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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Você é um pouco acumulador? Veja como lidar melhor com isso

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Imagem: iStock

Priscilla Auilo Haikal

Colaboração para o VivaBem

09/10/2019 04h00

Resumo da notícia

  • A lógica de atrelar conforto e consumo faz com que a posse de objetos seja sinônimo de bem-estar, prestígio e valorização social
  • A dificuldade em se desfazer pode indicar problemas emocionais mais sérios e por vezes até com distúrbio psiquiátrico
  • O exercício da solidariedade e generosidade ao doar coisas pode ter um efeito positivo sobre o bem-estar emocional
  • Quem tem menos coisas, tem mais tempo e mais espaço para novas experiências

Em tempos de constantes inovações, o que não faltam são produtos criados para facilitar os dias e, em tese, proporcionar mais tempo para fazer outras atividades. Estamos cada vez mais próximos de um imaginário futurista, onde as coisas ganham inteligência e passam a ter um papel fundamental na nossa rotina.

É uma lógica bastante comum na atualidade, atrelar conforto e consumo na mesma equação, a partir de itens e objetos feitos para nos garantir bem-estar, mas que trazem também prestígio e valorização social. Mas será mesmo que precisamos nos valer de tantas coisas para ficarmos satisfeitos? O aconchego que buscamos está em acessórios ou utensílios que já perderam ou nunca tiveram uso?

A busca por contentamento por meio da aquisição tem a ver com o consumismo da sociedade, mas a dificuldade em se desfazer desses aparatos pode indicar problemas emocionais mais sérios, ligados com sintomas depressivos e por vezes até com distúrbio psiquiátrico. É quando o guardar se transforma em acumular, a ponto de congestionar cômodos e causar sofrimento para o indivíduo.

Diferenças entre manter, colecionar e acumular

Em meio a ofertas mirabolantes de produtos, lançamentos de novas coleções, recebimento de brindes e outros agrados, é comum que em pouco tempo tenhamos uma infinidade de coisas que não sabemos ao certo de onde vieram e nem para o que servem, mas que buscamos conservar. "Se pensarmos em termos evolutivos, tal comportamento é uma adaptação para períodos em que as posses são escassas", explica Bárbara Perdigão Stumpf, psiquiatra do Hospital Governador Israel Pinheiro (IPSEMG). Parte de pessoas que detêm muitas coisas, mas são capazes de jogar diversos itens fora.

Também é possível manter objetos por trazerem lembranças de momentos importantes de nossas vidas, sendo uma forma de preservar a memória e o afeto. Por isso, guardar de forma carinhosa algo que fez parte da sua história é perfeitamente aceitável e normal, desde que não atrapalhe o contexto em que se vive.

Existem ainda os indivíduos que têm como hobby o ato de colecionar peças, numa atividade que, via de regra, está associada ao prazer e não resulta em consequências negativas. "Chama-se de colecionismo o acúmulo de itens de determinado tipo (selos, moedas e objetos de arte). Os colecionadores geralmente são metódicos e organizam, limpam e catalogam seus artigos", detalha a médica. É uma prática bastante comum entre crianças em idade escolar, que por vezes são mantidas até a idade adulta.

"Quando o colecionismo se torna exagerado, desorganizado, sem foco (grande número de categorias de objetos diferentes) e traz sofrimento e prejuízo na vida do indivíduo, estamos diante do chamado transtorno de acumulação", descreve a psiquiatra. É quando existe um apego excessivo pelas coisas, que provoca um impedimento grave para que a pessoa se desfaça de algo.

Soltar e abrir novos espaços

Desapegar não é fácil para muitas pessoas. A prática chega a ser tão desafiadora que já foi tema de livros, palestras e treinamentos apresentados por monges a psicólogos. Vale lembrar que não pode ser considerada como uma alternativa quando envolve um quadro clínico de transtorno, mas é indicado para pessoas que guardam mais do que precisam, por conta de valores sentimentais ou outras explicações que não justificam manter tantos objetos em desuso em casa.

Estudos mostram que a experiência de um evento traumático pode resultar num apego emocional forte a pertences que passem aos indivíduos uma sensação de segurança, exemplifica Stumpf. Na população idosa, o aumento dessa característica é comumente associado com perdas ao longo da vida.

"Eu recomendo que a pessoa comece aos poucos e escolha um item de cada vez. Descarte o que não usou no último ano, como peças de roupas esquecidas no fundo do armário", indica a psiquiatra. "Tenha consigo apenas o que te traz alegria. Todo excesso é prejudicial. Doe, recicle ou simplesmente jogue fora. Quem tem menos coisas, tem mais tempo e mais espaço para novas experiências. Em tempos de consumismo, experimente o minimalismo."

Na avaliação da professora de psicologia da IMED, Cristina Méa, para as pessoas que não têm sintomas de acumulação, um bom jeito de pensar para trabalhar o desapego envolve questionar o quanto se utiliza o objeto que está guardado e se atrapalha o ambiente no local onde fica armazenado. "Pensando desta forma, é possível ter um comportamento de se desfazer do mesmo. Quem não acumula, organiza e mantém o local limpo."

Outra postura que pode colaborar nessa busca por "menos é mais" é imaginar que objetos antigos e com pouco uso podem ter utilidade para outras pessoas, em particular aquelas com menor poder aquisitivo. "O exercício da empatia, solidariedade e generosidade podem ter um efeito positivo sobre o bem-estar emocional", atesta Daniel Costa, psiquiatra especialista em transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) do IPQ HC-FMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).

"Por isso aconselho colocar na balança os prós e contras de adquirir ou acumular coisas. Exemplo: posso satisfazer a minha vaidade ao adquirir um acessório novo, mas por outro lado, posso comprometer o orçamento mensal, ter impacto negativo sobre o meio ambiente ou financiar empresas com iniciativas pouco sustentáveis e humanitárias."

Caso a pessoa tenha transtorno de acumulação, ai é preciso seguir um tratamento. "É recomendada a terapia cognitivo-comportamental, a partir de uma série de técnicas, entre elas a de exposição, na qual um profissional de saúde mental ajuda e acompanha o processo de se desfazer das coisas, já que gera muita ansiedade e incômodo", afirma Edoardo Vattimo, psiquiatra e pesquisador no projeto Transtornos do Espectro Obsessivo-Compulsivo da FMUSP. "São ações realizadas de forma controlada, que buscam incluir o paciente, e com o tempo ocorre o que chamamos de dessensibilização, e a pessoa se acostuma com o descarte."

Dicas para se livrar do desnecessário

  1. Avalie a importância e a utilidade do objeto, levando em consideração quantos outros itens parecidos existem em casa e há quanto tempo não são usados. Pense também se invade espaços do ambiente que não seriam destinados a ele.
  2. Seja honesto consigo mesmo. Caso o artigo não tenha sido utilizado há pelo menos um ano, e não existem planos definidos para usá-lo novamente, descarte-o.
  3. Vá devagar. Organize os cômodos da casa por etapas e tente manter o bom humor e compaixão ao se desfazer das coisas.
  4. Abra mão de artigos mesmo que ainda estejam em bom estado. Não é preciso esperar que tenham algum tipo de defeito para passá-los adiante. Desapegue do que não é mais útil.
  5. Encare o descarte como uma prática solidária, já que muitos itens podem ser de grande serventia para pessoas com menor poder aquisitivo.
  6. Busque viver com o que é essencial e lembre-se: pessoas são mais importantes que as coisas.