Cães que visitam crianças com câncer no RS fazem até conta de matemática
A visita mais aguardada na Unidade de Oncologia do Hospital Criança Conceição, em Porto Alegre, é a do cão Buzz, um SRD (sem raça definida) de 12 anos, e de seu estagiário Billy, um pequeno fox terrier de apenas 2 anos. Ambos fazem parte do trabalho de pet terapia para o tratamento de crianças com câncer.
A dupla canina, com habilidades artísticas e matemáticas, agora está de quarentena devido à pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2), mas logo, logo voltará às atividades.
O carismático Buzz, que está prestes a se aposentar, foi a companhia nos momentos mais difíceis da vida de Pedro Henrique Dias Borges, 9, que trata um câncer nos ossos. O menino, natural da cidade de Osório, no litoral norte do Rio Grande do Sul, recebeu o diagnóstico da doença em julho de 2016.
''Descobrimos a doença quando Pedro tinha apenas 6 anos. Meu filho foi diagnosticado com um câncer chamado de Histiocitose Maligna", conta Cleusa Maria da Silva Dias, da mãe do garoto. Este câncer se manifesta, principalmente, por meio de lesões ósseas e cutâneas. Geralmente, o tumor se apresenta em crianças do sexo masculino abaixo dos 15 anos.
O menino passou por várias sessões de quimioterapia e chegou a ficar internado por 32 dias. "Foi lá que ele conheceu Buzz, que realizava brincadeiras com as crianças e distraia os pacientes acamados'', contou a mãe de Pedro.
Meu filho melhorava muito cada vez que via o Buzz e os dois interagiam. Pedro ficava muito mais animado quando o cãozinho chegava para visitá-lo.
Cão ajudou Rafael a combater depressão
Outro paciente que teve melhora visível ao participar dos encontros com os pets foi o porto-alegrense Rafael Rocha de Mello, 8. O menino foi diagnosticado há quatro anos com leucemia linfoide aguda (LLA), um câncer que se desenvolve na medula óssea e apresenta sintomas como cansaço, fraqueza, tonturas, falta de ar, febre, além de possíveis infecções.
De acordo com Roseli da Rocha, 50, mãe da criança, durante as primeiras sessões de quimioterapia, na época, Rafael sofreu de depressão.
Ele adorava a companhia do Buzz. Brincava com o cão o tempo todo durante as visitas e ficava alegre. Rafael teve depressão durante um período do tratamento e a pet terapia ajudou muito naqueles momentos em que ele esteve internado no hospital.
Roseli conta à reportagem que a doença voltou a se manifestar em 2018, e Rafael foi novamente internado no Hospital Criança Conceição. Foi nessa ocasião que entrou em cena o ''estagiário'' Billy.
"Rafael chegou a ficar internado 30 dias durante os processos de quimioterapia e radioterapia. As medicações eram muito fortes, e participar da pet terapia foi excelente para ele'', lembra a mãe. O garoto teve a oportunidade de conhecer os dois cães. O vira-latas Buzz, em 2016, e o "estagiário" Billy, dois anos após o diagnóstico inicial da doença.
Os truques de Buzz e Billy
Sob os comandos da criança, Billy se senta, dá a patinha, rola no chão e ainda realiza contas de matemática. Através de uma técnica não revelada pelo adestrador (acreditem, a reportagem insistiu!), o cachorrinho responde, por latidos, simples cálculos como, por exemplo, dois mais três ou quatro mais três.
Billy também pode adivinhar a idade dos pacientes, quando questionado, sempre através de latidos. "Tudo isso ele aprendeu com Buzz, seu amigo mais velho que está se aposentando já", explica Jone Cardoso, tutor dos dois cachorros e adestrador há 32 anos.
O adestrador trabalha como voluntário desde 2016 levando um pouco de alegria e descontração a crianças que lutam contra um câncer. O trabalho de pet terapia que ele toca acontece nos hospitais Conceição, São Lucas da PUC-RS, Clínicas e o Instituto do Câncer Infantil, todos em Porto Alegre, mas devido à pandemia da covid-19, as atividades foram suspensas temporariamente.
Cardoso destaca que a interação das crianças com os cães eleva a autoestima e ajuda a suportar o tratamento. "É lindo vê-las brincando com os cachorros, ver o sorriso no rosto. Não há palavras para descrever e estamos loucos para voltar'', disse.
Cuidados ao entrar nos hospitais
Antes de levar os cachorros para os hospitais, há uma série de protocolos a serem seguidos para não prejudicar a saúde dos pacientes. Além de estarem com a vacinação em dia, os animais são analisados pelo veterinário periodicamente.
No dia da visita, Buzz e Billy ainda tomam um banho antes de começar o trabalho. "O cachorro precisa estar com a saúde perfeita, com tudo em dia, inclusive ter tomado medicamentos para prevenir pulgas, carrapatos, vermes e outros parasitas'', explica Jone Cardoso.
Ao entrar nas dependências hospitalares, os cães são transportados dentro de uma caixa apropriada. Estes caixotes são higienizados com amônia quaternária (CAQs), que tem ação biocida e desinfetante. Já a guia dos cachorros é lavada com água sanitária.
Após brincar com o cão, o paciente higieniza as mãos com álcool em gel. "Essa higienização após o manuseio sempre foi imposta, muito antes da pandemia", ressaltou o adestrador.
Benefícios para o pequeno paciente
De acordo com Daniela Roth Benincasa, oncologista pediátrica do Hospital da Criança Conceição, a pet terapia faz parte de um processo de humanização da saúde. ''É uma terapia, comprovada cientificamente, que desencadeia uma melhora no bem-estar físico e emocional das crianças, aliás, de todos os pacientes'', afirma.
Dentro dos hospitais, geralmente, os pacientes ficam mais estressados ou deprimidos e a terapia com animais diminui a depressão e aumenta a autoestima. Além dos fatores citados, essa interação entre o paciente e o cão reduz a ansiedade e melhora o estado psicológico da criança.
Em outubro de 2019, o governo do Rio Grande do Sul sancionou uma lei que permite o ingresso de animais de estimação em hospitais públicos e privados. Entre as espécies de animais citados no texto estão cães, gatos, pássaros, chinchilas, coelhos, tartarugas e hamsters.
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