Guiné Equatorial detecta surto de marburg, vírus com alta mortalidade que preocupa OMS
Conhecido desde os anos 1960, o patógeno é transmitido a partir do contato com morcegos e causa uma febre hemorrágica grave. Ainda não há vacinas ou remédios para prevenir ou tratar a doença.
Guiné Equatorial confirmou no dia 13 de fevereiro o primeiro surto da doença causada pelo vírus marburg em seu território.
O país localizado na África Central identificou até o momento 16 casos e nove mortes. Todas elas foram registradas na província de Kie Ntem.
O marburg é um vírus da mesma família do ebola e tem uma alta mortalidade —em episódios anteriores, até 88% dos infectados morreram.
Conheça a seguir as principais características da infecção e qual o risco de o patógeno chegar ao Brasil —por ora, não há motivo para pânico.
O vírus e as formas de transmissão
O marburg pertence à família dos filovírus, a mesma do ebola.
Ele foi identificado pela primeira vez em 1967, ao causar um surto simultâneo em três cidades europeias: Marburg e Frankfurt, na Alemanha, e Belgrado, na Sérvia.
À época, a investigação mostrou que os indivíduos infectados trabalhavam em laboratórios de pesquisa e tiveram contato com macacos verdes africanos (Cercopithecus aethiops) que foram importados de Uganda e carregavam o agente microscópico.
Posteriormente, descobriu-se que os hospedeiros naturais do vírus eram morcegos frugívoros (que se alimentam de frutos) da espécie Rousettus aegyptiacus.
Nesses animais, o vírus parece não causar nenhum problema sério.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o contato com o patógeno acontece por meio da "exposição prolongada a minas ou cavernas habitadas por colônias dessa espécie de morcego".
Quando o vírus "pula" para um ser humano, pode acontecer a transmissão direta de uma pessoa para outra.
Nesses casos, o marburg se espalha por meio de sangue, secreções e os vários fluidos corporais de um indivíduo infectado.
O contato com o patógeno também ocorre por meio de superfícies e materiais que foram utilizados por alguém doente, como talheres ou roupas de cama.
Além de morcegos, macacos verdes africanos e seres humanos, o marburg também pode infectar os porcos. Pelo que se sabe até o momento, ele não afeta outros animais domésticos.
Sintomas e progressão da doença
A OMS estima que a incubação —o tempo entre o contato com o vírus e o início dos sintomas— varie entre 2 e 21 dias.
Os incômodos da infecção pelo marburg surgem de forma abrupta, com febre alta, fortes dores de cabeça, na barriga ou nos músculos e mal-estar.
Num período de sete dias, o paciente apresenta outras manifestações, como vômitos e diarreia. Em muitos casos, há perda de sangue por fezes, urina, saliva, secreções nasais e lesões na pele.
Até o momento, os maiores surtos relacionados ao vírus marburg foram:
- 1967, Alemanha e Sérvia: 29 casos e sete mortes;
- 1998-2000, República Democrática do Congo: 154 casos, 128 mortes;
- 2005, Angola: 374 casos, 329 mortes
- 2012, Uganda: 15 casos, quatro mortes;
- 2017, Uganda: três casos, três mortes.
Ao longo desses episódios, a taxa de fatalidade variou entre 24% e 88%.
Mais recentemente, a OMS também foi informada sobre casos pontuais da infecção na Guiné (em agosto de 2021) e em Gana (julho de 2022).
Ainda de acordo com a instituição, o surto registrado nos últimos dias na Guiné Equatorial está em investigação.
"Equipes foram acionadas para rastrear contatos, isolar pacientes e fornecer assistência médica às pessoas que apresentam sintomas da doença", diz a OMS em nota.
"Os esforços também estão em andamento para montar rapidamente uma resposta de emergência, com o acionamento de especialistas em epidemiologia, gerenciamento de casos, prevenção de infecções, laboratórios e comunicação de risco", completa o texto.
Para o virologista Fernando Spilki, professor da Universidade Feevale, no Rio Grande do Sul, todos esses episódios dos últimos anos demonstram que estamos num cenário de mudanças.
"O avanço da urbanização, das conexões internacionais e os próprios surtos recentes de ebola demonstram que a disseminação de vírus como o marburg ficou mais fácil", analisa.
"A novidade deste surto registrado agora é o fato de ele estar acontecendo na Guiné Equatorial. Isso indica que provavelmente a dispersão do marburg em hospedeiros silvestres é ainda mais ampla do que se conhecia", complementa.
Spilki teme que a situação se agrave e se aproxime do que aconteceu na epidemia de ebola, que ocorreu entre 2014 e 2016 na África Ocidental.
"Vamos ver o quanto vai se conseguir conter e evitar uma catástrofe sanitária. O que assusta é um cenário parecido ao do ebola, que levou a uma situação que não poderíamos imaginar", diz.
Prevenção e tratamento
Por ora, não existem remédios ou vacinas desenvolvidos especificamente contra o marburg.
Mas os testes estão em andamento. Diferentes grupos de pesquisa avaliam o uso de fármacos das classes dos anticorpos monoclonais e dos antivirais como possíveis tratamentos contra essa infecção.
Dois imunizantes aprovados contra o ebola —o Zabdeno (Ad26.ZEBOV) e o Mvabea (MVA-BN-Filo)— também são estudados atualmente como uma forma de proteger contra o marburg.
Até o momento, os pacientes infectados recebem o chamado tratamento de suporte, que envolve fazer uma boa hidratação (para repor os fluidos perdidos pela diarreia e pelos vômitos frequentes), e remediar os sintomas que aparecem, como a febre e as dores de cabeça.
Segundo a OMS, esse suporte clínico é essencial para diminuir a taxa de mortalidade.
A entidade também sugere uma série de medidas para evitar o contato com o vírus ou flagrar os surtos logo na origem, como usar equipamentos de proteção ao visitar cavernas habitadas por morcegos e manter redes de monitoramento de casos.
O vírus pode chegar ao Brasil?
De acordo com as agências e os especialistas, não há motivo para pânico no momento.
"O que evita a disseminação desse tipo de doença é a atitude bem coordenada nos locais afetados. Ao atender adequadamente as pessoas e ter o devido cuidado com os pacientes e com os cadáveres de quem faleceu, evita-se que o vírus se espalhe para outras regiões", pondera Spilki.
"Mas é óbvio que ações complementares de todos os países do mundo, como mapear casos suspeitos ou com histórico de viagem às regiões com casos, é muito importante", completa o virologista.
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