É mais difícil fazer amigos depois de adulto: como ter amizades próximas
Resumo da notícia
- Por toda a pressão e carga emocional, a amizade tem um papel fundamental na vida adulta
- Quando ficamos adultos, acabamos criando muitas barreiras e preconceitos que nos afastam das amizades
- É essencial criar brechas de tempo entre família e trabalho para vivenciar as amizades
Conquistar e manter fortes amizades costuma ser muito natural na infância, mas conforme os anos passam, a sensação é de que acabamos perdendo essa habilidade. Isso porque, diferentemente de quando somos mais novos, ter amigos próximos na vida adulta vai além de apenas querer: é preciso se dedicar e manter uma certa abertura para que a relação consiga florescer. A boa notícia é esse esforço pode valer muito a pena.
A amizade em cada fase da vida
Quando a gente é criança ou jovem, nossas relações de amizade são construídas na escola e na faculdade, por exemplo. Nessa fase da vida, todo nosso universo gira em torno do estudo basicamente, então acabamos construindo nossas relações de amizade no âmbito escolar. "Ali, temos muitas afinidades, vivemos o mesmo momento da vida etc. Além disso, para uma criança para ficar amiga de outra, basta as duas querem brincar da mesma coisa. É muito pouco o que precisa para estabelecer uma conexão entre eles", conta a psicóloga Angelita Corrêa Scardua, pesquisadora do Departamento de Psicologia Social da USP (Universidade de São Paulo).
E o raciocínio só fica mais aprimorado da adolescência até o início da vida adulta, mas não muda tanto. Gostar da mesma banda, do mesmo esporte ou fazer o mesmo curso na faculdade é suficiente para aproximar as pessoas nessa fase da vida. Esses são momentos de descoberta do mundo, nossas "caixinhas mentais" não estão muito bem definidas sobre o que queremos da vida, temos um ambiente mais aberto para as possibilidades em geral.
Mas quando entramos com os dois pés na vida adulta, toda a carga de trabalho, família e filhos passa a ocupar nossa rotina, nos roubando o tempo que tínhamos para explorar o mundo. Ficamos muito envolvidos com obrigações e responsabilidades e isso limita o tamanho das nossas possibilidades. Por conta dessas obrigações, nós também ficamos mais calejados, porque já vivemos muitas coisas e nos relacionamos com muitas pessoas, então acabamos estabelecendo as caixinhas do que queremos ou não.
"Ficamos muito restritivos. Se eu tive duas experiências negativas de amizade ou relacionamento com pessoas com determinado perfil, já colocamos na cabeça que não gostamos de pessoas assim. A nossa lente afetiva vai ficando muito mais limitada e isso reduz nossas possibilidades de construir oportunidades de amizade", explica Scardua. Quando pensamos sobre os ambientes que transitamos, o trabalho seria o equivalente da escola, porém, com muito mais competitividade, algo que tem um peso muito grande conforme ficamos mais velhos, por nos definir socialmente.
A vida no trabalho não é uma convivência na qual a gente se permita relaxar, baixar a guarda. Precisamos de abertura e disposição para fazer contato com pessoas que não conhecemos. Há investimento de tempo, energia e afeto na relação. "Nossa vida adulta é muito voltada para compromissos, responsabilidades, então achamos que não vale a pena perder tempo com coisas que não são certas, como conhecer outra pessoa e se permitir. Isso é um investimento sem garantia de retorno", diz a psicóloga.
Amigo é uma rede de suporte do adulto
Apesar das dificuldades de criar e alimentar esse tipo de relação, investir esse tempo e dedicação pode surtir bons resultados inclusive para nossa saúde em alguns casos. "Em hospitais, por exemplo, as pessoas sozinhas demoram muito mais para se recuperar. Por outro lado, quanto mais pessoas te visitam e conversam, mais elas tiram seu foco das doenças. A boa convivência entre amigos nos tira do medo e nos torna mais positivos para a vida", conta a psicóloga Saleth Salles Horta, professora de pós-graduação em Psicologia Clínica com Abordagem Fenomenológica Existencial Gestáltica da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Além disso, a amizade é um espaço da vida em que conseguimos ser nós mesmos de uma forma que não conseguimos ser na família, que tem muita expectativa sobre nós. A amizade é um relacionamento onde não há uma cobrança de perfeição, excelência ou fidelidade absoluta de nenhum dos lados. Não que a amizade não ofereça conflitos, mas como não carrega esse peso do compromisso inviolado, os dramas são enfrentados de uma forma mais suave.
Um outro motivo é que é muito bom você ter suportes sociais, uma rede de apoio para enfrentar as adversidades da vida. Quanto maior minha rede de apoio, mais suporte vou ter. Se sou mãe, por exemplo, e tenho uma amiga que posso confiar, consigo pedir a ela para me ajudar em algo relacionado aos meus filhos. "Ter amigos especialmente na vida adulta, cheia de muitas obrigações e pressão, é muito importante, pois assim eu amplio minha rede de apoio e meu suporte social se torna mais abrangente e efetivo. É um espaço de alívio", conta Scardua.
Como florescer as relações de amizade
Qualquer coisa que você queira inserir na sua vida vai precisar de tempo. Cada pessoa vai saber encontrar a sua medida e, nesse sentido, o segredo é o equilíbrio. Quanto mais equilibrada sua vida for, melhor. Tenha um tempo para sua família, para o trabalho, para sua espiritualidade, para o lazer, para você mesmo, um tempo pra cada coisa. E, se quiser criar ou fortalecer amizades, precisará de tempo na sua agenda para isso.
"Como usar esse tempo vai depender do estilo de vida, do que te conecta com o outro. Se a sua amizade nasceu na prática religiosa e vocês têm uma visão espiritual parecida, o que os conecta? Arrume um tempo para vivenciar essas conexões", diz Scardua. É uma questão de tentar, olhar para a agenda e ver onde você vai encaixar esse momento de construir junto com seus amigos esses espaços de conexão. A maioria das relações, seja de qual tipo for, morrem porque as pessoas não dedicam tempo para elas.
Caso esteja em busca de pessoas novas para ter como amigo, talvez seja hora de frequentar novos lugares, onde haja o contato com pessoas que você não conhece. Vale procurar grupos terapêuticos comunitários, religiosos e espirituais, grupos de faculdade, fazer cursos etc. Saleth traz ainda uma dica: "Pessoas mais velhas deveriam se abrir mais para os jovens. Há um certo preconceito com os mais novos, mas faz muito bem conviver com eles para nos abrirmos contra os preconceitos que criamos em nossa cabeça. Se inserir em grupos sociais que não sejam só o da mesma idade é uma boa forma de se dispor para o novo".
E se você logo pensou que a internet seria uma forma simples e prática de realizar tudo isso, muita calma. Essa ferramenta é muito poderosa e pode, sim, ser um recurso, mas jamais o único. "A conexão ao vivo é é mais profunda e afetiva. Ela se dá pelo olhar, pelo toque, pela presença. É corpo a corpo, ambos desenvolvendo cumplicidade, confiança. Assim, conseguimos vivenciar mais momentos agradáveis juntos que nos impulsionam a alimentar essa relação cada vez mais", ressalta Saleth.
Então, quando estiver com seus amigos, esteja por inteiro. Coloque sua energia e afeto ali. Esteja junto para comemorar, para chorar, para tudo, pois a amizade engloba uma aceitação da vida do outro com o coração aberto. Você pode até não concordar com o seu amigo e criticá-lo, mas esse puxão de orelha não é para desqualificá-lo, é com o intuito de proteger.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.