Vacina que protege bebês contra 5 doenças falta no país; saiba os riscos
Postos de saúde de todo o país estão sofrendo com a falta da vacina pentavalente, uma das mais importantes e completas imunizações para recém-nascidos e que protege contra cinco doenças (difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e contra a bactéria haemophilus influenza tipo b, que causa a meningite). Por conta disso, o calendário de imunização para bebês de até seis meses foi alterado e conta agora com outras duas vacinas, mas que não protege contra a meningite.
Segundo apurou o VivaBem, a falta de vacina ocorre pelo menos desde maio do ano passado. Uma remessa com 3,2 milhões de doses, comprada pelo Ministério da Saúde, foi reprovada e não pôde ser utilizada. Como o país não produz a vacina, a compra precisa passar por vários trâmites, o que levou ao atraso no envio aos municípios. O próprio site do ministério afirma que o abastecimento está parcialmente suspenso desde julho de 2019.
Uma nota divulgada ontem pelo Ministério da Saúde diz que o órgão vai distribuir "a partir desta quinta-feira (9) um total de 1,7 milhão de doses da vacina pentavalente para os estados. Após recebimento pelo estado, o produto passa a ser encaminhado aos municípios. Entre junho e dezembro, a oferta esteve irregular devido a problemas com o fornecedor".
A vacina é dada em um esquema de três doses aos 2, 4 e 6 meses de idade. Segundo o ministério, o país demanda uma média de 800 mil doses mensais dessa vacina (9,2 milhões por ano). Entretanto, em 2019 foram repassados 4,7 milhões —menos da metade do necessário.
Por conta da falta prolongada, o esquema vacinal de crianças precisou ser alterado e outras duas vacinas entram no lugar temporariamente: a DTP e outra contra a hepatite B.
Substituição
O VivaBem obteve um documento de 2 de janeiro —assinado por Geraldo da Silva Ferreira, secretário de Vigilância em Saúde— em que a pasta orienta os secretários de saúde de todo o país para que, no lugar da pentavalente, sejam dadas a DTP (que protege contra difteria, tétano e coqueluche) e uma dose da vacina contra Hepatite B no esquema básico.
De acordo com Juarez Cunha, presidente da SBIm (Sociedade Brasileira Imunizações), o ministério tomou a melhor decisão possível para o momento. "A coqueluche teve um número importante de casos ano passado (mais de 1.300), por isso não podemos deixar a população desprotegida. O problema, na verdade, é a logística para fazer os postos de saúde mudarem o esquema e, claro, que as crianças ficam desprotegidas da haemophilus".
Como são muitas doses a serem substituídas, a dúvida sobre a falta da DTP e da vacina contra a hepatite entrou em pauta. Cunha, entretanto, descarta essa preocupação, pelo menos por agora. "Como é para ser uma medida temporária, imagino que não vá ocorrer a falta da tríplice. Mas não tem como saber".
Soraya Galdino, secretária de Saúde de Itabaiana e presidente do Cosems (Conselho da Secretarias Municipais de Saúde) da Paraíba, criticou a medida. "Isso é muito ruim. Primeiro porque a penta imuniza contra cinco tipos de doenças, e a DTP só três. Segundo que, desde a entrada da penta, a DTP está sendo usada em maiores de um ano só para o reforço; agora teremos que voltar ao esquema antigo. E ainda teremos a perda da HIB (contra um dos tipos da meningite) que não tem ela sozinha, nem na DTP". No estado da Paraíba, todos os municípios relatam problemas no estoque.
Em Alagoas, o problema atinge os postos há pelo menos dois meses, o que deixa uma demanda reprimida. "Como tem dois meses que está faltando, a gente precisaria que o ministério mandasse três cotas. A nossa cota mensal é em torno de 16 mil doses. Precisaria mandar 48 mil para gente atender atender a demanda reprimida, mas ele já sinalizou que não vai mandar essa quantidade. A gente já se preocupa porque sabe que vai atender algumas crianças, mas não todas", afirma Denise Castro, assessora técnica do Programa Nacional de Imunização em Alagoas.
No Norte, o problema também atinge todos os estados, segundo apurou a reportagem. "Em todos os municípios têm falta dessa vacina. Inclusive tendo uma espécie de racionamento do envio. Em Tefé, por exemplo, normalmente são enviadas 1.000 doses mensais. Atualmente, estão sendo enviadas apenas 200", conta Januário Neto, presidente do Cosems do Amazonas.
No Centro-Oeste, Sudeste e Sul, os problemas são parecidos. São Paulo, por exemplo, precisa de cerca de 200 mil doses mensais, mas o desabastecimento está ocorrendo desde o início de 2019. Apesar de o ministério afirmar que o desabastecimento ocorre desde julho de 2019, alguns estados confirmaram que estão sem doses suficientes antes desse período.
