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Inovações em imunoterapia ampliam tratamento para mieloma múltiplo

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Imagem: iStock

Danielle Sanches

Do VivaBem, em Orlando (EUA)*

09/12/2019 09h20

Embora existam diversas drogas aprovadas na última década para o tratamento do mieloma múltiplo —um tipo de câncer que surge na medula óssea e acomete os plasmócitos, células de defesa do nosso corpo— a doença ainda é considerada incurável.

Na busca por um tratamento que possa oferecer uma remissão duradoura aos pacientes que não apresentam respostas para os medicamentos que hoje compõem as primeiras linhas de tratamento, a imunoterapia está sendo considerada cada vez mais a alternativa promissora para esses casos.

O tema foi abordado durante uma aula especial no Congresso da ASH (American Society of Hematology), que acontece em Orlando (EUA) até amanhã (10). O painel contou com a participação de Nina D. Shah, especialista da University of California-San Francisco Medical Center; Adam D. Cohen, especialista da University of Pennsylvania e Ivan M. Borrello, especialista da John Hopkins University, que falou com exclusividade ao VivaBem.

As terapias celulares tiveram grande destaque durante a apresentação, já que a possibilidade de modificar uma célula do paciente para que ela tenha uma função específica (no caso, combater as células cancerosas) vem se tornando uma tendência cada mais forte e promissora para vários tipos de câncer, especialmente o mieloma.

Células híbridas

É o caso, por exemplo, das células CAR-T, como é chamada a tecnologia de "receptor de antígeno quimérico" (chimeric antigen receptors, ou CAR). O sistema consiste em isolar um tipo específico de linfócito (as células de defesa do corpo) chamados de T para que recebam em laboratório um novo gene.

Com isso, eles se tornam capazes de reconhecer um tipo específico de célula cancerígena a ser combatida.
Os linfócitos reprogramados então são multiplicados em laboratório e reinseridos no paciente. Como começam a combater o tumor, há uma resposta inflamatória do corpo, indicando que as células T modificadas estão atuando da forma correta.

O problema é que o tratamento com células CAR-T apresenta reações adversas severas, como febre, baixa pressão arterial e a possibilidade até de lesão renal. É necessário o acompanhamento contínuo dos pacientes que, muitas vezes, precisam ficar na UTI após o procedimento.

Este não é o único desafio. Durante sua exposição, Nina D. Shah lembrou também que, hoje, há um movimento para otimizar a tecnologia CAR-T para mieloma. Isso porque um dos biomarcadores (que indica qual é a célula a ser atacada) mais conhecidos para a doença é a proteína BCMA; no entanto, alguns pacientes apresentam baixos índices dela mesmo com a doença ativa. São necessárias, então, novas pesquisas para se descobrir mais biomarcadores da doença e, assim, conseguir criar células modificadas específicas para eles.

Outra importante questão é o melhor timing para o tratamento com CAR-T. A especialista provocou uma reflexão ao questionar o melhor momento para aplicar a terapia no paciente. "Sabemos que, a cada ciclo de tratamento, há uma queda na resposta do paciente", afirmou em sua apresentação.

Seria interessante, então, considerar o uso do tratamento ainda nas primeiras linhas, quando as células da medula estão relativamente saudáveis e pouco modificadas pelo uso de outros medicamentos. Isso, no entanto, ainda não foi aprovado pelos órgãos reguladores.

Ela ainda lembrou que há médicos propondo a coleta de células T saudáveis antes do início de qualquer tratamento para que possam ser usadas posteriormente; no entanto, o FDA —órgão regulador americano—- ainda precisa aprovar a prática, além de haver entrave por conta do custo elevado de armazenamento desse material.

Nova geração de imunoterapia

Uma outra opção que vem ganhando relevância é a BiTE (bispecifictherapeutic engagers), um tratamento com anticorpos monoclonais biespecíficos. A ideia aqui é que o medicamento, uma molécula de dupla ligação, seja uma ponte para a conexão entre os linfócitos T do paciente e as células cancerígenas, combatendo o tumor. O tratamento ainda estimula a produção de mais células T, aumentando o combate ao câncer.

O grande diferencial da tecnologia é que, diferente da CAR-T, não é necessário retirar as células do paciente e modificá-las em laboratório, tornando o processo menos custoso e mais rápido.

Ao explicitar alguns estudos clínicos combinando BiTE com outros medicamentos, o especialista Adam D. Cohen lembrou da importância em descobrir novos biomarcadores além da proteína BCMA para ampliar sua atuação.

Ele ainda reforçou a importância em trabalhar de forma conjunta com outros especialistas, já que alguns tipos de moléculas BiTE apresentam alta toxicidade ocular e podem causar visão embaçada. "É algo que tem grande impacto na vida do paciente, mas não os impediu de participarem dos estudos", disse.

Uma terceira via

Uma outra opção que ainda requer mais estudos para o uso em mieloma é chamada MILs (marrow infiltration lymphocytes, ou linfócitos infiltrados na medula óssea, em tradução livre). A ideia aqui é que as células da medula sejam coletadas e expostas a anticorpos monoclonais para se tornarem reagentes às células do tumor. Após o procedimento, elas são reintroduzidas no paciente.

O grande diferencial, de acordo com o especialista Ivan Borrello, é que as células da medula têm de três a quatro vezes mais capacidade de memória que as células T, o que proporciona um combate de longo prazo à doença.

Embora tenha mais resultados com pacientes de linfoma, o médico acredita que o mesmo tratamento terá bons resultados também para o tratamento de mieloma. "Os resultados são bastante animadores, especialmente para pacientes com alto risco de recaídas", afirmou o especialista ao VivaBem.

De acordo com Barrello, que realiza estudos com células da medula há 15 anos, uma das próximas etapas de análise é aplicar a tecnologia CAR em células da medula óssea. "Os medicamentos quimioterápicos são importantes na fase inicial do câncer, quando atacamos as células ruins", explica. "Já a terapia celular tem a capacidade de baixar ainda mais a contagem das células cancerígenas, baixando seu volume até um número seguro."

*A repórter viajou para Orlando a convite da Amgen