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Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Tem dificuldades em começar a meditar? Deixe de lado 8 mitos que atrapalham

Frustração por não conseguir meditar pode ocorrer devido a um desses 8 mitos - iStock
Frustração por não conseguir meditar pode ocorrer devido a um desses 8 mitos Imagem: iStock

Heloisa Noronha

Colaboração para o VivaBem

02/09/2020 04h00

A impressão de ser algo difícil, demorado e, pior, algo que funciona apenas para quem é calmo e concentrado costuma desanimar muitos interessados em iniciar a prática de meditação. Abandonar os principais mitos sobre o tema pode levar qualquer um —sim, qualquer um pode meditar! — a desfrutar de seus diversos benefícios para a saúde e o bem-estar.

Entre os benefícios da meditação, está sua ajuda no dia a dia: ela incentiva a pessoa a estabelecer uma rotina, destinando um horário para isso, além de ajudar a funcionar como uma faxina mental que permite desacelerar o pensamento e dar mais voz ao equilíbrio anterior. Também interfere positivamente em aspectos como atenção, criatividade, desempenho do raciocínio, qualidade do sono, mastigação, digestão e bem-estar geral. O fato de a pessoa se dispor a olhar para si já tem grande potencial de ajuda, pois ela passa a perceber comportamentos viciosos e a refletir melhor sobre suas condutas.

Estudos sugerem que a prática pode ajudar em doenças psiquiátricas como ansiedade, depressão e doenças pós-traumáticas, contribuindo no desempenho cognitivo de pacientes com síndromes demenciais ou sujeitos normais e saudáveis com alguma queixa cognitiva. No entanto, é claro, não substitui nenhum tratamento médico. Ela também auxilia no controle emocional, com potencial benefício do sistema cardiovascular, diminuindo riscos de doenças como AVC (acidente vascular cerebral), infarto agudo do miocárdio e hipertensão arterial sistêmica. E, por fim, atua no tratamento de dores crônicas.

É válido ressaltar que, de modo geral, esses estudos têm limitações do ponto de vista metodológico, pois não incluem o uso de placebos nem consideram uma amostra significativamente robusta de pacientes. Porém, embora não tenha um alto nível de evidências científicas dos seus benefícios, é comum que cientistas e neurocientistas não só recomendem a meditação como também a pratiquem. A resposta individual é um fator crucial, mas a técnica não pode ser usada como tratamento único e sim como coadjuvante.

Interessado em começar? Veja 8 mitos para tirar da frente antes:

1. Preciso deixar minha mente em branco

Mito. Essa crença vem do senso comum de acreditar que meditar é deixar a mente "em branco" ou mantê-la extremamente focada ou concentrada. Na verdade, essas ideias vão contra a natureza da mente, por isso muitas pessoas associam a prática a um esforço desnecessário que muitas vezes as levam a desistir. A expectativa é muito alta, quando, na verdade, o grande segredo é se sentar, fechar os olhos e se entregar ao processo.

2. Meditação exige o controle total dos pensamentos

De forma alguma. Trata-se de outra ideia que atingiu o Ocidente de modo distorcido. Meditação implica em observar o fluxo natural dos pensamentos sem se deixar envolver com ele —por exemplo, não parar o relaxamento ao se lembrar de um boleto não pago. Não é preciso combater ou tentar controlar os pensamentos, pois isso só faz com que eles se intensifiquem. A proposta é se dissociar deles e perceber que o que eles dizem são apenas criações da mente, mas não correspondem necessariamente à realidade das coisas ou a quem somos. Se houver dificuldade nesse sentido, uma meditação dirigida ou guiada pode ser benéfica.

3. É obrigatório se sentar na posição de lótus

Não, mesmo porque essa posição não é nem um pouco familiar para nós, ocidentais. É claro que quem pratica ioga e tem as juntas mais "soltas" tem maior facilidade para se posicionar assim, mas ela não é uma regra. O ideal é que o corpo esteja alinhado —pés e quadris bem apoiados e coluna ereta —, pois assim a atenção é maior. Qualquer cadeira ou poltrona pode ajudar, desde que a pessoa se sinta confortável, pois qualquer incômodo pode dificultar o processo de relaxamento.

4. Para meditar é preciso silêncio

Não necessariamente. Para os iniciantes, um cantinho apropriado em algum cômodo da casa livre de interferências e interrupções, como brincadeiras de crianças ou ruídos domésticos, ajuda bastante. A partir do momento em que o hábito é criado, você vai percebendo que os barulhos são irrelevantes —até mesmo com uma obra próxima é possível relaxar. Na meditação do tipo mindfulness, inclusive, aprender a não deixar que os sons atrapalhem a concentração faz parte do processo de se conectar consigo mesmo e com o momento presente.

5. Meditação sempre tem um viés religioso

Claro que não. Algumas, de fato, seguem os preceitos budistas ou tibetanos, mas a maioria é laica. Existem versões em que notar o que momento presente é fundamental, práticas de concentração, de compaixão, em movimento, com uso de mantras, com jamapalas (cordões de contas usados pelo hinduísmo e pelos praticantes de ioga), meditações guiadas, etc. Boa parte das meditações é universalmente acessível e podem ser feitas por qualquer pessoa, sem interferir nas crenças religiosas de cada um.

6. É preciso meditar horas a fio para obter algum resultado

Mito. A frequência é mais importante do que a intensidade da prática. Os especialistas recomendam cerca de 20 minutos diários, por oito semanas, para que haja o processo de neuroplasticidade do cérebro e ele seja capaz de estabelecer novas conexões.

7. A pessoa precisa ter um estilo de vida "zen" para começar a meditar

Não, a meditação é para todo mundo. Quem tem um temperamento mais agitado e inquieto provavelmente terá um pouco de dificuldade para incorporar o novo hábito e se concentrar, mas isso não significa que não será bem-sucedido —aliás, são justamente as pessoas com esse perfil que alcançam os maiores benefícios com a prática continuada. Algumas linhas, inclusive, permitem que a meditação seja realizada caminhando ou durante a realização de alguma atividade doméstica. Basta ter alguma disciplina para adotar alguns minutos na rotina diária.

8. A prática exige horário e local certos para meditar

Embora muitos especialistas defendam que a meditação seja feita de manhã, logo ao acordar, para que seus efeitos sejam desfrutados nas horas seguintes, o local e o período do dia ideais são aqueles que cabem na rotina. O importante é que a prática aconteça sempre no mesmo horário, para criar um hábito e funcionar como um compromisso. Deixar para fazer na hora que for possível é o tipo de atitude que nunca dá certo, conduzindo à desistência. Dica: apenas comece e, depois, vá ajustando.

Fontes: Fernando Gomes, médico neurocirurgião, neurocientista e professor livre docente de Neurocirurgia do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo); Juliana Brescovici Carvalhaes, instrutora e fundadora do INM (Instituto Nacional de Meditação); Marcel Simis, diretor da Apan (Associação Paulista de Neurologia); Víviam Vargas de Barros, psicóloga e sócia-fundadora do Centro de Promoção de Mindfulness, em São Paulo (SP) e Wimer Bottura, psiquiatra, psicoterapeuta e presidente da ABMP (Associação Brasileira de Medicina Psicossomática).