Demência e Alzheimer são a mesma coisa? Entenda o quadro
Quando um idoso apresenta perda de memória, desorientação, lentidão nas respostas, as pessoas já acham que é demência, que a pessoa tem Alzheimer. De acordo com o Governo do Brasil, o Alzheimer acomete 11,5% da população idosa do país, mas é importante não se precipitar: ter demência não é sinônimo de ter Alzheimer, por isso é necessário consultar um médico e obter um diagnóstico preciso para ajudar nos cuidados ao paciente.
Já que essa confusão existe, vamos deixar claro o que é demência, quais os tipos e como o Alzheimer e outras doenças se manifestam.
O que é demência então?
A demência é uma classe de doenças com mais de 150 tipos diferentes, incluindo o Alzheimer.
"O problema se dá sempre que a rotina da pessoa é comprometida por uma alteração nas funções cognitivas, como comunicação, linguagem, orientação espacial, capacidade de planejamento motor ou de processar informações sensoriais," explica o neurologista Custódio Michailowsky, do Hospital 9 de Julho, em São Paulo.
Inclusive, como algumas pessoas usam a palavra demência com um tom pejorativo, os especialistas trocaram sua nomenclatura para transtorno neurocognitivo maior.
"O que está por trás desse transtorno é uma perda real e irrecuperável de células nervosas --neurônios e massa encefálica. É uma mudança mais rápida e precoce do que a que acontece no processo de envelhecimento natural, onde há uma perda discreta," detalha Carlos Penatti, neurologista do Fleury Medicina e Saúde, em São Paulo. O próprio cérebro começa a se atacar e os cientistas ainda estudam para descobrir o porquê.
A maior parte dos casos ocorre em idoso, já que o principal fator de risco é a idade, além de falta de controle de doenças como hipertensão e diabetes. Os diagnósticos começam com cerca de 65 anos e, a partir daí, a cada cinco anos a possibilidade de transtorno neurocognitivo maior dobra, segundo Michailowsky.
E o que é Alzheimer?
O que confunde e faz com que as pessoas achem que toda demência é Alzheimer é a alta incidência da doença. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), o Alzheimer representa cerca de 60% a 70% dos casos de transtorno neurocognitivo maior e 35,6 milhões de pessoas no mundo tem a doença, de acordo com a Abraz (Associação Brasileira de Alzheimer), com estimativa para 115,4 milhões de pacientes até 2050.
Para analisar os dados no Brasil, um estudo feito por pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) e publicado no jornal científico Alzheimer Disease and Associated Disorders analisou 1.656 indivíduos com idade igual ou superior aos 65 anos do município de Catanduva (SP). Todos foram submetidos a avaliações clínicas, neurológicas e cognitivas, e os dados mostraram que a demência foi diagnosticada em 118 pacientes. Desses, 55,1% tinham Alzheimer, seguido por demência vascular, com apenas 9,3%.
Quando o paciente tem Alzheimer os sintomas que mais chamam atenção são o problema de memória e a dificuldade de adquirir novos conhecimentos. "O hipocampo é a principal parte do cérebro afetada. Ele é responsável por guardar novas informações, então no início da doença o paciente ainda tem memória de anos atrás, mas esquece do que fez ontem, por exemplo," explica Antônio Damin, neurologista e especialista em neurologia cognitiva comportamental pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).
Com o passar do tempo os sintomas vão se agravando. Também é comum que o paciente apresente dificuldade com linguagem (ele sabe para que um objeto serve, mas não consegue nomeá-lo), ou sofra de desorientação de tempo e espaço (se perdendo em ambientes conhecidos e ficando sem noção do horário que faz atividades).
A evolução tende a trazer ainda a perda da independência, insônia, agitação, resistência à execução de tarefas simples como escovar os dentes, perda da capacidade de controlar estímulos corporais, dificuldade para comer e deficiência motora progressiva. No estágio terminal, há e perda praticamente completa da memória, além de dependência total de terceiros para qualquer atividade.
