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Medida da gordura visceral no início da gravidez prevê risco de diabetes

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Imagem: iStock

Lúcia Helena de Oliveira*

Colaboração para o VivaBem

15/11/2019 12h29

Resumo da notícia

  • Diabetes gestacional costuma surgir no sexto mês de gravidez e ocorre porque substâncias da placenta atrapalham o desempenho da insulina
  • E por mais que esse problema seja associado ao excesso de peso, gestantes magras também têm risco de desenvolver o problema
  • Um estudo brasileiro da UFRGS relacionou a medida da gordura visceral na primeira metade de gravidez com a probabilidade de sofrer o quadro
  • Essa gordura pode ser medida no exame de ultrassom de rotina e deve ser menos do que 4,5 cm

É lá pelo sexto mês de gestação que muita mulher leva o susto: os exames do pré-natal acusam que a glicose sanguínea está nas alturas. Digamos que o desempenho da insulina, que levaria esse açúcar para dentro das células, é atrapalhado por substâncias presentes na placenta. E aí, mesmo que o pâncreas produza doses e mais doses desse hormônio, não adianta. Esse diabetes, o gestacional, é transitório. Some algum tempo depois do parto, quando a placenta vai embora. Mas, enquanto dura, coloca em risco a saúde da mãe e do filho. Sem contar que aumenta o risco de a mulher desenvolver diabetes tipo 2 depois —e este, quando vem, não irá largá-la mais.

O grande problema é o seguinte: muita gestante nem desconfia dos sintomas. Ora, no terceiro trimestre de gravidez, se a fome é de leoa, vão dizer que esse apetite todo é provocado pelo bebê que está em franco crescimento. Se ela faz xixi a todo instante, seria porque a bexiga está sendo pressionada pelo útero e não para o organismo se livrar do açúcar. Se vive cansada demais, falam que deve ser difícil mesmo andar para cima e para baixo com o peso do barrigão? E por aí vai. Tudo confunde.

Mas, segundo o ginecologista Alexandre Rocha, pós-doutorando da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), outra confusão é até pior: "As pessoas imaginam que aquela grávida que está no peso certo não vai ter o diabetes gestacional e que, em compensação, a gestante com obesidade sempre corre esse perigo. Isso está completamente errado", foi logo dizendo, ao apresentar o seu estudo no Congresso Brasileiro de Ginecologia, evento que irá até sábado, 16, em Porto Alegre.

O trabalho brasileiro, inédito no mundo, relaciona a medida da gordura visceral na primeira metade de gravidez com a probabilidade de a mulher desenvolver essa forma de diabetes na reta final até a sala de parto. É um achado e tanto, que ajudará médicos e pacientes a ficarem mais espertos e evitar uma série de complicações. Aliás, não poderia existir melhor data para ser apresentado à plateia lotada de cientistas de todo o país: afinal, isso aconteceu no Dia Mundial do Diabetes (14).

"O fato de não ser gordinha", insistiu Alexandre Rocha aos colegas, "não significa que a paciente está mais protegida da doença. Ao contrário: nós encontramos uma prevalência maior de diabetes gestacional em mulheres magras, isto é, com índice de massa corporal, o IMC, normal", disse ele. E, se as aparências contrariam o senso comum, como então o médico poderia desconfiar quais, entre suas pacientes esperando um bebê, poderiam se tornar diabéticas no terceiro trimestre da gestação, para orientá-las da melhor maneira possível?

"Não adiantava usar a fita métrica, nem pensar na relação da cintura com o quadril por razões óbvias, tampouco usar aqueles instrumentos para checar a gordura subcutânea", lembra Alexandre Rocha. Daí que, baseado em algumas boas evidências científicas, ele apostou, digamos, mais embaixo ainda — precisamente, na gordura que fica entre as vísceras, usando para isso o velho exame de ultrassom em 150 gestantes atendidas entre 2015 e 2017.

Desse modo, descobriu que, até a vigésima semana de gestação, a espessura dessa gordura, mensurada pelo ultrassom 1 centímetro acima do umbigo, de um ponto exato entre os músculos reto abdominais até a aorta, mais ao fundo, indicaria o risco do diabetes gestacional. Esse risco é alto se a profundidade dessa camada gordurosa é igual ou maior do que 4,5 centímetros. Na média, ele é nove vezes maior. Atenção, vale frisar que essa é a média —e quem a puxa para cima são as grávidas mais magras.

Se olharmos só para grávidas com obesidade, essa ameaça se multiplica seis vezes. Já naquelas pacientes que tinham um IMC adequado antes de engravidar, mas com esses 4,5 centímetros de gordura visceral ou mais na vigésima semana, a probabilidade do diabetes gestacional dar as caras chega a ser 14 vezes maior. Uma diferença e tanto.

"O bom é que esse é um exame que toda futura mãe já faz", observa Alexandre Rocha. "É possível aproveitar o ultrassom para medir a translucência nucal —ou seja, para medir uma região da nuca do feto para checar o risco de ele ter síndrome de Down — e fazer também a medida da gordura visceral da mãe em uma só tacada." Provavelmente, desse jeito simples muita grávida acima do peso deixará de ser encaminhada para o acompanhamento de alto risco. Em compensação, muita gestante mais magra receberá a merecida atenção e poderá ser orientada a tempo para ajustar a dieta e aumentar, com orientação, o seu nível de atividade física por exemplo. Tudo para manter o diabetes distante da mãe e do filho.

Nota: A jornalista Lúcia Helena de Oliveira viajou para fazer a cobertura do congresso a convite da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia).

* Lúcia Helena de Oliveira é blogueira do VivaBem e uma jornalista de saúde há mais de três décadas, com cursos de especialização no Brasil e no exterior. Dirigiu por 17 anos a revista SAÚDE, na Editora Abril, editou 38 livros de autores médicos para o público leigo e, recentemente, criou a Vitamina, uma agência para produzir conteúdo e outras iniciativas nas áreas de medicina, alimentação e atividade física.

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