Estudar coisas diferentes em pouco tempo beneficia a memória
Realizar tarefas ou obter aprendizados diferentes em um curto espaço de tempo ajuda a garantir que mais informações sejam armazenadas na memória. É o que mostra pesquisa publicada na revista científica Nature e liderada por Michael Crossley, neurocientista da Universidade de Neurociência de Sussex, no Reino Unido.
"Por nossas próprias experiências sabemos que aprender várias coisas em um curto espaço de tempo pode muitas vezes ser difícil. Há o risco de confundir as informações, lembrar de uma coisa ou não lembrar de nada. Mas quais são as regras que determinam as memórias que ficam e as que são perdidas?", disse o pesquisador Michael Crossley à Agência Einstein.
Para ajudar a desvendar como o cérebro seleciona quais aprendizados adquiridos em um curto espaço de tempo serão consolidados na memória, o neurocientista e uma equipe de estudiosos submeteram os caramujos de água doce Lymnaea a uma série de tarefas - semelhantes e distintas - em intervalos de duas e 24 horas. Embora estes moluscos tenham cérebro muito mais simples do que os dos humanos, Crossley explica que muitas das regras de aprendizagem por eles processadas são similares às nossas.
Além disso, o fato de estes animais terem neurônios maiores e em menor quantidade que o dos humanos (são cerca de 30 mil ante 86 bilhões nos humanos), é mais fácil identificar onde as memórias são armazenadas. "Algumas destas células nervosas podem ser localizadas pelo tamanho, forma, cor e até propriedades físicas, o que significa que podemos verificar as mudanças nelas ocorridas nos momentos de aprendizagem", diz.
O que o estudo descobriu é que os caracóis têm mais dificuldade para aprender duas tarefas semelhantes e mais facilidade para memorizar as diferentes. Isso porque, de acordo com Crossley, as memórias para as atividades semelhantes são codificadas no mesmo neurônio e a mais recente substitui a lembrança original. Já as memórias para tarefas diferentes são armazenadas em regiões distintas do cérebro, permitindo que ambas sejam gravadas.
"Portanto, o uso do mesmo neurônio para as duas memórias similares limita a capacidade do animal de aprender as duas tarefas sequencialmente, enquanto o uso de diferentes neurônios para as diferentes tarefas permite que o animal aprenda as duas atividades em um curto período", explica o cientista.
Os pesquisadores acreditam que apesar da complexidade do cérebro humano, o processamento das informações adquiridas acontece de forma parecida com o apresentado pelos caracóis. Por isso, alternar o aprendizado de diferentes ao longo de um dia é uma boa forma de reter na memória mais informações. "Treinar futebol e um idioma no mesmo dia é mais vantajoso que treinar vários tipos de passes de futebol sequencialmente", afirma Crossley.
Outra dica para reforçar no cérebro as informações adquiridas ao estudar é a repetição do conteúdo estudado em intervalos não muito longos. "O ideal seriam intervalos de menos de uma semana", diz Raymundo Machado de Azevedo Neto, assistente de pesquisa do Instituto do Cérebro, do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (IIEP).
Lapsos de memória
Tanto no cérebro dos caracóis quanto no dos humanos, durante a consolidação de alguma informação, o aprendizado recém-adquirido transita da memória de curto prazo (capacidade de reter uma pequena quantidade de informação de forma prontamente disponível para acesso durante um curto espaço de tempo, que varia de meio segundo até a alguns minutos) para a de longo prazo (que guarda de forma duradoura a informação, em um tempo que pode variar de minutos até a vida toda, permitindo sua recuperação em qualquer momento).
A pesquisa com os caracóis mostrou ainda que no período em quem a memória original está nesta fase de transição, ela se torna vulnerável, o que chamamos de lapso de memória. Assim, se o caracol aprende algo novo diferente ou semelhante ao aprendizado anterior neste período, a memória original sempre é substituída pela nova.
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