Mas quais são as outras demências?
Como explicamos, o Alzheimer não é o único tipo de transtorno neurocognitivo maior. Conheça as outras doenças mais representativas e como se dão:
- Demência vascular Pode aparecer depois de um AVC (Acidente Vascular Cerebral) que compromete o funcionamento de uma área importante do cérebro, ou então após anos de descuido de doenças como pressão alta e diabetes, que levam a pequenas isquemias que progressivamente afetam o cérebro. Também ocorre perda de memória e é diferenciada do Alzheimer por exames de imagens e por desde o início mostrar reflexos e sensibilidade alterada, o que demora no paciente com Alzheimer, segundo Damin. Ainda há uma maior lentificação e dificuldade de atenção.
- Demência de Corpos de Lewy "Além da demência há parkinsonismo, o paciente tem tremores, rigidez muscular, lentificação dos movimentos", explica Damin. O paciente também costuma flutuar entre os sintomas, um dia está ótimo, dois dias depois fica muito mal, depois melhora. Outra coisa que chama atenção para o quadro são alucinações visuais e problemas na memória.
- Demência Frontotemporal Como o nome entrega, a doença afeta os lobos frontais e temporais do cérebro, que têm entre as funções a regulação do humor e comportamento. Assim, o que mais chama a atenção é a mudança de comportamento do paciente. "A pessoa pode adquirir apatia e ficar sem fazer nada, ou pode ficar completamente enérgico e desinibido. A família costuma notar com facilidade", afirma Damin. No início, memória e orientação parecem nem ser afetadas.
- Demência na doença de Parkinson "Se você fizer uma biópsia, a demência de Corpos de Lewy e da doença de Parkinson são difíceis de diferenciar. Em Lewy a proteína tóxica começa a se depositar no córtex, por isso o início é demência. No Parkinson, a substância se deposita nas áreas responsáveis pelo movimento", explica Damin. A demência pode demorar cerca de dois anos para aparecer após o diagnóstico de Parkinson.
Como o diagnóstico difere as demências?
Conseguir cravar o tipo de transtorno não é uma missão fácil e exige paciência. O médico junta o máximo de informações possíveis sobre o paciente, de testes cognitivos a histórico e exames de imagem (como ressonância), e pode pedir ainda avaliações de outros profissionais, como psicólogo, fonoaudiólogo ou fisioterapeuta.
"Não existe um exame que dá positivo ou negativo, é toda uma análise de dados, tanto que o diagnóstico da doença é 'provável' e não definitivo. Mas se o médico unir todas as informações a probabilidade de acerto é de 90%", diz Damin.
Muita gente que acha que se a mãe ou pai teve estes tipos de transtorno com certeza terá também o problema, e isso é determinante para o diagnóstico. Não é bem assim. "Existe um fator hereditário na doença que olhamos para o diagnóstico, mas é bem raro. Também há uma característica genética, mas não basta ter o gene, depende de como ele vai se expressar, como ele se associou com outros genes", afirma Penatti.
O que se sabe de fato é que o meio ambiente importa, ditando como foi a vida da pessoa, suas condições de saúde, se fumou, abusou de álcool, se cuidou do peso, se praticava atividades físicas e intelectuais.
Há cura?
Atualmente não há cura para o transtorno neurocognitivo maior, mas os tratamentos ajudam a melhorar a qualidade de vida do paciente durante a progressão. Medicamentos ajudam a preservar a memória e atrasar a progressão da morte de neurônios, enquanto atividades comportamentais, como aulas de música, dança, artes, reabilitam o paciente ao mantê-lo ativo.
"Os estudos caminham nesse sentido: não sabemos como recuperar neurônios, então investimos em antecipar ao máximo o diagnóstico para tentar preservar as células e postergar o aparecimento de sintomas graves", conta Penatti.
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