MG: Justiça obriga casal a vacinar filhos; pais alegam questões religiosas
Resumo da notícia
- Casal de Poços de Caldas (MG) foi obrigado pela Justiça a vacinar os dois filhos menores
- Os pais alegaram questões religiosas e também de saúde para a recusa da vacinação
- As alegações, porém, não convenceram a Procuradoria-Geral de Justiça
- Infectologista afirma que a falta da vacina pode levar risco a outras pessoas
- Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil disponibiliza 300 milhões de doses de vacinas todos os anos
Um casal de Poços de Caldas (MG) foi obrigado pela Justiça mineira a vacinar os dois filhos menores, colocando em dia a carteira de imunização e aplicando as próximas doses previstas no Calendário Nacional de Vacinação do Ministério da Saúde.
A decisão foi da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do estado. Segundo o judiciário mineiro, os pais já haviam sido orientados e advertidos sobre a necessidade de vacinar as crianças, mas se negaram. O casal alegou questões religiosas e também de saúde para a recusa.
A ação julgada no TJ foi proposta pelo Ministério Público de Minas, após um relatório do Conselho Tutelar da cidade a respeito da falta de imunização nas crianças. O MP, inclusive, registrou boletim de ocorrência para obrigar os pais a vacinar as crianças.
O caso corre em segredo de Justiça e, por isso, o TJ e o MP não concederam entrevistas, apenas informações da assessoria de imprensa. Não há como saber, por exemplo, nomes, idades e quem fez a denúncia ao Conselho Tutelar.
De acordo com o tribunal, a ação teve início em julho de 2018. O MP entrou com o pedido para que as crianças fossem protegidas com as vacinas pendentes, e a solicitação foi julgada procedente.
Os pais, porém, recorreram. Eles argumentaram terem decidido por não vacinar após realizarem várias pesquisas embasadas em artigos científicos e trabalhos médicos do Brasil e exterior.
Também afirmaram que a sua "boa-fé", segundo o TJ, ficou comprovada porque a filha mais velha deles recebeu todas as doses estipuladas pelo governo.
Mas os pais decidiram não aplicar as doses nos filhos menores depois de se converterem à religião Igreja Gênesis II da Saúde e da Cura que, de acordo com o alegado pelo casal no processo, proíbe o que chama de "contaminação por vacina". Para eles, o estado impor a vacina configura violação do poder familiar e do direito à liberdade religiosa.
As alegações, porém, não convenceram a Procuradoria-Geral de Justiça. Para o relator da ação, Dárcio Lopardi Mendes, o caso se encaixa na obrigação determinada pela Constituição de 1988 de o estado assegurar a saúde como um direito de todos. "E a vacinação engloba mais do que a proteção imunológica do próprio indivíduo vacinado, alcançando toda a sociedade, uma vez que o vetor se torna inócuo", acrescentou o desembargador, que preferiu não gravar entrevista.
Sobre a alegação do casal para a escolha por não vacinar devido a questões religiosas, o interesse das crianças se sobrepõe a posições particulares dos pais, de acordo com o acórdão do relator.
Ainda segundo ele, nos autos há informações de que a igreja a qual o casal faz parte permite aos adeptos escolherem a forma como se protegerão de eventuais doenças, sem impedir a imunização, como alegado pelo casal. O relator afirmou que sua decisão não viola o poder familiar alegado pelos pais por se tratar de garantia a um direito constitucional dos filhos.
Risco a outras pessoas
A infectologista Rosana Richtmann destacou a responsabilidade dos adultos ao decidirem sobre não vacinarem os menores. "Tem vacinas que se a pessoa decidir não fazer, ela está colocando em risco a saúde dela. E tem vacinas que se ela não fizer, ela corre risco mas pode também servir de transmissora para outras pessoas que não podem tomar vacinas", disse.
O sarampo, que assustou a população brasileira no ano passado, com mais de 13 mil casos registrados no país, é usado por Richtmann como um exemplo para mostrar a importância da imunização. "O sarampo é uma doença de muito fácil transmissão. Se a pessoa tem em casa um irmão, por exemplo, que faz quimioterapia por causa de um câncer e não pode tomar a vacina contra o sarampo, porque é contra indicada nesse caso, e a outra pessoa se recusa a se proteger, ela está colocando em alto risco quem não pode tomar a vacina."
A especialista diz que tenta mostrar aos pacientes a importância das doses sem a necessidade de processar, mas considera que a ação judicial é válida nos casos de recusa para preservar a saúde das crianças.
Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil disponibiliza 300 milhões de doses de vacinas todos os anos, sendo um dos países com maior número de doses oferecidas pela rede pública.
O advogado especialista em Direito Médico e Hospitalar Eduardo Estevam da Silva explicou que o judiciário tem julgado casos assim por causa, principalmente, do conflito entre a liberdade de convicção filosófica dos pais e do direito à solução interna das questões familiares com o direito à proteção da vida e saúde do menor.
O entendimento mais comum do judiciário, segundo Silva, é garantir o acesso das crianças à vacinação.
Ele lembra o caso de Paulínia (SP), do ano passado, em que a Justiça obrigou os pais a imunizar o filho de três anos, que nunca havia sido vacinado. "O Supremo Tribunal Federal tem se posicionado sempre em fazer garantir a tutela de ordem pública sobre a saúde, a vida e os direitos da criança", afirmou.
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