Conheça os sinais que indicam um problema ocular no bebê e saiba evitá-lo
A artesã Léia dos Reis Souza, 23, notou o estrabismo da filha Ágatha aos 2 meses de vida, porém o pediatra informou que o problema seria resolvido espontaneamente. Não satisfeita com a resposta, Leia conseguiu, depois de uma longa espera, novas consultas no SUS (Sistema Único de Saúde).
Após pelo terceiro médico, a bebê, aos 6 meses, foi diagnosticada com catarata congênita —o estrabismo pode ser um dos sinais da doença, que leva à cegueira. Embora o médico tenha dito que o caso estava perdido e que a operação não salvaria a visão de sua filha, Léia buscou uma segunda opinião e conseguiu, por meio de uma assistente social, uma consulta no Hospital das Clínicas (SP), que refutou o diagnóstico irreparável.
No momento, Ágatha, atualmente com 1 ano de idade, está prestes a realizar a operação de catarata e, finalmente, recuperar a sua visão.
O caso de Ágatha ilustra bem a dificuldade no diagnóstico precoce de doenças oculares. Entre as 33 mil crianças cegas no Brasil, cerca de 70% dos casos poderiam ser evitados ou melhorados com um tratamento efetivo, segundo o Conselho Brasileiro de Oftalmologia.
Daí a importância de cuidar da visão do bebê desde a gestação até 1 ano e meio de idade, período mais crítico do amadurecimento visual, em que o desenvolvimento visual está a todo vapor.
Gestação saudável
"As doenças infecciosas contraídas ainda na gestação são as principais causas de alterações oculares no nascimento. Um pré-natal adequado possibilita a identificação e o uso de medicamentos para diminuir as consequências graves para a saúde do bebê", explica a doutora e oftalmopediatra da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Julia Dutra Rossetto, integrante do grupo de trabalho em oftalmologia pediátrica da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatra).
O ideal é tomar precauções relativamente simples durante a gravidez. A prevenção inclui: lavar bem verduras e legumes e evitar a ingestão de alimentos crus, no caso da toxoplasmose; ter atividade sexual segura para não contrair sífilis, HIV e herpes genital; e precauções de contato e higiene das mãos, nos casos de herpes e citomegalovírus.
Já a rubéola, transmitida por um vírus, deve ser prevenida por meio de vacina, distribuída gratuitamente no SUS. Por fim, o vírus da zika pode ser evitado com a eliminação de pontos de foco do mosquito Aedes aegypti, além de usar blusa de mangas longas. Se algum desses problemas ocorrer durante a gestação, o bebê deve ser encaminhado para exame oftalmológico o quanto antes.
Cuidados após o nascimento
Uma medida importante de prevenção é o TRV (Teste do Reflexo Vermelho), conhecido como o Teste do Olhinho, obrigatório apenas em alguns estados brasileiros. É realizado na maternidade nas primeiras 48 horas de vida do bebê e consiste na incidência de um feixe de luz através dos olhos da criança.
Desse modo, o médico consegue perceber alterações no reflexo, detectando doenças como a catarata congênita, o glaucoma congênito, o retinoblastoma (tumor intraocular) e a retinopatia da prematuridade (hemorragia retiniana ou descolamento de retina).
Segundo recomendação do Ministério da Saúde, o TRV deve ser repetido pelo pediatra ou oftalmologista de duas a três vezes ao ano nos três primeiros anos de vida, pois muitos dos sintomas são identificáveis apenas após a saída da maternidade.
De acordo com a médica Julia Dutra Rossetto, independentemente do TRV, todos os bebês devem ser examinados pelo oftalmologista pediátrico antes dos seis meses de idade, ou no máximo no primeiro ano de vida e, então, repetir as consultas anualmente.
Já os bebês nascidos prematuros necessitam de cuidados dobrados com a visão. Segundo a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) cerca de um terço dos bebês nascidos com peso inferior a 1.500 gramas ou antes de 32 semanas de gestação sofrem com retinopatia da prematuridade, uma alteração nos vasos sanguíneos capaz de levar ao descolamento da retina e ao risco de cegueira.
Essa é a segunda maior causa de cegueira infantil, perdendo apenas para as infecções. Para evitar o risco, os prematuros devem fazer exame de fundo de olho ainda no primeiro mês de vida.
Como identificar um problema de visão no bebê
"Ao nascer, a visão do bebê ainda não está desenvolvida e ele enxerga o rosto da mãe apenas como um borrão, mas vai melhorando intensamente nos primeiros três meses de vida e, mais lentamente, até cerca de sete anos de idade", explica a oftalmologista Célia Nakanami, chefe do Núcleo de Oftalmopediatria da Unifesp.
A seguir, acompanhe o comportamento visual de um bebê saudável, segundo a médica:
Primeiro mês: o bebê percebe luz e fecha os olhos à incidência de luz neles. A fixação do olhar é fugaz e muitas vezes nem consegue fixar.
Segundo mês: inicia certo contato visual, tem interesse por objetos brilhantes e começa a movimentar os dois olhos conjuntamente, além de dar maior atenção ao rosto da mãe.
Terceiro ou quarto mês: é capaz de seguir objetos próximos (cerca de 2 metros), reconhecer rostos, além de manter contato visual, respondendo com expressões faciais. Reage a cores fortes ou de alto contraste.
Sinais de perigo: se houver lacrimejamento, vermelhidão, intolerância à luz, perda nos brilhos dos olhos, estrabismo, inchaço na pálpebra, tremor involuntário dos olhos e falta de interesse pelo ambiente e pelas pessoas que o cercam.
