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Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


Amígdalas protegem organismo de infecções e retirada deve ser criteriosa

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Imagem: iStock

Marcelo Testoni

Colaboração para VivaBem

28/09/2020 04h00

Alguns estudos internacionais sugerem que retirar as amígdalas pode intensificar o risco de doenças respiratórias, mas não há consenso entre os médicos. De acordo com uma pesquisa publicada em 2018 na revista científica Jama Otolaryngology - Head & Neck Surgery, o risco para pneumonia, gripe, asma e bronquite, por exemplo, pode triplicar.

Para chegar a essa conclusão, pesquisadores das universidades de Melbourne, Yale e Copenhague analisaram os dados de 1,18 milhão de dinamarqueses. O resultado foi que os que retiraram amígdalas e também adenoides (estruturas situadas atrás das cavidades nasais), aproximadamente 60 mil pessoas, sofreram quase três vezes mais com doenças respiratórias.

"A cada cinco pessoas que passam pela cirurgia, uma terá uma doença respiratória", registrou Jacobus Boomsma, um dos responsáveis pelo estudo e pesquisador da Universidade de Copenhague, na Dinamarca.

Já outro trabalho acadêmico recente, realizado na Inglaterra e publicado no The British Journal of General Practice, constatou que sete de cada oito extrações de amígdalas em crianças raramente trariam algum benefício, podendo causar mais danos.

"Até 4% das crianças operadas [para remoção das amígdalas] podem ter que ser internadas de novo devido a complicações secundárias, o que significa que a tomada de decisão adequada para realizar essa cirurgia é de suma importância", informou Tom Marshall, professor do Instituto de Pesquisa em Saúde Aplicada da Universidade de Birmingham, na Inglaterra.

No Brasil, cirurgia é defendida

À época da divulgação do estudo com dinamarqueses, a ABORL-CCF (Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial) se posicionou de forma contrária, questionando, por exemplo, a falta de uma coleta de exames laboratoriais que demonstrassem a causa das patologias e sua relação com as cirurgias avaliadas, e defendeu os aspectos positivos do procedimento para remover as amígdalas (amidalectomia), observados em estudos nacionais.

Para Renata Furlan, otorrinolaringologista do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) e especialista pela ABORL-CCF, não há evidências científicas robustas que comprovem a relação da remoção das amígdalas com risco de doenças.

"Os resultados são preliminares, pois o estudo que citou uma possível relação da cirurgia com futuros eventos respiratórios, infecciosos e alérgicos teve muitas limitações na maneira como foi feito e não foram analisados outros fatores que poderiam ter interferido no resultado", explica, acrescentando: "Sempre avaliamos riscos e custo-benefício antes de indicar uma cirurgia. Confio plenamente que uma criança com indicação cirúrgica tem muitos ganhos".

Quando é indicado retirar as amígdalas?

Amígdalas - iStock - iStock
Amígdalas inflamadas
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Embora não sejam órgãos vitais, as amígdalas desempenham uma função importante no sistema imunológico: produzem anticorpos e acionam os linfócitos, células defensoras do organismo contra vírus, bactérias e outros agentes nocivos que entram pelo nariz e a boca.

Sendo tão importantes na linha de defesa, precisam se enquadrar em critérios clínicos bem específicos para serem extraídas. Renata Lopes Mori, otorrinolaringologista do Hospital Santa Marcelina (SP) e também especialista pela ABORL-CCF aponta algumas situações.

"A indicação cirúrgica é muito criteriosa. O paciente precisa ter mais de sete infecções em um ano ou cinco anualmente e durante dois anos consecutivos ou três por três anos consecutivos", informa.

Adultos também podem ter que operar devido a apneia do sono, infecções repetitivas, quando restos de alimentos se depositam nas criptas, ou sulcos, das amídalas, gerando mau hálito (halitose), se forem diagnosticados abcessos e tumores ou em caso de febre reumática.

Vantagens x desvantagens

Para Fabiano Haddad Brandão, otorrinolaringologista do Hospital Paulista, os benefícios da amigdalectomia incluem diminuição expressiva das infecções (amigdalites), melhora da halitose (caso as amídalas sejam a causa), da qualidade do sono e, consequentemente, da de vida. No entanto, para o médico, embora o procedimento seja seguro e de baixa comorbidade, pode favorecer um aumento leve no número de faringites, mas com sintomas mais brandos.

"O risco é maior em adultos, pois são mais propensos a serem acometidos por faringite, pelo fato de apresentarem com maior frequência fatores locais de irritação na faringe, como sinusite e obstrução nasal crônicas e refluxo faríngeo-laringe", explica.

No estudo com pacientes dinamarqueses também foi apontado que a extração das amígdalas na infância pode ter consequências no longo prazo, como o já citado aumento do risco de doenças respiratórias, além da possibilidade de piora de quadros como apneia do sono, sinusite crônica e otite.

Algo totalmente divergente para os médicos entrevistados. "Em alguns casos, observamos até uma melhora acentuada nesses tipos de afecções", confirma Cícero Matsuyama, otorrinolaringologista e coordenador da residência médica do Hospital Cema (SP).

Existe idade certa para operar?

A amigdalectomia não costuma ser realizada em bebês e crianças menores de 4 anos, pois nessa fase o sistema imunológico está em processo de amadurecimento. "Antes dessa idade, somente as amígdalas produzem um tipo de imunoglobulina que faz a proteção das vias aéreas superiores. Após os 3 anos, as glândulas salivares começam a produzir estas mesmas defesas naturais do organismo", esclarece Brandão.

Porém, cabe ao médico avaliar a necessidade da cirurgia, que pode ser feita junto com a retirada das adenoides, que desempenham papel similar e estão localizadas próximo. Tudo depende do estado clínico do paciente, diz a médica Renata Furlan, que afirma já ter operado crianças com menos de 2 anos por apresentarem, por exemplo, quadros respiratórios obstrutivos severos que prejudicavam sono, alimentação, comportamento e disposição.

Tratamentos menos invasivos

Em se tratando de infecções repetitivas, anti-inflamatórios, antibióticos e analgésicos podem ser administrados como tentativa de tratar ou postergar a indicação cirúrgica. Para ronco e apneia também é possível testar aparelhos conhecidos pela sigla CPAP, que fornecem um fluxo contínuo de oxigênio para o paciente enquanto ele dorme, evitando assim que suas vias respiratórias fiquem obstruídas.

Entretanto, a cirurgia costuma oferecer uma resolução mais rápida e definitiva para esses distúrbios respiratórios.

"Nós só indicamos a cirurgia quando tentamos todos os tratamentos menos invasivos e as amígdalas estão disfuncionais, causando mais doença do que proteção. A cirurgia é segura, realizada com anestesia geral, em centro cirúrgico hospitalar, sem cortes externos, sendo realizada dentro da boca. Dura cerca de 1 hora e geralmente a alta é dada no mesmo dia. Quando bem indicada, vemos rápida melhora, o ronco desaparece logo nos primeiros dias e as infecções e uso de antibióticos são reduzidos drasticamente", diz a médica Renata Lopes Mori.