Topo

Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


Vídeo mostra músico tocando violão enquanto passa por cirurgia no cérebro

Músico ficou acordado durante cirurgia para remover tumor no cérebro para alertar aos médicos se alguma região sensível do cérebro era afetada - Reprodução
Músico ficou acordado durante cirurgia para remover tumor no cérebro para alertar aos médicos se alguma região sensível do cérebro era afetada Imagem: Reprodução

Do UOL VivaBem, em São Paulo

22/12/2018 16h18

Um músico da África Sul precisou passar por uma cirurgia em que os médicos abriram um buraco em seu crânio para remover um tumor. Só essas informações já passam ideias de uma situação um pouco ousada, mesmo que corriqueira na área médica. 

Porém, o contexto ficou ainda mais incrível: o paciente tocou violão durante a operação e esse show foi gravado em vídeo por um dos profissionais que acompanhava a cirurgia.

Musa Manzini é baixista de jazz e estava acordado enquanto os médicos realizaram a cirurgia em seu cérebro na semana passada. As imagens do site de notícias local, o News24, mostram que o músico dedilhava um violão lentamente enquanto era operado. 

A técnica, conhecida como craniotomia acordada, é importante por permitir que os médicos operem sem causar danos em áreas delicadas do cérebro, como o lobo frontal direito, onde estava o tumor de Manzini. A lógica é que se o músico começasse a errar as notas ou ter dificuldade nos movimentos, os médicos estariam tocando em uma região sensível do cérebro e seria preciso dobrar a atenção. 

"Pode ser muito difícil dizer a diferença entre o tumor e o tecido cerebral normal. Se você estiver mexendo em uma área crítica saberá, as ações do próprio paciente vão lhe mostrar", explicou Basil Enicker, neurocirurgião especialista que liderou a operação no Hospital Central Inkosi Albert Luthuli, em Durban. 

E, por incrível que pareça, esse tipo de cirurgia não é incomum. Existem registros fósseis pré-históricos mostrando que os pacientes tinham buraquinhos perfurados em seus crânios e sobreviveram há cerca de oito mil anos atrás. Na década de 1930, o neurocirurgião Wilder Penfield foi pioneiro em craniotomias modernas, que ele usou para tratar epilepsia, e o procedimento tornou-se bastante comum em todo o mundo desde então.

Mas é preciso escolher sabiamente os pacientes elegíveis para o método: pessoas que tossem, por exemplo, ou que não podem ficar paradas por períodos prolongados, são muito mais perigosas de operar.

Manzini não é o primeiro músico a se apresentar durante uma cirurgia no cérebro. Em 2014, um tenor da Ópera Nacional Holandesa, Ambroz Bajec-Lapajne, cantou "Gute Nacht" de Schubert enquanto os médicos removiam um tumor.

Já em 2015, o saxofonista Carlos Aguilera leu partituras e cantou durante uma operação na Espanha.

E uma adolescente de Washington, Kira Iaconetti, que tinha uma forma rara de epilepsia que desencadeou convulsões, foi convidada para cantar através de uma cirurgia no cérebro no Hospital Infantil de Seattle, nos Estados Unidos.

No caso de Manzini, os médicos estavam preocupados com a função motora de sua mão esquerda, segundo Rohen Harrichandparsad, outro cirurgião da equipe. "Queríamos ter certeza de que removemos o máximo possível do tumor preservando a destreza do paciente", disse ele em entrevista ao The New York Times.

Para um músico profissional como Manzini, cujo trabalho requer atividade coordenada em várias regiões do cérebro, a operação apresentou outras complicações. "Tivemos que garantir que quaisquer caminhos que ele estivesse usando para a música fossem preservados", disse Harrichandparsad. "E no cérebro não há um único caminho, mas uma multidão que interage. Teria sido impossível fazer isso sem que Manzini permanecesse acordado", completou.

Na cirurgia, os médicos colocaram o músico sob anestesia intravenosa, e foram acordando-o gentilmente após a exposição de seu cérebro. Nervos sensíveis na pele, músculos e membranas circundantes foram "adormecidos" por injeções de anestésico local. "Uma vez que estamos no cérebro, não há dor", disse o Enicker, já que o cérebro não tem receptores de dor próprios.

Usando pequenos eletrodos, os cirurgiões estimularam diferentes partes do córtex de Manzini, testando quais áreas eram funcionais em um processo conhecido como mapeamento cortical.

Em seguida, os médicos entregaram uma guitarra ao paciente e pediram que ele tocasse enquanto retiravam o tumor, garantindo que não estavam removendo nenhum tecido crítico para que Manzini continuasse tocando com perfeição após a operação. "Era difícil se concentrar com o que parecia ser um 'maçarico' dentro de sua cabeça", disse o baixista em entrevista ao jornal americano The New York Times.

Minha mão se movimentaria automaticamente. Foi muito engraçado e estranho. É como se você estivesse entre estar morto e estar vivo

Musa Manzini, baixista de jazz que tocou durante sua cirurgia de remoção de tumor na África do Sul 

"Há um som alto de sucção e outras coisas, mas eu não senti nenhuma dor", complementou Manzini, referindo-se ao dispositivo de aspiração usado para remover sangue enquanto os cirurgiões operavam.

Os médicos descobriram o tumor em 2006 e Manzini passou por duas cirurgias sob anestesia geral. Este ano, sua mão esquerda começou a se sentir "entorpecida e desajeitada" enquanto ele tocava guitarra, e quando os exames mostraram que o crescimento do tumor havia retornado, ele optou por uma craniotomia acordada.

"Assisti bastante vídeo no YouTube para me preparar mentalmente", disse Manzini.

Enicker estima que a equipe tenha removido 90% do tumor antes de ceder a cautela e encerrar o procedimento. O músico permaneceu acordado até o final. Ele recebeu alta alguns dias depois e está se recuperando em casa, em Durban. "Recebi uma nova oportunidade", afirma Manzini.

Nos moldes de Stanley Clarke ou Jaco Pastorius, Manzini toca seu baixo como um instrumento principal. Ele lançou quatro álbuns e palestras sobre o baixo na Universidade de KwaZulu-Natal.

Antes de operar o baixista, nem Enicker nem Harrichandparsad haviam encontrado sua música. "Estou ansioso para ser convidado para seu primeiro show após a cirurgia", comentou Harrichandparsad.

SIGA O UOL VIVABEM NAS REDES SOCIAIS
Facebook - Instagram - YouTube