Sobrecarga emocional: como evitar que sentimentos difíceis tomem conta?
Resumo da notícia
- A sobrecarga emocional é um estado que merece bastante atenção, cuidado e que não deve ser subestimado e nem naturalizado
- As manifestações incluem sintomas físicos, como dores de cabeça, alteração no sono, excesso de apetite e queda de cabelos
- As alterações psicológicas vão desde choro fácil, ansiedade, desesperança, dificuldade em memorização, até reações de agressividade e impulsividade
- Atitudes como negligenciar as próprias necessidades e não assumir limites podem ocasionar intensos desgastes emocionais
Dores de cabeça, alteração no sono, excesso de apetite e queda de cabelos. Choro fácil, sinais de ansiedade, desesperança e dificuldade em memorização. Esses sintomas podem passar despercebidos, e aparecerem com maior ou menor intensidade, mas como tantas outras reações, são alertas que o nosso corpo dispara para denunciar que algo não está bem. Caso você tenha se identificado com essa descrição, é possível que esteja passando por uma sobrecarga emocional, estado que merece bastante atenção, cuidado e que não deve ser subestimado e nem naturalizado.
São aqueles momentos em que costumamos ouvir que estamos estranhos, sem razão aparente mais agressivos, irritados, menos dispostos e com algumas dificuldades cognitivas, como raciocínio mais lento. Muitas vezes isso acontece porque nossas necessidades não estão sendo atendidas, seja de lazer, de descanso, ou mesmo de se sentir querido e amado.
O primeiro passo em situações assim é observar se há um movimento sistemático de priorização do outro, das obrigações e demandas externas. Ao negarmos os próprios limites, e insistirmos que conseguimos dar conta de tudo, é natural que a mente fique cansada, de certo modo desgastada, o que desperta sentimentos e comportamentos que fogem do nosso controle.
Nervos à flor da pele
Todos nós temos um teto para lidar com as situações, um limite de tolerância e recursos para encarar estímulos e conjunturas de modo a não extrapolar nas reações. Isso varia conforme o momento, e tem grande ligação com a satisfação das nossas necessidades. Quando negligenciamos o tempo para nós mesmos e a falta de lazer, de descanso, de amor e de carinho passa a ser constante, é muito provável acabar numa condição de esgotamento emocional que resulta em hostilidades e descontroles que lembram o personagem interpretado pelo ator Michael Douglas no filme "Um dia de fúria".
Vale destacar que essa sobrecarga, considerada um transtorno mental comum, compromete o individuo como um todo, prejudicando inclusive a capacidade de tomada de decisão e de antecipação de consequências dos atos. Uma situação na qual seria possível lidar com relativa tranquilidade e um custo pequeno de energia pode se tornar uma tarefa muito intensa e ter como consequência reações impulsivas e agressivas.
São muitas as possibilidades que nos levam a ficar numa configuração emocional parecida com a de um copo cheio d'água: apenas uma gota a mais nos faz transbordar. Normalmente é quando a mente está sobrecarregada, a pessoa se sente cansada e estafada, tanto por causa do excesso de demandas externas, com vários pedidos e exigências na casa e no trabalho, quanto por demandas internas, ao acumular atividades e acreditar ser preciso cumprir todas as determinações.
Emoção antes da razão
Mais do que um desequilíbrio da mente e do corpo, esses comportamentos desproporcionais indicam um traço evolutivo no desenvolvimento humano. A impulsividade acontece porque nossas reações emocionais são muito mais rápidas que as racionais, inclusive por um caráter de sobrevivência. Por exemplo, em situações primitivas de ansiedade e estresse, como a aproximação de predador, havia uma descarga de neurotransmissores que despertavam uma atitude de luta ou fuga frente a ameaças.
É uma defesa neurobiológica que foi importante para nossa evolução como espécie, que fez com que sentíssemos medo (emoção) e fugíssemos. Hoje em dia nossas ameaças estão ligadas com frustações, sobrecargas emocionais e desempenho colocado à prova, mas o tipo de reação física é a mesma, por isso é comum agirmos reatividade ou com impulsividade frente situações difíceis. Faz parte da memória na espécie humana enquanto animal.
Quando estamos emocionalmente desestabilizados, é como se a parte do nosso cérebro responsável pela racionalidade, julgamento e ponderação de ações (córtex) fosse um pouco desligado, restando majoritariamente a ação do sistema límbico, região responsável por gerar emoções mais intensas e automáticas.
A resposta vem dentro de você
As emoções básicas fazem parte de todos nós. Temos raiva, medo, tristeza, alegria, nojo, e outros tantos sentimentos plenamente justificáveis, que têm uma razão de ser e para estarem mais ou menos evidentes. Isso varia conforme o momento de vida, e geralmente em períodos de maior pressão emocional, situações que seriam encaradas com relativa tranquilidade e com um custo pequeno de energia podem se tornar bastante intensas e ter como consequências comportamentos ansiosos, impulsivos e agressivos. Quando os limites psíquicos são ameaçados ou muito demandados, nos sentimos como se estivéssemos feridos, por isso é comum reagir de maneira mais ríspida e impaciente.
