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Os danos do álcool para quem convive com um alcoólatra

Há poucos estudos a respeito das pessoas que vivem próximas de quem bebe excessivamente - iStock
Há poucos estudos a respeito das pessoas que vivem próximas de quem bebe excessivamente Imagem: iStock

Fábio Oliveira

Agência Einstein

31/01/2020 11h59

Agressão, assédio, problemas de relacionamento e financeiros. Consumir bebidas alcoólicas em excesso afeta o indivíduo e também as pessoas de sua convivência. Foi o que mostrou um estudo recém-publicado no periódico científico Journal of Studies on Alcohol and Drugs. O trabalho obteve dados de duas pesquisas realizadas nos Estados Unidos. Ao todo, foram ouvidos por volta de nove mil adultos. Os resultados revelaram que 21% das mulheres e 23% dos homens sofreram algum tipo de dano causado pela bebedeira de alguém. Ao todo, estima-se que um em cada cinco americanos, ou 53 milhões de pessoas, passam por esse tipo de situação.

"O interessante deste estudo é colocar em foco justamente as pessoas que sofrem com a ingestão alcoólica de terceiros, ao invés do grande consumidor", comenta o psiquiatra André Felipe Castro Ferreira Martins, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. É possível assim ter uma ideia de que os problemas relacionados à ingestão excessiva vão muito além da esfera individual. Comportamentos de risco, como dirigir embriagado e violência doméstica, atingem outras vítimas. "Sem falar que um paciente com dependência de álcool frequentemente terá problemas no trabalho, como baixo desempenho e necessidade de afastamentos."

Apesar de a pesquisa ter sido feita nos Estados Unidos, o quadro é parecido entre a população brasileira. "No Brasil, cerca de 70% dos homens declaram consumir álcool. Quase 25% declaram que bebem e dirigem", revela Castro. "Os estudos que focam especificamente nos transtornos da substância a terceiros ainda são poucos, mas podemos estimar que esse número é grande."

As consequências variam de acordo com o gênero. Entre os homens, por exemplo, houve mais registro de agressão física. Entre as mulheres, problemas familiares e financeiros. Por que ocorre esse corte por gênero? "Sabemos que os homens em geral têm mais problemas com álcool do que as mulheres", diz o psiquiatra. Muitos deles, por sua vez, moram com mulheres, esposas e mães que lidam e sofrem diariamente com essa questão.

Homens também são mais propensos a praticar binge drinking, fenômeno caracterizado pela ingestão de grande quantidade de álcool em pouco tempo. O comportamento está ligado ao envolvimento em situações de risco, como dirigir embriagado e prática sexual sem proteção.

Consequências no trânsito

"Estudos recentes apontam o Brasil como quinto país no mundo com mais mortes relacionadas a acidentes de trânsito", diz Castro. São 40 mil mortes por ano e 150 mil pessoas seriamente feridas. "Se pensarmos que muitos desses acidentes possuem relação com o consumo indevido de álcool e direção, temos um problema de saúde pública."

Pesa também o fato de o álcool não ser visto como uma substância que leva à dependência. "Muitas pessoas ainda o enxergam como uma droga menos danosa pelo fato de ser legalizado", diz André Felipe. Ele cita um estudo publicado recentemente no periódico científico The Lancet que classifica o álcool como a droga mais perigosa de todas, justamente porque, além de causar muitos problemas de saúde para os usuários, está envolvida em transtornos para terceiros e para a comunidade como um todo.

"Sabemos que intervenções precoces são necessárias", diz Castro. "Quanto mais cedo uma pessoa começa a beber, mais risco vai ter tanto de desenvolver uma dependência de álcool, como de se envolver em padrões de consumo nocivos para a saúde." Segundo o psiquiatra, é importante que seja feita fiscalização adequada para inibir o consumo de bebidas alcoólicas entre menores de idade e, desde cedo, abordar esse assunto em casa e nas escolas.

Isso não quer dizer que a cerveja ou vinho devam ser banidos do dia a dia das pessoas. "É possível regulamentar sem proibir", fala Castro. "Existem festas hoje em dia que fazem acordos com empresas de táxi ou aplicativos de transporte privado para incentivar as pessoas a não irem de carro". Outra saída que vem sendo muito discutida, conta o psiquiatra, é a proibição de festas open bar, que estimulam o consumo em binge. Isso aumenta o risco de confrontos físicos e de dirigir embriagado. "Não há solução perfeita, o importante é adequar estratégias à realidade de cada população", finaliza.

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