Entenda as doenças
Veja abaixo os problemas oculares que podem ser diagnosticados precocemente por meio do Teste do Olhinho na maternidade, segundo a oftalmologista Ana Beatriz Ungaro Crestana, cirurgiã ocular, com formação e especialização pela FM-USP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
Durante as consultas pediátricas de rotina, peça ao pediatra para refazer o teste e, de preferência, leve o bebê ao oftalmologista.
Catarata: é uma doença ocular que deixa o cristalino opaco, impedindo a visão em graus variados, conforme sua gravidade. A evolução pode ser lenta e a doença ser unilateral (em um dos olhos) ou bilateral (em ambos os olhos) ou ainda total já desde o nascimento. A catarata congênita pode ser isolada e sem causa aparente, decorrer de herança genética ou ser provocada por infecções durante a gravidez, como a toxoplasmose ou rubéola.
Sintomas: a catarata faz com que a pupila, normalmente negra, fique com aspecto esbranquiçado. O bebê pode ter dificuldade em abrir o olho na luz, apresentar estrabismo ou dificuldade em acompanhar os objetos com a visão.
Glaucoma: a doença aumenta a pressão intraocular e provoca lesão no nervo óptico, impedindo-o de cumprir sua função de conduzir imagens da retina ao cérebro. Se não for tratado, o glaucoma leva ao dano permanente do disco óptico, que pode progredir para a cegueira.
Sintomas: até o primeiro ano de vida, o aumento da pressão pode levar a um edema na córnea, que perde o brilho e a transparência, ficando com a aparência turva e azulada. O bebê apresenta desconforto à luz, lacrimejamento e costuma fechar ou cobrir os olhos com as mãos. Também pode ocorrer o aumento do volume do globo ocular, com olho de aspecto "saltado" e córnea grande. Se não tratado, os sintomas progridem e pioram rapidamente.
Tratamento: a solução nos dois casos é cirúrgica, a fim de corrigir o problema e permitir o pleno desenvolvimento visual da criança. No glaucoma, alguns casos, de início mais tardio, podem ser controlados apenas com colírios. Em outros, a operação precisa ser realizada o mais precocemente possível. Já na catarata, a cirurgia deve ser feita o quanto antes para alcançar um bom resultado.
Estrabismo: os músculos que controlam os movimentos dos olhos não funcionam em sincronia, fazendo com que eles não se movam paralelamente. O estrabismo pode estar presente, por imaturidade da movimentação ocular, até por volta dos 3 ou 4 meses de vida. Mas seja qual for o motivo, a criança deve ser levada ao oftalmologista assim que o desvio for notado. O momento e a necessidade de intervenção vai depender do tipo e da gravidade do estrabismo, que serão definidos no exame oftalmológico. Exercícios, óculos e tampão são alternativas à correção por meio de cirurgia. O estrabismo pode ocorrer em várias situações que causam déficit visual, a exemplo da catarata.
Retinopatia da prematuridade: acomete alguns prematuros porque os vasos sanguíneos que nutrem a retina têm seu desenvolvimento perturbado pelo final precoce da gestação podendo parar de crescer ou crescer de maneira anormal, comprometendo a visão. Se for diagnosticada rapidamente, a condição não é grave e não prejudica a visão em 90% dos casos. Casos graves exigem aplicação de laser, cujos raios barram o crescimento anormal dos vasos.
Retinoblastoma: é um câncer que atinge do recém-nascido até crianças de 5 anos. Muitas vezes é descoberto ao ser visualizado em fotografias por meio do reflexo branco na pupila, popularmente conhecido como "reflexo do olho de gato". Na maioria dos casos, o retinoblastoma é uma doença curável, caso seja diagnosticado precocemente. O tratamento consiste em quimioterapia e radioterapia. Em casos graves e diagnóstico tardio, é preciso recorrer à enucleação, isto é, à retirada cirúrgica do globo ocular.
Sinais de problemas oculares dos 3 aos 15 anos
Nessa fase, o problema mais comum é o uso de óculos ou lente de contato para recuperar ou atingir a capacidade de enxergar perfeitamente. A miopia, o astigmatismo ou a hipermetropia podem reduzir a visão ou levar progressivamente à cegueira se não forem corrigidos.
De acordo com dados do CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia), cerca de 20% dos escolares apresentam alguma alteração oftalmológica e necessitam de correção óptica, principalmente na idade de 11 a 15 anos de idade, pico de incidência de alterações refracionais. Estes problemas podem atrapalhar o desempenho escolar e a interação da criança com outras pessoas, afetando seu desenvolvimento cognitivo e a sociabilidade.
Dificilmente as crianças se queixam de visão alterada, por isso a atenção dos pais e professores é fundamental. Entre os sinais estão dor de cabeça persistente, vermelhidão, coçar os olhos, piscar frequentemente, fechar ou franzir as pálpebras para enxergar melhor, aproximar muito os objetos ou livros dos olhos, aproximar-se da TV para ver melhor, baixo rendimento escolar, além de esbarrar em móveis ou tropeçar com frequência. Para detectar algum problema, é recomendado exame oftalmológico ao redor dos três a quatro anos, e anualmente a partir dos cinco anos.
Os principais problemas de refração estão listados abaixo:
Miopia: é a deficiência visual que dificulta a visualização de objetos que estão longe. É causada por um aumento anormal do eixo ocular ou por uma ação de refração muito intensa do cristalino, fazendo com que a imagem se forme antes da retina. Dessa forma, objetos que se encontram longe do indivíduo não ficam nítidos.
Hipermetropia: é uma anomalia da refração ocular que faz com que a imagem seja formada atrás da retina, o que dificulta a visualização de objetos a uma curta distância ou exige um esforço excessivo dos músculos do olho para alcançar o foco, podendo causar diversos sintomas.
Astigmatismo: é uma distorção da imagem por diferença de grau em um eixo da córnea. Dificulta principalmente o foco para longe, porém interfere em todas as distâncias.
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