Casos de tuberculose caem no Brasil; pandemia pode ter reduzido diagnóstico
A tuberculose continua sendo um importante problema de saúde pública mundial. De acordo com dados do novo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, divulgados nesta quarta-feira (24), o Brasil teve uma redução de 9,5% no número de novos casos da doença, mas isso pode ser mais uma consequência da pandemia do coronavírus, que teria impactado a quantidade de diagnósticos feitos no ano passado.
O Brasil teve 66.819 casos novos de tuberculose em 2020 —com um coeficiente de incidência de 31,6 casos por 100 mil habitantes. Em 2019, foram diagnosticados 73.864 casos novos de TB —35 casos por 100 mil habitantes. Os estados com maior incidência de tuberculose, no ano passado, foram Amazonas (64,8 por 100 mil habitantes), Rio de Janeiro (60 casos por 100 mil habitantes) e Acre (52,9 por 100 mil habitantes).
A VivaBem, Arnaldo Medeiros, secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, explica que a pandemia causou alterações importantes nos indicadores epidemiológicos e operacionais. "Houve redução no total de notificações de TB nos três níveis de atenção, com queda mais pronunciada na atenção terciária, e redução no consumo de cartuchos da rede de teste rápido molecular para tuberculose, em comparação com o ano de 2019, o que pode indicar diminuição no diagnóstico da doença."
Embora tenha sido observada uma constante tendência de queda entre os anos de 2011 e 2016, o coeficiente de incidência de TB no país aumentou entre os anos de 2017 e 2019. Mas em 2020, observou-se uma queda acentuada da incidência em comparação com o ano anterior. "De maneira geral, identificamos uma piora de indicadores tais como aumento do abandono e queda das notificações", diz Medeiros.
Entretanto, ele explica que ainda não se sabe como a pandemia pode ter influenciado na gravidade da doença, ou se a alteração desses indicadores seria o reflexo de aspectos operacionais, como sobrecarga dos sistemas de saúde, com impacto, sobretudo, na qualidade dos dados.
Número de mortes ficou estável
Ainda segundo dados do novo boletim, em 2019 (ano de referência), foram notificados cerca de 4.500 óbitos pela doença —com um coeficiente de mortalidade de 2,2 óbitos por 100 mil habitantes. Em 2018, foram registradas 4.490 mortes em decorrência da doença —2,2 óbitos/100 mil habitantes, igual a 2019. Isso mostra um aumento discreto de 0,22%.
Desde 2010, o número de óbitos por TB no Brasil varia de 4.400 a 4.600, e o coeficiente de mortalidade, de 2,2 a 2,3 óbitos por 100 mil habitantes na série histórica.
No mundo em 2019, estima-se que 1,2 milhão morreu devido à doença. Em relação ao Brasil, o país continua entre os 30 países de alta carga e para coinfecção TB-HIV, sendo, portanto, considerado prioritário para o controle da doença no mundo pela OMS (Organização Mundial de Saúde).
O secretário também comentou sobre os desafios da doença no país e o tratamento via SUS (Sistema Único de Saúde). Confira abaixo:
Por que o Brasil é ainda um país com alta carga endêmica da tuberculose? Como diminuir os casos?
A classificação de países de alta carga para tuberculose da OMS considera dois fatores: incidência da doença e número de casos da doença no país. O Brasil entra na lista de alta carga da organização devido ao número de casos novos notificados em um ano.
Diversos estudos mostram que a melhor estratégia para reduzir a incidência e a mortalidade por tuberculose é diagnosticar e tratar, simultaneamente, os casos de doença ativa e de infecção latente. Assim, devemos intensificar as ações para identificação precoce, diagnóstico e tratamento oportuno da TB, além de fortalecer as ações voltadas à infecção latente (diagnóstico, tratamento e vigilância) nos territórios.
Além disso, a TB está intimamente ligada à pobreza e às condições insalubres de moradia, mostrando a importância fundamental das estratégias de proteção social e do envolvimento de diferentes setores do poder público para a eliminação da doença.
