Ego é ruim? Entenda como ele age nas relações e quando se torna um problema
Resumo da notícia
- O ego é uma defesa natural: buscamos sempre proteger a nossa imagem, pensamentos e personalidade
- Quando sentimos que somos ameaçados ou rejeitados, há a tendência a nos tornarmos egoístas
- Redes sociais intensificam imagem que temos de nós mesmos, e servem de termômetro para o nosso ego
- O ególatra não só sofre, mas também afeta quem o cerca, pois a identificação excessiva com o próprio eu pode comprometer a capacidade de se relacionar
"Você está com o ego inflado", "não deixe seu ego dominá-lo", "deixe o ego ferido de lado e vá resolver". Você já deve ter ouvido alguma dessas frases. O ponto em comum entre elas é o ego estar sempre atrelado ao orgulho, mas será que isso faz sentido? Se sim, é tão ruim assim pensar mais em si mesmo do que nos outros, em algumas situações?
Por mais que sejam saudáveis e recomendadas as práticas que ajudam a manter em dia a autoestima e confiança (praticar exercícios físicos, viajar sozinho/a, ir a uma palestra), o excesso de autoafirmação pode fazer a pessoa se perder pelo caminho, prejudicando as suas relações.
Acreditar que é preciso sempre vencer algo ou alguém para se sentir bem, por exemplo, é deixar o ego falar mais alto do que a realidade. Para a psicanálise, certo egoísmo até faz parte de cada um, mas quando a pessoa se volta apenas para si mesma, por insegurança ou fragilidade, travestidas em autoritarismo, torna-se uma questão coletiva.
O orgulhoso não gira de acordo com o moinho justo de dar e receber. "Ele sofre e faz sofrer. Normalmente, alguém assim se acha merecedor de tudo, gosta de honrarias e leva tudo para o pessoal. Isso é cansativo para quem está ao redor. É um egoísmo que deriva da necessidade de controlar tudo e todos", afirma Simone Demolinari, psicoterapeuta e professora de gestão de pessoas.
Querer realizar os próprios desejos não é ruim, de acordo Filipe Campello, escritor e filósofo atuante na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). "Por exemplo, quando as pessoas entendem que o que desejam para as suas vidas compreende ter filhos, é um sentimento que também as faz bem". Para o filósofo, o problema é quando o egoísmo significa intolerância com quem é ou pensa diferente: "Esse bloqueio total de sensibilidade diante de sofrimento ou morte pode assumir traços patológicos."
Aparentemente, controlar um ego que é alimentado a todo momento traz vantagens. Mas, segundo Demolinari, "se não o controlamos, viramos marionetes dele", diz. A psicoterapeuta afirma que, para equilibrá-lo, é preciso maturidade emocional, mas também lembrar do clichê de que não existe perfeição.
Ego e autoestima
O ego é compreendido como a imagem e a valorização que se confere a si mesmo: "Ele seria a nossa parte vaidosa, que não aceita se frustrar e se ofende facilmente", diz Demolinari.
O termo veio a público por Sigmund Freud, criador da psicanálise, em 1923. Para o médico, a nossa psique é constituída por três componentes: "id", superego e ego. O primeiro seria uma subpersonalidade com impulsos múltiplos da lidido, sempre dirigido ao prazer. O segundo, a consciência moral, os princípios sociais. O último, no caso o ego, seria um "protetor da personalidade". Ele impede que o inconsciente assuma o lado consciente —explicação para sermos capazes de manter a civilidade mesmo em uma roda de conversa com alguém que nos despreza e deixa isso claro, por mais que o nosso ego seja afetado.
Naturalmente, além de ninguém gostar de rejeição, temos a tendência a defender o que somos e desejamos. Nessa parte, o ego também é o responsável. "A construção de um ego traz o alívio de ter um corpo, por isso o indivíduo pode estar sempre ocupado com sua própria imagem", diz Vivian Ligeiro, doutora em psicanálise pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).
Essa autoimagem é construída por estímulos dos pais, professores e colegas desde a infância, e gera profundos impactos no ego daquele futuro adulto, segundo Demolinari. "Se não me sinto amada, posso me mostrar egoísta e autoritária, quase como compensação pelo desamor e mágoa. Tudo depende de como vou elaborar, metabolizar e devolver", diz a psicoterapeuta. O olhar do outro vai ter sempre importância, e é por isso que há adaptações dos nossos verdadeiros desejos a padrões que já existem.
Para Demolinari, a autoestima, geralmente muito ligada ao que se entende por ego, é o juízo de valor que a pessoa se dá, se colocado em prática, e não com o que se vê no espelho —isso seria "vaidade". Ela exemplifica: "Se me considero inteligente, mas sou insegura e não expresso a minha opinião quando posso, minha autoestima não será tão positiva. Ela oscila com situações e tem a ver com as nossas conquistas."
Buscando a perfeição nas redes sociais
Se personalidades são mostradas a todo momento (na maneira de falar, de se vestir, pensar, andar), as predileções de cada um também são refletidas e alimentadas por meio das redes sociais, que trazem uma aparente sensação de mais liberdade. Entretanto, para Leonardo Nascimento, doutor em sociologia pelo Iesp (Instituto de Estudos Sociais e Políticos) da UERJ, não há necessariamente espontaneidade nessa maneira de se expressar. "São plataformas capitalistas que estão sempre gerenciando o que é ou não permitido postar".
Os usuários que se encaixam na dinâmica mostram, acima do resto, o quão valioso é estar de bem com o próprio ego: "Comentários virtuais são pensados, geralmente, a partir do efeito que aquilo vai gerar, porque a meta é não só atingir, mas também ser visto por um grupo do qual você faz (ou quer fazer) parte", diz Nascimento.
São nas redes onde tenta-se criar uma imagem ideal e intacta de si mesmo com mais intensidade. Para o ego, é a garantia de que se é visto e pertencente a algo. "Sem falhas e faltas, [a autoimagem] é pautada exclusivamente no que pensamos que o outro quer ler ou ver de nós", diz Ligeiro.
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