Nesses momentos, é importante tentar identificar qual foi o gatilho que desencadeou esse agir emocional tão intenso e que despertou algo mais profundo. A raiva decorre de contextos de injustiça e de frustração, onde acredito que passaram por cima dos meus direitos ou que fizeram algo de propósito para me provocar e prejudicar. Já a tristeza está relacionada a situações de perdas, quando algo ou uma relação que consideramos muito deixa de existir, em contextos de luto ou separações. O medo vem como ajuda para nos preservar e colocar em situação de segurança, como forma de revelar aquilo que é perigoso.
Especialistas lembram que apesar de normalmente não dominarmos o que sentimos, é possível desenvolver recursos para lidar melhor quando somos invadidos por sentimentos de raiva, medo ou tristeza. A ideia não é sufocá-los, ao contrário, é reconhecer a presença deles e não agir mais a partir dessas sensações. Buscar entender que é uma parte de mim que precisa de cuidado, que não deve ser parâmetro para minhas atitudes, mas que se faz presente por alguma razão.
A indicação primordial é olhar para nós mesmos e pensar se existe um nível crônico de estresse ou se continuamente as necessidades pessoais estão sendo deixadas de lado. Questionar quais são as prioridades que mais têm espaço na vida, como está o equilíbrio entre as vontades e as obrigações, se há tempo para atividades prazerosas ou se os pedidos do outro estão sempre em primeiro lugar. Isso pode acontecer inclusive por questões culturais, ligadas com aprendizados familiares, escolares ou profissionais, onde foi ensinado que o padrão adequado era sempre atender os outros e que era possível lidar com todas as demandas.
São ações de autossacrifício, em detrimento dos próprios desejos, que levam a estágios de tamanha pressão emocional que pedem por um movimento de escape. Para ponderar a melhor forma de agir e evitar momentos de explosão (atacando verbalmente ou fisicamente o outro) ou implosão (autoagressão, seja ela física ou em forma de depreciação), a recomendação é ouvir a si mesmo e a esses sentimentos, e com a ajuda de um profissional, traduzir esses sinais. O que está causando essa raiva? Sobre o que essa ansiedade está querendo me alertar? O que é preciso e quais seriam os caminhos para transformar essas energias em algo produtivo?
Nessas ocasiões, o apoio social e familiar é indispensável para tentar reencontrar o equilíbrio, junto com iniciativas que promovam o conforto e o bem-estar, como práticas culturais, esportivas, intelectuais e religiosas. É um processo para encontrar um lugar mais cômodo para essas sensações, que começa ao não subestimar o que sentimos, e segue com meios mais saudáveis de expressá-las, seja pelo riso, choro, conversa, reza, abraço, ou por aquilo que faça bem e traga mais tranquilidade.
Cuidado, compaixão e afetividade
O desgaste emocional pode ocorrer em diferentes contextos e situações, seja a partir de mudanças inesperadas ou de sobrecarga de tarefas. Para evitar chegar a extremos negativos é importante ter uma atitude mais generosa consigo, ao reconhecer os próprios limites e externalizar que não é possível dar conta de todas as demandas internas e externas. Assumir que não existe um desempenho perfeito, que vamos desagradar e frustrar as pessoas e que isso faz parte da vida. É aprender a dizer sim para o que nos beneficia e saber encarar a reação do outro quando demarcamos nossos territórios.
Deixar de lado a busca constante por aceitação e aprovação e acreditar que mesmo ao desagradar alguém vou continuar amado e querido pelas pessoas. É cultivar sentimentos de compaixão em relação ao outro, que assim como eu, é alguém que pode errar, precisar de apoio ou de ajuda. Alimentar também a gratidão às nossas conquistas, que está ligada diretamente à felicidade, tanto nas pequenas coisas ou em grandes realizações. Dar mais atenção e valor para as sensações agradáveis do dia a dia, como um bom banho, uma refeição gostosa, estar com amigos e parentes, até pensar nas diversas experiências que nos fizeram evoluir.
Isso tudo faz parte de um exercício de autoconhecimento. Quanto melhor você se conhece, sabe dos seus potenciais e fragilidades, fica mais fácil entender as próprias reações e lidar melhor com situações adversas. Inclusive a consciência das alterações corporais que são produzidas pela emoção, como palpitações, frequência respiratória e tensão muscular, pode colaborar para identificar e tentar solucionar o que está em desequilíbrio na nossa mente. Ao focar em amenizar essas sensações físicas vindas das emoções difíceis, deixamos menos espaço para os pensamentos negativos que elas geram, o que diminui a chance de entrarmos num ciclo de desgaste mental.
Nosso corpo e nossa mente se encontram conectados, daí a importância de cuidar tanto das sensações quanto dos nossos pensamentos.
Fontes: Aline Henriques Reis, professora adjunta da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul); Amilton Santos Jr., docente do departamento de psicologia médica e piquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas); Érika Arantes de Oliveira Cardoso, psicóloga e co-coordenadora do LEPPS (Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde), vinculado ao departamento de psicologia da FFCLRP (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto) da USP (Universidade de São Paulo); João Carlos Caselli Messias, professor do programa de pós-graduação em psicologia da PUC Campinas e líder do grupo "Psicologia e Trabalho: Abordagem Experiencial"; Marcelo Demarzo, médico e coordenador da Especialização em Mindfulness da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo) e blogueiro do UOL VivaBem.
SIGA O UOL VIVABEM NAS REDES SOCIAIS
Facebook - Instagram - YouTube
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.