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Bebê de Pernambuco com doença rara ganha tratamento com remédio de R$ 12 mi

Julia Ellis Clarindo Feitosa ganhou o remédio mais caro do mundo - Arquivo pessoal
Julia Ellis Clarindo Feitosa ganhou o remédio mais caro do mundo Imagem: Arquivo pessoal

Ed Rodrigues

Colaboração para o UOL, no Recife

06/10/2020 08h37

A bebê Julia Ellis Clarindo Feitosa, de 1 anos e 2 meses, foi escolhida para receber o tratamento com o remédio mais caro do mundo, o Zolgensma, que custa em torno de R$ 12 milhões e é usado no tratamento da Atrofia Muscular Espinhal (AME). Ela deve receber a dose única do medicamento ainda nesta semana, no Recife.

Para a família, as preces de uma vida normal para Julinha, como ela é chamada, começam a se tornar realidade. "Ela faz uso de uma medicação e tem evoluído bem. Mas a gente tava querendo muito esse medicamento, porque a eficácia dele é essencial", comemorou a mãe da garotinha, Juliene Santos, de 27 anos.

O diagnóstico de AME, uma doença rara que enfraquece a musculatura do corpo, foi dado quando Julinha tinha apenas um mês de vida. "O que a gente sonha com esse remédio é que ela não tenha tanta dependência de aparelhos, de tanta fisioterapia. Que não precise de tantos cuidados quanto ela precisa hoje para ficar estável", disse a mãe.

"Meu maior sonho é ver Julinha fazer coisas simples. Levar ela a um parque e ver ela brincando, correndo e sorrindo", completou o pai de Julia, André Clarindo, de 34 anos.

Remédio é novo no Brasil

A família de Julinha é de Águas Belas, cidade a cerca de 300 km do Recife. Ela conseguiu ganhar o medicamento porque é atendida no Hospital Maria Lucinda, na capital pernambucana. A unidade de saúde participa de programas de entidades científicas e faz a ponte entre seus pacientes e essas instituições. Foi esse acompanhamento que colocou Julia na rota do programa que oferta a dose do Zolgensma.

Em agosto deste ano, a Anvisa autorizou o registro do remédio milionário. Em cumprimento às exigências da agência, a Novartis Biociências S.A, empresa produtora do medicamento no país, se comprometeu a enviar análises que comprovem a eficácia em pacientes brasileiros. No Brasil, o Zolgensma está autorizado para tratamento da AME tipo 1, que é considerada a manifestação mais grave da doença. A autorização, no entanto, contempla apenas crianças até dois anos de idade.

Questionada sobre o valor milionário do medicamento, a Novartis disse apenas que é um custo que reflete décadas de pesquisas científicas, investimentos em cadeia logística e manufatura em larga escala. "Bem como custos diretos e indiretos com capacitação de centros de referência, hospitais e profissionais de saúde", ressaltou.

O que é a AME

"A amiotrofia espinhal é uma doença genética onde há uma mutação em um gene (SMN1) que produz uma proteína necessária para a sobrevivência dos neurônios motores. Até o momento não poderíamos falar em cura da doença visto que não existiam meios ou medicamentos que substituíssem a função dessa proteína ou conseguissem reverter o dano já ocorrido em neurônios. Com o advento da terapia gênica começamos a falar sobre a possibilidade, mas o acompanhamento das crianças tratadas e realização de estudos adicionais são necessários", explica a neurologista e especialista em doenças neuromusculares Renata Andrade.

A doença provoca a perda da inervação motora dos músculos, resultando em fraqueza muscular generalizada, incluindo da musculatura necessária para a respiração. "De acordo com o perfil genético, o paciente pode apresentar formas clínicas de gravidade variável, desde crianças que não conseguem sentar ou andar até indivíduos que apresentam início de sintomas na vida adulta. Mas cerca de 75% dos pacientes necessitam de suporte ventilatório permanente", continua a especialista.

Segundo Renata Andrade, o tratamento com Zolgensma oferece a substituição do gene alterado (gene da sobrevivência neuronal), o que desencadeia uma produção adequada da proteína. "Se administrado precocemente, pode impedir a morte neuronal com benefícios relacionados à função motora, respiratória e sobrevivência desses indivíduos", disse. O efeito, ressaltou a neurologista, é observado a curto prazo e a medicação deve ser administrada o quanto antes para que se possa evitar a morte neuronal.