Quais são os principais desafios de controle da tuberculose no país?
A tuberculose é uma doença de forte determinação social. A pobreza, aspectos socioambientais e condições socioeconômicas adversas são fatores que podem contribuir para a ocorrência de doenças, entre eles a tuberculose. Alguns fatores apresentam barreiras importantes de acesso aos serviços de saúde, assim como na adesão ao tratamento.
O acesso a programas sociais do governo federal, assim como iniciativas locais (municipais ou estaduais) de incentivos à pessoa em tratamento de tuberculose —como auxílio-alimentação e auxílio-transporte— podem contribuir para a adesão ao tratamento. Dessa forma, o enfrentamento à pobreza, às más condições de moradias, aglomerados urbanos e às condições gerais de vida podem contribuir para melhora dos indicadores da doença.
Com relação aos aspectos programáticos, a adesão ao tratamento, que é longo —no mínimo 6 meses de tomadas diárias de medicamentos— ainda é um desafio. A detecção precoce dos casos no país é eficiente. Porém, é necessário fortalecer a rede laboratorial do país, para respostas mais rápidas e início oportuno do tratamento.
Por que o tratamento é feito apenas pelo SUS?
A tuberculose é considerada como componente estratégico do Ministério da Saúde, por isso as aquisições dos medicamentos ocorrem de maneira centralizada com laboratórios oficiais e também privados. O uso racional dos medicamentos é fundamental para o controle da doença, pois assegura o tratamento mais eficaz recomendando e reduz o risco de desenvolvimento de resistência. A utilização irregular das medicações compromete o tratamento possibilitando a ampliação da tuberculose resistente no país.
Talvez precisemos melhorar as estratégias de comunicação sobre a doença e aumentar a inclusão de conteúdos sobre tuberculose na formação dos profissionais de saúde, a fim de dar mais visibilidade a esse relevante problema de saúde pública que afetou 90 mil brasileiros em 2019.
De toda maneira, mesmo que a tuberculose seja identificada por um profissional de saúde do setor privado, será necessário acessar o tratamento por meio do SUS. Para o controle dos casos e vigilância epidemiológica, a tuberculose é uma doença de notificação compulsória, ou seja, todos os casos devem ser reportados ao poder público para que as estratégias de controle da doença sejam aprimoradas.
O tratamento via SUS é uma "vantagem" para a população?
Sem dúvidas isso é uma vantagem. A disponibilização de diagnóstico oportuno e tratamento adequado da tuberculose pelo Sistema Único de Saúde permite acompanhamento das pessoas em tratamento e vigilância epidemiológica da tuberculose no território nacional.
Considerando que é um tratamento longo e que, em geral, os sintomas desaparecem nas primeiras semanas de uso, o acompanhamento contínuo contribui para reduzir o abandono e, dessa maneira, casos de retratamento ou resistentes.
Alguns países têm altos índices de resistência aos medicamentos utilizados para tratar a tuberculose. Algumas análises atribuem essa resistência ao uso indiscriminado dos fármacos.
O estigma ainda é uma realidade sobre a doença. Como é possível melhorar esse aspecto?
Dar visibilidade sobre a tuberculose e transmitir as informações de uma forma clara é a melhor forma de desmistificar a doença. Ter conhecimento sobre as formas de transmissão e que a TB tem cura se o tratamento for feito até o final é uma maneira de diminuir a carga de estigma e discriminação.
Nesse sentido, a atuação da sociedade civil, dos veículos de comunicação e de toda a comunidade é muito importante para apoiar as pessoas com a doença e informar a sociedade que a tuberculose ainda é um problema de saúde pública que pode acometer qualquer pessoa.
O fortalecimento das ações de inclusão social e as estratégias de enfrentamento às vulnerabilidades e apoio social também são formas de minimizar o estigma atrelado à doença.
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