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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


"Pai de pet": faz mal à saúde mental tratar animal de estimação como filho?

Getty Images
Imagem: Getty Images

Marcelo Testoni

Colaboração para o VivaBem

10/03/2021 04h00

Quem ama e cuida bem de animais de estimação procura garantir o melhor para eles, que são para muita gente parte da própria família. Entretanto, não é saudável e indicado tratar um cão ou gato como se fossem humanos ou esperar que se comportem como crianças pequenas, pois além de prejudicá-los —afinal são seres pertencentes a outras espécies e possuem instintos e comportamentos próprios —, isso pode fazer mal aos tutores.

"Embora possam ir atrás, brincar e esperar por nós, o que é positivo, pets têm limitações e a chance de não corresponderem às expectativas de alguém que procura por algo que não possam oferecer é grande. É preciso lembrar que animal é animal, não age, não fala e não substitui a atenção dada por um humano", ressalta Gabriela Luxo, psicóloga, psicopedagoga, doutora em distúrbios do desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

As explicações para um animal doméstico deixar de ser percebido como mascote e ser tratado como gente são diversas e algumas podem não significar nada preocupante. Porém, outras podem exigir uma atenção maior. Vale tranquilizar que naturalmente o ser humano se afeiçoa a criaturas de sangue quente, porque geralmente elas também se apegam rapidamente a nós, oferecendo o que muitos não encontram, como afeto, companhia, reciprocidade, lealdade.

Esse contato também nos remete a um amor que existe entre pais e filhos. "Os sentimentos humanos então são projetados nesse animal e muitos que, por essência, são mais cuidadores ou protetores podem 'transformá-lo' num filho de faz de conta, como na infância. Nesse sentido não há problema, só é preciso tomar cuidado com o esperar algo de volta, as carências excessivas e a ideia concreta de que é um filho real", explica Deborah Moss, neuropsicóloga e mestre em psicologia do desenvolvimento humano pela USP (Universidade de São Paulo).

Sabe-se que a simples presença de um bichinho por perto é o bastante para melhorar o astral e diminuir a ansiedade e o estresse, enquanto o amor incondicional e sincero que transmitem reflete em esperança e sensação de vínculo e segurança, ajudando pessoas hospitalizadas ou em recuperação de depressão. Como necessitam de movimento, cães e gatos indiretamente ainda motivam seus donos a fazerem o mesmo e se exercitar com eles.

Cão e gatos - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Sentimentos bons agregam à saúde do ser humano, mas é importante que se olhe em volta e direcione essa mesma dedicação também às demais fontes que fazem parte de nossa vida e que merecem cuidados. Quando isso não ocorre e o foco só é o animal, pode ser que a pessoa inconscientemente queira satisfazer um forte desejo, como o de ter filhos, ou se relacionar e abrir emoções, mas não pode ou tem muita dificuldade para interagir e aceitar críticas.

Além disso, do ponto de vista médico, para uma relação entre humanos e pets ser considerada sadia, é preciso que algumas regrinhas de convivência sejam estabelecidas, como os animais terem seu próprio espaço e serem livres para estimular seus instintos, com brincadeiras. As regras inclusive contribuem para o desenvolvimento das crianças. "Elas aprendem desde cedo a respeitar e a conviver com outras espécies e a ter responsabilidades", aponta Nelson Douglas Ejzenbaum, pediatra e neonatologista da Academia Americana de Pediatria.

Quanto a dormir junto, está liberado desde que a vacinação e a higiene do pet estejam em ordem e o dono não tenha problemas respiratórios, distúrbios do sono e criado uma relação de dependência para pegar no sono. Essa última situação pode ocorrer quando o dono não se sente confortável e protegido sozinho ou por culpa de ter passado o dia longe de casa.

Reconheça um acumulador

Um aspecto que se torna perigoso em relação à forma como os donos lidam com seus animais é o de adotar vários deles. Em busca de suprir desejos e carências emocionais, há quem também acabe nutrindo uma necessidade compulsiva de acumular muitos animais dentro de casa e isso pode ocorrer mais facilmente se o indivíduo se reconhecer neles pela vulnerabilidade ou pelo sofrimento. A impulsividade então leva a uma situação bem diferente da de ONGs e abrigos, não sendo raro acumuladores não terem estrutura, apoio ou condições financeiras e psicológicas para ajudar.

"Quando ouvimos dizer que o que vale são as boas intenções, temos que pensar que na verdade nem sempre é assim. Algumas pessoas perdem o controle e de protetores acabam se tornando opressores. É um transtorno grave, pois não se enxerga a incapacidade e o impacto negativo que a situação causa a si e aos animais", esclarece Carla Guth, psicóloga especialista em família e construcionismo pela PUCSP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

Ainda de acordo com ela, acumuladores de animais não são más pessoas, mas agem assim também pela probabilidade de terem sido afetados por grandes traumas, como perdas de entes queridos, separações, violências. Podem apresentar ainda quadros como depressão, esquizofrenia, transtornos de personalidade, paranoia, delírio, demências e emocionalmente serem "desligados" para o que fazem, a ponto de não notarem a dor de animais sob sua tutela.