a covid-19.
A China ainda não aprovou, no entanto, o uso dessas vacinas em sua população.
Entretanto, na última segunda-feira o governo chinês anunciou a reabertura das suas fronteiras e a suspensão do limite de voos para o exterior.
Menos de meia hora após o anúncio, as buscas na internet por viagens para os destinos mais procurados aumentaram 10 vezes em relação ao ano passado.
Mas os turistas chineses não terão livre acesso a todos os países.
As autoridades dos Estados Unidos anunciaram na quarta-feira (28/12) que todos os passageiros provenientes da China, Hong Kong e Macau vão precisar apresentar um teste de covid negativo para entrar no país com o objetivo de "desacelerar a propagação" do vírus.
O Japão, um destino popular para turistas chineses, anunciou que também vai exigir testes de covid negativos na chegada ou o submetimento a uma quarentena de sete dias.
Malásia, Taiwan e Índia também anunciaram restrições, e outros países estão cogitando fazer o mesmo.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/internacional-64115299
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