Pesquisa analisa saúde mental de pesquisadores durante pandemia
Quais os prejuízos e riscos à saúde mental que a situação de enfrentamento à covid-19 trouxe à comunidade científica e aos funcionários da administração de um centro de pesquisa de grande porte? Como minimizar esse impacto e favorecer a existência de um ambiente de trabalho saudável, mesmo que boa parte das atividades ainda seja executada de forma remota? Essas são algumas das perguntas contempladas por um projeto do Research Centre for Gas Innovation (RCGI), centro de pesquisa sediado na Escola Politécnica da (EP) da USP que conta com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Shell.
A partir do estudo de caso e de ações promovidas visando as mais de 370 pessoas que trabalham no e para o RCGI - entre pesquisadores, gestores e funcionários da administração -, o projeto prevê o desenvolvimento de ferramentas, como guia de boas práticas, treinamento e conscientização sobre os riscos psicossociais trazidos pela pandemia do novo coronavírus, além da produção de uma metodologia para identificá-los e minimizá-los que possa ser replicada em outras instituições acadêmicas e centros de pesquisa científica e tecnológica.
"As condições sociais estão agravadas, porque muitos medos se misturam", afirma a advogada Raíssa Moreira Lima Mendes, doutora em Antropologia, responsável pela metodologia do projeto. "Não apenas dentro do ambiente do trabalho; há os medos sociais, no nível micro e macro, entre eles o estigma do contaminado, o temor de pegar a doença, o de ficar longe da família, entre outros."
O projeto, que se encontra na fase de busca de financiamento, inclui a aplicação de protocolos para a identificação de riscos psicossociais laborais, adaptados ao trabalho acadêmico e à situação da pandemia.
No RCGI, já foram realizados dois workshops em ambiente virtual sobre o tema da saúde mental depois do início da quarentena. O primeiro ocorreu em maio e o segundo, em julho, contou com a participação das pesquisadoras Olívia Pasqualeto, professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e doutora em Direito do Trabalho e da Seguridade Social, e Carolina Spack Kemmelmeier, cuja tese de doutorado trata de violência psicológica e saúde do trabalhador. Um terceiro encontro deverá ser realizado ainda em agosto.
Desde setembro de 2019, Raíssa vinha atuando como voluntária no grupo de Health, Safety and Environment (HSE) — saúde, segurança e ambiente - dentro do RCGI, ao lado da psicóloga Karen Louise Mascarenhas, gestora de recursos humanos do centro, e do pesquisador iraniano Mahdi Tavakkolaghaeim, engenheiro e mestre em HSE. Com o surgimento da pandemia, o grupo voltou as suas atenções de maneira mais concentrada para a saúde mental. Entre algumas questões já identificadas nesse período de home office estão uma sobrecarga maior de trabalho, eventualmente com jornadas ampliadas para mais de 10 horas diárias, e a ausência ou redução de feedback por parte dos pares, fazendo com que os pesquisadores não percebam a valorização do próprio trabalho.
Raíssa Mendes afirmou que, em alguns casos, medidas simples, como o estabelecimento de metas claras pelo gestor e de limites para o trabalho remoto (como, por exemplo, não responder e-mails a partir de um determinado horário), podem fazer uma grande diferença no bem-estar. "Mesmo para a entrega de resultados, é preciso ter uma padronização", afirma. Pelo lado dos pesquisadores que fazem a gestão de projetos, também foram identificadas questões como a ausência de treinamento durante a sua formação acadêmica justamente para serem gestores. Entre os objetivos do projeto está a promoção do diálogo entre os diferentes atores sociais da comunidade científica.
A volta do trabalho presencial, em particular aos mais de 20 laboratórios do RCGI, demanda uma atenção especial, segundo Raíssa. Principalmente porque é provável que, em setembro, seja feito um revezamento de trabalhadores e pesquisadores. "Estamos pedindo para evitar que os pesquisadores fiquem muito tempo sozinhos em ambientes confinados, com produtos inflamáveis ou de risco químico ou físico", diz, acrescentando que, quando isso for necessário, funcionários da administração deverão ser avisados. "É preciso ter esse cuidado, pois identificamos um risco maior em quem trabalha em laboratório."
Os protocolos deverão incluir ainda questões que afetam a saúde mental e não têm necessariamente relação com a pandemia, como assédio moral dentro do ambiente de trabalho. De acordo com Raíssa, esse tipo de violência nem sempre ocorre quando há uma diferença hierárquica e pode ser praticada pelos pares de determinado trabalhador ou pesquisador.
O diretor científico do RCGI, professor Júlio Meneghini, será o pesquisador responsável pelo projeto. Uma das preocupações é impedir a desaceleração do ciclo de desenvolvimento científico do país e minimizar as influências adversas da covid-19, uma vez que a saúde mental é fundamental para que o indivíduo realize suas habilidades, lide com o estresse normal da vida, trabalhe produtivamente e contribua com a comunidade.
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