"Já colei fita adesiva nos dedos para não conseguir arrancar meus cabelos"
“Já colei fita adesiva nos dedos, usei luvas, coloquei lenço na cabeça, peruca, fiz trancinhas, mas nada disso funciona. Só que meu problema não era a mão mas, sim, a mente”, conta Silvia Kineippe, 37, diagnosticada com tricotilomania, doença que faz a pessoa sentir prazer em arrancar os próprios cabelos.
“Ao arrancar os cabelos, sinto um alívio e relaxamento. Depois, bate aquele arrependimento, um misto de raiva e frustração por ter perdido o controle. A sensação de ser seu próprio algoz é muito desapontador.”
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O que é tricotilomania?
A doença que atinge Silvia é caracterizada pelo comportamento recorrente de arrancar os cabelos ou os pelos do corpo. Existe uma preferência por fios com texturas ou qualidades diferentes que, normalmente, são arrancados um a um. Há pacientes que também arrancam os cabelos de parentes, de pessoas próximas e até de animais de estimação.
Embora não exista uma causa específica, depressão e ansiedade são frequentemente associadas ao transtorno. Vários fatores podem desencadear os episódios: tristeza, angústia, vergonha, insatisfação com o corpo, fim de um relacionamento e até situações como ter que falar em público, entre outros.
Os portadores arrancam os pelos com os dedos, mas também utilizam objetos pontiagudos, como pinças, agulhas e palito de dentes. Essa manipulação excessiva pode gerar infecções e cicatrizes na pele, além de resultar em perda capilar.
Normalmente, os pacientes tentam esconder as falhas de diversas formas, mas às vezes a área afetada é tão grande que se torna difícil disfarçar e eles preferem não sair de casa. É uma condição que causa sofrimento e prejudica o funcionamento social, no trabalho e em importantes áreas da vida.
“Já fiquei mais de 5 horas arrancando cabelo”
Algumas pessoas costumam ter as crises quando estão distraídas, lendo um livro ou no celular, por exemplo. Já outros têm total consciência de sua ação. “Eu imagino e planejo todo o processo, já cheguei a ficar mais de 5 horas arrancando os cabelos”, conta Silvia.
Hoje em dia, estou careca e só uso aplique para sair. Meu marido me apoia e diz que me ama de qualquer jeito.
Silva foi acometida pelo transtorno aos 6 anos de idade, mas só foi diagnosticada aos 15. Desde 2012, ela mantém o blog e o vlog “Dona Endorfina”, onde compartilha sua luta e experiência contra a doença.
Diagnóstico
Estudos indicam que a tricotilomania se inicia na adolescência, mas também pode atingir outras faixas etárias. Quando aparece na infância, ela representa uma forma relativamente benigna e de fácil resolução. Ao se manifestar tardiamente, sua condição torna-se mais grave e resistente a tratamentos. O transtorno atinge de 1% a 2% da população geral, e afeta majoritariamente as mulheres adultas, cerca de 93%.
O diagnóstico é feito com base em cinco critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5): arrancar o cabelo ou pelo de forma recorrente, ocasionando a perda capilar; tentar repetidas vezes parar com o comportamento; sofrer e ter prejuízos na vida devido à compulsão; descartar outra condição médica ou dermatológica que justifique a perda dos fios; arrancar o cabelo não é melhor explicado pelos sintomas de outro transtorno mental, como a tentativa de melhorar uma falha na aparência.
Tratamento da tricotilomania
A psicoterapia é o tratamento mais recomendado, embora o uso de medicamentos possa ser necessário em casos mais graves. O treinamento de reversão de hábito é um modelo bastante utilizado, que elimina hábitos enraizados e estabelece novos hábitos. Inicialmente, o treinamento é feito no consultório com um profissional e depois o indivíduo treina em casa.
Com o tratamento adequado, há a remissão dos sintomas e a pessoa é capaz de reconquistar a confiança. “Nesses 31 anos de tricotilomania, aprendi que quanto mais tempo perdemos tentando controlar a mão, mais anos passamos arrancando o cabelo. O que realmente precisamos é controlar nossa mente e sentimentos. Só assim teremos uma vida mais saudável”, afirma Silva.
Fontes: Cristiana Nicoli de Mattos, psiquiatra e pesquisadora do Programa Ambulatorial dos Transtornos do Impulso (PRO-AMITI) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP; Edson Luiz Toledo, psicólogo e coordenador do Programa para Tricotilomania do Programa Ambulatorial dos Transtornos do Impulso (PRO-AMITI) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.
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