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Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Estresse e ansiedade: como a preocupação com coronavírus afeta a imunidade

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Imagem: iStock

Diego Garcia

Colaboração para o ViveBem

25/03/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Não existem estudos científicos que comprovem a relação entre a saúde emocional e afetação do sistema imunológico
  • Existe, porém, estudos que comprovam que estresse, ansiedade e depressão têm efeitos negativos para a imunidade
  • Cuidar da saúde mental é fundamental para enfrentar as tensões e desagastes durante a crise da pandemia.

Não existe uma resposta científica que comprove ou reprove como a saúde emocional afeta o sistema imunológico, algo que vem sendo questionado em tempos de pandemia de novo coronavírus e incertezas. Gesmar Rodrigues Silva Segundo, alergologista e imunologista, coordenador do Departamento Científico de Imunodeficiências da Asbai (Associação Brasileira de Alergia e Imunologia), explica que a interrelação entre o sistema imunológico e as emoções é extremamente complexa e apesar de muitos anos de estudos, persistem mais dúvidas do que respostas em relação a como as alterações emocionais interferem com o sistema imunológico, ou mesmo, se alterações do sistema imunológico poderiam ajudar em alterações comportamentais mais importantes.

De acordo com Silva Segundo, não existem estudos que avaliem a relação da saúde emocional e o sistema imunológico. "A maioria dos textos que lemos na internet são baseados em crenças ou interpretações de estudos realizados acerca dos efeitos do estresse crônico na liberação de citocinas (substâncias que mandam mensagens de uma célula para outra, que no sistema imunológico ditam o ritmo de maior ativação ou desativação do funcionamento das suas células)".

Relação entre a saúde emocional e o sistema imunológico

Silva Segundo afirma que essa relação é uma área de grande interesse conhecida por neuropsicoimunoendocrinologia, em que existe uma grande dificuldade na realização de estudos de excelente qualidade e que possam ser reproduzidos, ou seja, que o resultado se repita todas as vezes em que é feito sob as mesmas condições. Nesse sentido, os estudos confiáveis verificaram que numa situação de estresse ocorre o aumento e liberações de hormônios de estresse, inicialmente as catecolaminas e os glicocorticoides, situação que sensivelmente nos prepara para um combate ou enfretamento de algo difícil.

"Com o estresse crônico, essa liberação aumentada e persistente, em especial dos glicocorticoides, pode afetar o crescimento, proliferação, diferenciação e o funcionamento de células do sistema imune, levando a uma menor reatividade do sistema imunológico, que em outros termos quer dizer uma 'imunossupressão', variável de um indivíduo para outro", explica.

Estresse e ansiedade x depressão

Por outro lado, completa o médico, os estudos mostram que na depressão ocorre uma liberação aumentada de substâncias relacionadas com o aumento da atividade inflamatória e portanto, provocando mais reações do sistema imune, podendo favorecer a presença de quadros autoimunes e autoinflamatórios. O mesmo acontece com pessoas consideradas mais estressadas, elas apresentaram um aumento de outras citocinas com potente atividade inflamatória.

Silva Segundo assegura que estresse, ansiedade e depressão andam em conjunto e, considerando a evolução do conhecimento, podemos dizer que os pacientes estão sujeitos a uma regulação inadequada do sistema imune, algumas partes mais funcionantes e outras com menor funcionamento e isso pode sim trazer alguma consequência ao indivíduo.

Importante ressaltar em tempos de pandemia como a que vivemos agora é que não temos nenhum dado que mostre que o estresse emocional esteja associado com maior ou menor risco da doença e ainda, que não existem soros para melhorar a imunidade como temos visto com frequência nas redes sociais Gesmar Rodrigues Silva Segundo, alergologista e imunologista

Ele complementa que o uso de vitaminas, especialmente injetáveis, só tem indicação e algum efeito nos pacientes que apresentam níveis muito baixos de uma ou outra vitamina. Aqueles que se alimentam de forma saudável regularmente e não tem doenças crônicas que atrapalhem a absorção de nutrientes, terão níveis adequados dessas vitaminas.

