Não considere a raiva algo ruim: como usar o sentimento de forma positiva
Todo mundo sente raiva, em maior ou menor intensidade. Esse sentimento, considerado primário e primitivo, é visto por muita gente como negativo por estar associado a atitudes agressivas. Mas essa associação é um erro: a agressão é um comportamento reativo e não significa que o sentimento só gere respostas negativas.
A psiquiatra Carolina Blaya, professora da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e UFCSPA (Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre), explica que a raiva é um sentimento ligado a reação de luta e fuga e que acontece em todas as espécies animais.
"Esse alerta é produzido no cérebro pelas amígdalas cerebrais, estrutura de onde se originam sentimentos primários como raiva, medo e tristeza", complementa Cristiano Nabuco, psicólogo do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) e blogueiro do UOL VivaBem.
Por que devemos olhar a raiva de outra forma?
Normalmente esse sentimento está relacionado ao impulso da luta, mas em situações cotidianas -- como no trânsito, nas relações de trabalho e afetivas -- a pessoa recebe a estimulação biológica do corpo para um combate, mas não pode reagir. "Se for falar o que pensa no trabalho, pode ser mandado embora. No trânsito, mesmo constrangido é coagido e não pode fazer nada, então, quando você tem um indivíduo submetido a uma pressão que provoca raiva, muitas vezes repetidamente, ele entra em uma condição de desamparo aprendido", ilustra Nabuco.
No entanto, se olharmos para a emoção mais de perto, sem tentar nos livrar dela logo, ela pode trazer informações importantes. "Se você está sentindo raiva é porque tem alguma situação que não te agradou", explica Blaya. Pode demorar algum tempo até identificar o gatilho da raiva, mas ao entender essa informação, você consegue racionalizar sobre a situação e tomar uma atitude transformadora.
Aí, você pode agir de forma mais assertiva, identificando a situação ruim e avaliando se você quer continuar com aquilo ou não. "Se tenho um amigo que me trata mal, que me desconsidera e que frequentemente eu me sinta com raiva, eu decido que essa não é uma relação boa para mim, então eu posso escolher outras pessoas para o meu círculo social" exemplifica.
Ela complementa que a raiva pode ser propulsora para mudar uma situação da vida que desagrade e gere a raiva. "Eu posso também lançar mão da raiva de uma forma que eu possa me aprimorar. Eu posso me dedicar, posso estudar, mudar de emprego e assim, a situação anterior que me fazia sentir a raiva", completa.
Mas cuidado: pense bem antes de agir com raiva
Em outras situações, porém, o ideal é não fazer nada. Existem momentos em que, passada a raiva, você enxerga que o que te deixou assim não era bem o que você pensou; foi um engano ou simplesmente é algo que não está ao seu alcance qualquer atitude.
Vale também lembrar que a raiva pode ser uma emoção secundária, motivada pela supressão de outro sentimento. "O ciúme, por exemplo, tem a ver com a sensação primária de medo ou de tristeza. Como o indivíduo sente que mostrar esses sentimentos muitas vezes pode ser interpretado como fraqueza, ele age violentamente para apagar os rastros desses sentimentos primários que muitas vezes podem causar vergonha social", completa.
Não existe uma fórmula ideal para lidar com a raiva, mas algumas atitudes podem ajudar a torná-la positiva e benéfica em nossa rotina:
- Raiva e agressividade não são sinônimos: essa é a primeira etapa: distinguir aquilo que você sente com aquilo que você faz. A partir do momento que você deixa de ser refém da raiva, sem ser agressivo, você pode passar a pensar em como é possível se defender em uma situação de ameaça sem reagir agressivamente;
- Busque dar um tempo: o ideal é não reagir imediatamente à raiva. Agir impulsivamente sob o efeito desse sentimento pode trazer arrependimentos futuros. Ter isso em mente pode ajudar a parar e pensar na melhor atitude a tomar, frente a uma situação que provoca a raiva;
- Comunique o sentimento: ao comunicar o que te faz ou fez sentir raiva o seu corpo cria um canal de conexão e equilíbrio onde essa emoção cumpre o propósito adaptativo que é informar ao outro que está sendo agredido, e ela passa.
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