Segundo o Cosems-SP, o estado tem recebido do Ministério da Saúde quantitativo insuficiente para atender a demanda atual, o que também não é suficiente para vacinar as crianças que não estão recebendo a vacina desde o primeiro semestre de 2019. "Apesar de alguns municípios ainda terem um estoque, vários estão zerados desde o Natal", afirmaram.
Em Santa Catarina, que precisa de 28 mil doses por mês, o problema existe desde maio e junho, quando receberam apenas 50% do ideal. Em julho foi 44%, em agosto e setembro não receberam e em outubro vieram apenas 22 mil. "Em 26 de novembro o ministério mandou uma nota dizendo que não seria possível abastecer o estado, mas que receberam 4 milhões de doses e que estavam aguardando a baixa da Anvisa. Até agora não recebemos mais nenhuma informação", disse a Secretaria de Estado da Saúde.
O problema levou os secretários municipais de saúde a cobrarem uma definição do governo federal. "Nós temos conversado com o ministério e com a Anvisa. A gente sabe que às vezes chega uma carga e, por questões alfandegárias e de vigilância, demora um pouco o processo. Sabemos das restrições colocadas pela Anvisa em algumas vacinas, então é um processo que está sendo monitorado", conta Mauro Junqueira, secretário executivo do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde).
Ministério confirma falta
Em nota encaminhada ao VivaBem, o Ministério da Saúde informou que, em 2019, foram distribuídas 4,7 milhões de doses da vacina pentavalente aos estados. Entretanto, na nota enviada aos secretários, a pasta diz que o calendário temporário deve ser adotado "até que seja normalizada a distribuição da vacina penta, prevista para março de 2020."
O motivo para o desabastecimento, diz o ministério, é que uma remessa de vacina pentavalente, "adquirida por intermédio da Opas, foi reprovada em teste de qualidade feitos pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) e análise do Ministério da Saúde. Por este motivo, as compras com o antigo fornecedor, a indiana Biologicals E. Limited, foram interrompidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que pré-qualifica os laboratórios."
Segundo Juarez Cunha, o presidente da SBIm, é importante que as doses sejam seguras, eficazes e de qualidade. Qualquer vacina que entre no país passa pelo teste de qualidade. "Eles só liberam essas vacinas de acordo com uma avaliação técnica. Se ele corresponde a tudo aquilo que o produto deve ser, vai para logística de distribuição", diz.
Cunha afirma que a reprovação de doses não é uma novidade, mas não se recorda de um quantitativo tão grande. "Quando 50 ou 100 mil doses são bloqueadas, faz parte da rotina. Elas retornam ao laboratório, que as repõem com facilidade. Agora, 3,5 milhões é muito. Para repor isso, demora. Não me lembro de nenhum outro momento de dificuldade de reposição nessa quantidade. Juntando com a baixa cobertura (10 a 15%), estamos falando de 10 ou 12 milhões de doses a serem colocadas em dia."
A pasta informou que solicitou reposição do fornecimento à Opas, já que ela não é fabricada no Brasil. "Foi feita nova aquisição de 8 milhões de doses e essas vacinas começaram a chegar de forma escalonada em agosto no Brasil. Quando os estoques forem normalizados, o Sistema Único de Saúde (SUS) fará busca ativa pelas crianças que completaram dois, quatro ou seis meses de idade, para vaciná-las", informa.
Rede privada
Apesar da falta na rede pública, a vacina pentavalente está disponível na rede particular. Segundo a ABCVAC (Associação Brasileira das Clínicas de Vacina), cada dose custa entre R$ 270 e R$ 350 nas clínicas de São Paulo.
A entidade afirma que, embora ainda não haja falta do produto na rede privada, o desabastecimento pode ocorrer, já que "não há disponibilidade para novas aquisições de estoque".
A importância da pentavalente
Desde 2012, o PNI (Programa Nacional de Imunizações), do Ministério da Saúde, oferta a vacina pentavalente na rotina do Calendário Nacional de Vacinação. As crianças devem tomar três doses da vacina: aos 2, aos 4 e aos 6 meses de vida.
A vacina pentavalente pode provocar algumas reações, geralmente entre as primeiras 48 a 72 horas após a aplicação. Na maioria das vezes são reações leves, que passam rápido e não deixam sequelas. As principais reações são febre, irritabilidade e dores locais.
Crianças com 7 anos ou mais de idade não podem tomar a penta. Além disso, se o bebê tiver apresentado reações em dose anterior, como moleza e palidez nas primeiras 48 horas, convulsões nas primeiras 72 horas, reações alérgicas nas primeiras duas horas e encefalopatia aguda nos primeiros sete dias após a vacinação, ele também não deve tomá-la novamente. (*Com Estadão Conteúdo)
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