Não se desesperar é uma escolha

Para Henrique Bottura, médico psiquiatra da Clínica Psiquiatria Paulista e colaborador do Ambulatório de Impulsividade do IPq-HC-FMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), temos várias razões para entrar em pânico pela pandemia: pelos riscos aos quais estamos expostos —seja nós mesmos ou pessoas próximas a nós, amigos ou parentes — além dos riscos econômicos que a situação está gerando. Por isso, cabe a nós sermos racionais e escolher não se desesperar.

Neste momento, nossa atenção deve estar voltada para cuidar da nossa saúde, exposição social e a nossa saúde mental, não se permitindo entrar em pane. "Certamente que não temos um botão para não entrarmos em pânico, mas a gente necessita, principalmente nos momentos de dificuldades, ter controle emocional", analisa Bottura. Quando ele diz "pânico" ele não quer dizer que não temos de ficar tensos, mas sim que não devemos nos desesperar.

Claro que ficamos apreensivos, que teremos medo e que temos que ficar cautelosos. Ter o controle emocional é ter a capacidade interna de olhar para as pessoas próximas a nós que estão a ponto de se descontrolar e entrando em desespero e tentar fazê-las entender que agir assim não vai levar a nada. Essa racionalização você pode fazer com você mesmo quando se der conta que, por um motivo ou outro, está se desesperando.

Uma coisa boa a se fazer nesse período é filtrar bem as informações que recebemos, descartando áudios, vídeos e textos que não sejam de fontes confiáveis. Não é porque escutou um áudio que você precisa sair repassando, qualquer pessoa pode gravar qualquer informação e se passar por qualquer pessoa e isso pode alarmar pessoas mais desavisadas. Outra dica do especialista é não ficar o tempo todo ligado nas notícias e sim escolher um ou dois momentos do dia para se atualizar.

Utilizando a reclusão social a seu favor

Se você está recluso em casa por conta das medidas preventivas do governo para diminuir o contágio do coronavírus, Bottura dá algumas dicas para você cuidar da saúde mental enquanto cuida da saúde do corpo:

- Crie uma rotina: seja para ficar em casa sozinho ou com a família ou mesmo se você for trabalhar de casa, crie uma agenda de compromissos com as atividades que você fará no seu dia, com horários para tudo: acordar, comer, trabalhar, relaxar, meditar e descansar. Se for trabalhar, coloque uma roupa de trabalho, não fique de pijama. Isso te ajuda a adaptar a nova rotina de trabalho e ajuda a te organizar o tempo;

- Movimente-se: é importante incluir nessa rotina exercícios físicos, qualquer um que possa ser feito em casa: abdominais, flexão de braços, agachamentos, etc. Hoje em dia existem vários sites ou aplicativos de celular que ensinam exercícios para serem feitos em casa utilizando apenas o peso corporal;

- Medite: coloque momentos de meditação e silêncio, em que você possa perceber o seu corpo, seu organismo, estar em contato com suas instâncias mais profundas. Caso tenha alguma religião, arrume um tempo para praticar a sua espiritualidade;
Relaxe: para Bottura é fundamental ter um espaço no dia para fazer atividades que distraiam como ler, escutar música, assistir a um filme e até navegar na internet, tenho cuidado claro, com o conteúdo que você acessa e com tempo determinado, não ficar horas e horas navegando na rede.

- Não reclame demais: todo mundo tem dificuldades, problemas, angústias e incômodos. O mundo inteiro está passando por isso e, em maior ou menor grau, todos somos afetados. É uma situação em que não existem culpados. Reclamar é uma atitude que não tem função. Se a gente ficar muito preso em reclamação ou queixa, perdemos a nossa capacidade de encontrar solução para as coisas.