Esclerose múltipla aos 14: "Disseram que eu morreria jovem e não seria mãe"
Aos 14 anos, a gaúcha Bruna Rocha começou a sentir um forte formigamento no braço. Em princípio, ela e seus pais acharam que o problema era devido a muitas horas digitando no computador. Após consulta com um ortopedista, o médico descartou qualquer tipo de lesão e orientou a família a procurar um neurologista.
O primeiro passo foi fazer uma ressonância magnética, que não permitiu "fechar" qualquer diagnóstico. Foram semanas atrás de um resultado para tentar identificar o problema. Enquanto isso, Bruna foi piorando e perdeu os movimentos das pernas, do braço e parou de andar.
Depois de seis meses, ela foi diagnosticada com esclerose múltipla e chegou a ouvir dos médicos que nunca poderia ser mãe, que talvez precisasse interromper os estudos e que teria uma expectativa de vida baixa. "Antes de descobrirem o problema, um médico chegou a dizer para minha família que era frescura de adolescente", diz Bruna.
Quando tinha crises fortes, ela perdia o equilíbrio, sentia formigamentos por quase 24 horas e até perdia da visão por alguns dias. Só voltava a enxergar normalmente depois de vários dias usando corticoides. Nessa fase, chegou a entrar em depressão e dependia dos pais para fazer tudo. Foram meses no hospital sem saber o que a doença poderia ocasionar. "Pensava que nunca iria poder trabalhar. Que jamais faria uma faculdade ou terminaria meus estudos".
Mesmo tendo um prognóstico bem pessimista, ela não deixou de acreditar nos tratamentos e começou a usar os remédios específicos para o problema. Além disso, fez uso de pulsoterapia, tratamento com altíssimas doses de corticoide durante cinco dias para combater a inflamação no organismo.
Depois de um tempo, a gaúcha descobriu que sua esclerose múltipla era do tipo remitente recorrente. Nesses casos, normalmente, o paciente consegue recuperar os movimentos em até 100%. Isso começou a acontecer aos poucos e, em 2010, ela já estava andando de bengala. Depois, em 2015 estava praticamente livre de todos os sintomas e não apresentava mais nenhum tipo de crise.
Bruna se casou e conseguiu engravidar
Em 2009, Bruna resolveu fazer um blog sobre a doença, com objetivo de levar esperança às pessoas que recebem o diagnóstico de esclerose múltipla.
Depois de alguns anos escrevendo sobre o tema, conheceu seu atual marido, que também sofria com esclerose múltipla.
Na época, ele buscava mais informações sobre a condição, já que havia pouco conteúdo publicado na internet e grande parte mostrava histórias com finais sempre pessimistas. Além disso, os médicos também não se mostravam animados com a doença.
Ao receber uma mensagem dele, os dois começaram a conversar, namorar, casaram e, em 2016, tiveram seu primeiro filho. "Eu parei a pílula em março e em abril eu já havia engravidado. Ninguém acreditava, foi lindo", finaliza Bruna.
O que é esclerose múltipla?
É uma doença autoimune, ou seja, que ocorre quando o sistema imunológico da pessoa identifica células do organismo como agentes estranhos e as ataca "por engano". No caso da esclerose múltipla, o alvo é a bainha de mielina, revestimento dos neurônios. Isso dificulta a transmissão dos impulsos nervosos no cérebro e na medula.
Segundo o Ministério da Saúde, 35 mil pessoas convivem com a condição, que afeta normalmente adultos entre 18 e 55 anos de idade e é três vezes mais comum em mulheres.
Sintomas
Qualquer processo que depende de impulsos nervosos para ser realizado pode ser afetado pela doença --ou seja, praticamente tudo que nosso organismo faz.
Para muitos, a esclerose múltipla primeiro afeta a visão. Um dos olhos começa a falhar ou aparece uma mancha escura, seguida de dor. É a chamada neurite óptica.
Outro sintoma pode ser o desequilíbrio, por causa de lesões no tronco encefálico. A pessoa também pode sentir tontura persistente, cansaço intenso, falta de equilíbrio, dores faciais, dificuldade para andar ou segurar objetos --devido à perda de força nas pernas e nos braços --, fadiga, formigamentos e perda de controle da urina.
Assim como Bruna, alguns pacientes precisam andar com ajuda de bengala ou cadeira de rodas.
Tipos de esclerose múltipla
Remitente recorrente É um dos quadros mais comuns e atinge grande parte dos pacientes. É caracterizada por surtos que podem passar depois de alguns dias ou semanas, promovendo recuperação quase que completa ou com algumas sequelas.
Primária progressiva Afeta uma porcentagem pequena da população e é caraterizada com sintomas leves, mas que vão piorando com o passar do tempo. As limitações físicas podem se estender por meses e anos.
Secundária progressiva Neste tipo, os sintomas começam semelhantes aos da recorrente remitente, seguido pelo desenvolvimento de incapacidade progressiva e aumento de surtos, piorando o quadro.
Síndrome clínica isolada A pessoa pode ter o primeiro surto, mas nunca mais apresentar algum outro.
Pessoas com esclerose podem engravidar?
Sim. Normalmente, os médicos aconselham que o paciente pare com as medicações durante a gestação. Em muitos casos, os sintomas podem até melhorar quando a mulher engravida.
Como é o tratamento?
A esclerose não tem cura, mas alguns pacientes podem conseguir a remissão da doença --ou seja, ficar anos sem apresentar sintomas do problema.
A doença é controlada com remédios, como os imunomoduladores e imunossupressores. Muitos medicamentos causam efeitos colaterais, como enjoo e mal-estar.
Apesar dos desconfortos gerados, com a medicação a pessoa consegue levar uma vida ativa e produtiva. Quando a esclerose múltipla é detectada precocemente e tratada conforme indicação médica e mudanças no estilo de vida (prática regular de atividade física, alimentação equilibrada), o paciente reduz o número de possíveis surtos e evita sequelas.
Fonte: Jefferson Becker, neurologista, professor Adjunto de Neurologia da PUC-RS e presidente do Comitê Brasileiro de Tratamento e Pesquisa em Esclerose Múltipla (BCTRIMS).
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