Quando somos nosso maior inimigo: entenda a autossabotagem e como sair dela
Resumo da notícia
- Na autossabotagem a pessoa pode desistir de diversas coisas por acreditar que não vai dar conta
- Pensamentos, sentimentos e emoções podem ser influenciados por crenças limitantes
- Vale observar a repetição de padrões negativos para identificar gatilhos e comportamentos de autossabotagem
De repente, aquela tão sonhada oportunidade aparece e a pessoa tem todos os motivos para agarrá-la e realizar este antigo sonho, mas ela mesma cria obstáculos que podem colocar tudo a perder. Parece exagero? Mas é assim que a autossabotagem funciona. "É um processo envolvendo comportamentos, além de pensamentos e sentimentos, em que o indivíduo age de um modo contrário ou incompatível com seus objetivos ou desejos", explica o psicólogo Ricardo Wainer, psicoterapeuta e professor titular do curso de psicologia da PUCRS (Pontifícia Universidade Católica Rio Grande do Sul).
Ou seja, a pessoa acaba desistindo de diversas coisas que lhe são importantes por acreditar que não vai dar conta. E isso pode ser um processo inconsciente, pois se ela for questionada por que mantém tais crenças, ele dirá que não o fez ou nunca pensou nisso. "Em geral, ocorre devido às crenças disfuncionais enraizadas, como 'sou fracassado' ou 'sou incapaz'; sendo que a pessoa não percebe que faz escolhas baseadas nessas crenças", acrescenta Andrea Lorena da Costa Stravogiannis, psicóloga e coordenadora dos setores de pesquisa e tratamento do amor patológico e ciúme excessivo do Pro-Amiti do HC-FMUSP (Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
Reconhecendo este inimigo
Tais crenças limitantes têm origem nas vivências de cada um, frases ditas pelos pais e professores, ou outras pessoas que, de alguma forma, participaram da vida do indivíduo e vão sendo armazenadas sem filtro. E, ao longo do tempo, pensamentos, sentimentos e emoções podem ser influenciados por isso. Por isso, existem situações em que a pessoa pode se enxergar como 'não merecedora' e, por isso, acabar neste ciclo vicioso que é a autossabotagem.
Afinal, essa sensação de incerteza vai se tornando constante e o comportamento recorrente. E é essencial compreender que a autossabotagem não é um desejo ou uma motivação consciente para fracassar ou se dar mal. "É uma repetição gerada pela nossa forma de pensar e interpretar a realidade que faz com que acabe sendo familiar fracassar, ser desprezado/abandonado", considera Wainer.
Por isso, identificar o problema é um passo importante. E na sequência, o ideal é que a pessoa consiga questionar essas incertezas e buscar dados na sua história que possam comprovar que ela é capaz de fazer determinadas coisas. "Manter um calendário com prazos, agendas e lembretes podem ajudar a parar o ciclo da procrastinação", diz Stravogiannis. E se tiver dificuldade em lidar com a situação, buscar ajuda profissional.
Há um gatilho para o problema?
A autossabotagem, assim como outros processos de confirmação e perpetuação das crenças básicas, começa a ocorrer a partir do momento que se estrutura cada um dos esquemas mentais sobre determinadas áreas de nosso desenvolvimento, como aceitação e pertencimento; competência e autonomia; limites saudáveis, entre outros. Por isso, é possível observar processos muito sutis de autossabotagem já na infância.
Só que a autossabotagem não tende a ocorrer, obviamente, em todas as dimensões e contextos da vida da pessoa, mas sim naquelas áreas e contextos (incluindo pessoas) em que o esquema disfuncional está em ação. Portanto, o gatilho está na felicidade em conquistar coisas boas e satisfatórias que possam deixar o indivíduo bem. "E isso acaba acionando as crenças de não merecimento, de que não irá durar, dentre outras crenças distorcidas", diz a psicóloga Lisiane Holdefer, docente no Uniplan (Centro Universitário Planalto do Distrito Federal).
É importante enfrentar!
Wainer garante que o processo de autossabotagem pode trazer consequências muito sérias para a vida, justamente por prejudicar ou impedir a conquista de aspectos positivos. E aqui, indica dois exemplos na vida amorosa:
- O sujeito que por se considerar incapaz de ser amado pelo que é, não consegue perceber/aceitar o interesse de outro alguém que lhe seria muito gratificante;
- A jovem que, por ter sofrido abusos e humilhações na infância (e acreditar que as relações são abusivas e sofridas), busca parceiros pouco afetivos e mesmo agressivos. E, nas situações onde um parceiro mais gentil e afetivo se apresenta, acaba não investindo na relação (por não sentir atração - mecanismos típicos de confirmação de suas crenças primitivas).
E não são apenas os relacionamentos interpessoais que podem ser afetados, mas também o desempenho profissional. "Às vezes, por medo de não dar conta, a pessoa não aceita uma promoção. Ou se aceita, acaba não comparecendo aos compromissos como se quisesse ser dispensada, e se acontece, pode vir a pensar 'bem que eu tinha razão, não sirvo para esse cargo', como se buscasse uma justificativa para a situação", fala Stravogiannis.
Portanto, vale observar a repetição de padrões negativos, pois podem ficar evidentes alguns gatilhos e comportamentos de autossabotagem. "Se pergunte: o quanto de felicidade você é capaz de suportar. Na resposta, dá para identificar uma possível tendência ao problema. E tornar-se consciente dos próprios comportamentos e pensamentos, fica mais fácil lidar com eles", finaliza Holdefer.
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