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Para quem é intolerante ao glúten, pão é veneno

Márcia Moreno

Do UOL Ciência e Saúde, em São Paulo

16/12/2011 07h00

A endocrinologista Denise Miranda descobriu que tinha a doença celíaca, a alergia ao glúten, há sete anos. Percebia que sempre ficava doente quando ia aos Estados Unidos. “Sempre passava muito mal e achava que era o tempero e a pimenta”, conta. Em uma das viagens, decidiu que iria comer apenas pães e pretzels. “Foi quando passei mais mal”, conta. Em 15 dias, ela emagreceu cinco quilos.

Ao retornar para o Brasil, fez vários exames para descobrir a causa dos transtornos. Foi quando chegou ao diagnóstico. "Durante muito tempo, nenhum médico desconfiava, porque é uma doença pouco difundida”, diz.

“Quem sofre de alergia ao glúten pode ter desnutrição grave”, explica o gastroenterologista Alessandro de Rinaldis. Miranda teve anemia crônica durante 20 anos, sem causa diagnosticada. “A retirada do glúten reverte, quase de forma instantânea, este quadro, propiciando ao indivíduo uma vida quase normal”, afirma o médico.

O glúten é a principal proteína presente no trigo, aveia, centeio, cevada e malte, cereais amplamente utilizados na composição de alimentos e bebidas industrializadas. “O glúten não desaparece quando os alimentos são assados ou cozidos e, por isso, uma dieta sem glúten deve ser seguida à risca para quem tem a alergia”, afirma a nutricionista Alessandra Rodrigues.

Os sintomas mais comuns da doença celíaca são diarreia, perda de peso, mal-estar e má absorção de nutrientes. O glúten danifica as paredes intestinais e prejudica a absorção dos alimentos. “Não tem cura, é preciso mudar todos os hábitos alimentares”, afirma a endocrinologista, que já se acostumou a nova dieta.

De acordo com a nutricionista Kendra Cinta, a intolerância ao glúten pode ser explicada por fatores genéticos. “Ela é 100 vezes mais frequente em parentes de primeiro grau”, conta. É o caso da endocrinologista, que tem cinco pessoas da família com a doença. “Tomamos muito cuidado, principalmente em restaurantes. Eu fico no pé do garçom para saber como os alimentos foram feitos, se há algum risco de contaminação com glúten”, diz.

Falta de informação

De acordo com a Associação dos Celíacos do Brasil (Acelbra), a doença celíaca é pouco conhecida e os sintomas podem ser confundidos com outros distúrbios. A intolerância permanente ao glúten se manifesta geralmente na infância, entre o primeiro e o terceiro ano de vida. Mas pode surgir em qualquer idade, inclusive na vida adulta.

O tratamento consiste em uma dieta totalmente isenta de glúten. “A eliminação do glúten da dieta não leva a nenhum problema de saúde”, afirma Cinta. A Acelbra tem um site, www.acelbra.org.br, que mostra quais cuidados o celíaco deve ter.

Para a endocrinologista, o grande problema é a falta de informação sobre a doença no Brasil. Ela acredita que a variedade de alimentos sem glúten aumentou, mas a venda é restrita. “E os alimentos são muito caros”, reclama.

Uma vitória para os celíacos foi a sanção da lei 10.674 de 2003, que obriga os fabricantes de alimentos industrializados a colocarem no rótulo os dizeres “contém glúten” ou “não contém glúten”, conforme a receita de cada alimento.

Para ela, os restaurantes não ajudam – não colocam nos cardápios se a comida é feita ou não com glúten.  “Em alguns países, como na Itália, existem restaurantes especializados em cardápios para celíacos”, afirma. Aqui, ela passa longe de pizzarias e diz que há um longo caminho a percorrer para difundir a doença e ajudar os celíacos. “Algumas indústrias de alimentos, por exemplo, poderiam deixar máquinas exclusivas para alimentos sem glúten”.