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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Nem sempre estamos certos; saber ouvir é essencial e ajuda a evoluir

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Bruna Alves

Do VivaBem, em São Paulo

15/12/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Saber ouvir é importante para o nosso próprio aprendizado e evolução
  • Algumas pessoas já iniciam uma conversa "armadas", só esperando a oportunidade de rebater
  • Admitir que nem sempre estamos certos é o pontapé inicial para ouvir melhor aquilo que não concordamos

"Você precisa melhorar na entrega de resultados, está deixando muito a desejar", "Meu time está mais bem preparado que o seu para vencer esse campeonato", "Eu não acho justo as escolas permanecerem fechadas, se os bares e restaurantes seguem abertos durante a pandemia". Certamente você já ouviu alguém dizer algo com que você não concorda. Mas qual foi sua reação inicial? Tentou ao menos analisar o outro ponto de vista ou simplesmente esbravejou ser o dono da razão?

A maneira como se analisa a opinião alheia reflete diretamente o nível de conhecimento e humildade. Inicialmente, a consciência funciona a partir da percepção e das informações que o mundo envia. Isso pode ser através de qualquer um dos sentidos, e ouvir é um deles. "Se eu sou incompetente na habilidade do ouvir, tenho uma limitação naquilo que eu vou perceber do mundo externo", diz Henrique Bottura, psiquiatra diretor clínico do Instituto de Psiquiatria Paulista e colaborador do ambulatório de impulsividade do Hospital das Clínicas de São Paulo.

O especialista explica que a dificuldade de ouvir e avaliar o que se discorda faz com que a pessoa fique desalinhada com o mundo externo. Há pessoas que batem o martelo que estão certas e ai de quem disser o contrário. Algumas, inclusive, quando estão ouvindo algo com que não concordam, deixam de prestar atenção na conversa e já começam a preparar a resposta, ou seja, não ouviram atentamente, mas já querem rebater.

Admita, ninguém sabe de tudo

Alunos em sala de aula - iStock - iStock
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A primeira dica para prestar atenção naquilo com que não se concorda é se interessar pelo assunto que está sendo abordado. "Temos que partir de um princípio de que a gente pode estar equivocado e que alguém está tentando trazer uma luz para algo que não estamos enxergando", salienta Bottura.

Questione por que essa pessoa está dizendo isso. Qual é o fundamento, há alguma lógica? Como ela construiu esse raciocínio? Partindo dessas premissas fica mais fácil conseguir ouvir "desarmado".

"Para a gente conseguir ouvir o outro necessariamente teremos que reconhecer que as nossas ideias não são tão coerentes como gostaríamos", ressalta Lucas Avelar Rodrigues, psicólogo e doutorando em estudos psicanalíticos pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

Os próprios pensamentos predeterminados todos sabem quais são, mas como ampliar o horizonte sem ouvir o novo e o diferente? As pessoas que evoluem sempre são capazes de ouvir o que o outro tem a dizer, mesmo que não gostem.

René Descartes (1596-1650), importante filósofo e matemático francês, escreveu em "O Discurso do Método" que o bom senso é a coisa mais abundante que existe no mundo, porque não há ninguém que ache que lhe falte bom senso. Em outras palavras: todos enxergam os problemas, mas ninguém admite ser o responsável por eles. É o mesmo que não saber ouvir por achar que sabe de tudo. Portanto, atenha-se aos fatos, não somente a narrativas.

Normalmente, partimos do princípio de que estamos certos e que os outros estão sempre errados. Pensando assim, por que ouvir o que os outros têm a dizer? "A gente está aqui para aprender. E podemos aprender, inclusive, com aqueles que estamos em desacordo frontal. E mais, eu tenho que respeitar e conviver com essa visão de mundo antagônica com a minha", afirma Bottura.

Em alguns momentos da história acreditou-se que a terra era plana e o centro do Universo. Evoluímos. A ciência evoluiu. Então, por que não experimentar ser humilde e ouvir mais? Ninguém sabe de tudo. Esse é um autoconhecimento básico. E quando admitimos isso damos margem ao aprendizado.

Saber ouvir traz muitas vantagens

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As pessoas que conseguem ouvir mais são capazes de se manterem abertas, conseguem entrar na linha de argumentação alheia, toleram com mais facilidade os incômodos e, posteriormente, produzem uma boa reflexão.

"Dar-se a oportunidade de escutar o próximo, compreender opiniões e sentimentos diferentes vai fazer com que a população construa coisas melhores, e não simplesmente imponham uma opinião, que é o que mais vemos hoje", avalia Yuri Busin, psicólogo, mestre e doutor em neurociência do comportamento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e diretor do Casme (Centro de Atenção à Saúde Mental - Equilíbrio).