Dor igual: viver o luto dos pets é importante para saúde mental dos donos
A técnica de laboratório Dinalva Santos ainda não consegue olhar suas fotos com a cachorrinha Mel, que morreu no dia 8 de novembro do ano passado.
"Ela faleceu com 20 anos, em decorrência de um câncer. Estava em casa e parou de comer. Após o segundo dia sem se alimentar, levei para veterinário, que me aconselhou a acabar com o sofrimento dela, pois não tinha mais como reverter o quadro", lembra emocionada. Após isso, Dinalva desenvolveu um quadro de depressão e precisou buscar ajuda psiquiátrica. Faz tratamento com medicamentos e terapia.
Há quem ache estranho alguém sofrer tanto pela morte de um pet, mas os especialistas consultados pelo VivaBem afirmam que a dor e o processo de luto por causa de um animal de estimação podem ser exatamente iguais ao quando uma pessoa querida morrer.
Apesar de na literatura médica o luto estar relacionado à morte de um humano, um processo semelhante também ocorre quando perdemos algo muito próximo e querido, como um animal, um relacionamento, um trabalho ou um objeto.
A psicanalista Rochelle Aweida Veras diz que, nesse momento da perda de um animal de estimação, as pessoas próximas precisam respeitar o que o dono do pet está passando e tomar cuidado para não serem indelicadas. "É preciso respeitar a dor, não julgar a pessoa e, principalmente, não minimizar o sofrimento com frases tipo: 'Era só um cachorro, não tem motivo para tudo isso'", explica.
Respeitar essa dor é muito importante para que a pessoa possa passar por todas as fases do luto até chegar na aceitação, que é quando consegue lidar com a perda com menos sofrimento, vai retomando a normalidade da sua vida, se adaptando à nova realidade até o luto acabar.
Geralmente, um processo de luto dura de três meses a um ano, podendo checar até dois. Se a tristeza não diminui e o indivíduo não consegue retomar a vida, fica o tempo todo se sentindo culpado e infeliz, o problema se torna um luto patológico. Nesse caso, a depressão pode entrar em jogo e é importante procurar ajuda profissional, como tratamento psiquiátrico ou psicoterapêutico.
Fim da dor e volta por cima
A empresária Márcia Zenezi, 50, também sofreu um doloroso processo e entrou em depressão por causa da perda de sua cadelinha Cindy, mas transformou a tristeza profunda em uma grande mudança em sua vida.
"Perdi a Cindy de uma maneira que nunca imaginaria. Esqueci a porta de casa aberta e ela foi para o vizinho. Já tinha 16 anos e não enxergava direito. Acabou caindo e se afogando na piscina", conta.
O luto serviu para que ela percebesse o quanto seu relacionamento era tóxico e tomasse decisões importantes como se divorciar e vencer a obesidade após mais 40 anos tentando emagrecer —ela perdeu 40 kg.
"Quando a Cindy morreu, em vez de me apoiar, meu ex-marido me culpou e me chamou de assassina e de 'velha esquecida', disse que eu nunca arrumaria outra pessoa se me separasse. Esse foi o ponto de partida para começar a olhar para mim, para entender que precisava me amar mais e tomar várias decisões, como me divorciar, ter uma alimentação mais saudável e praticar exercícios", conta Márcia, que escreveu um livro sobre a Cindy. "Nossa história foi de muito amor", emociona-se.
Cuidados na hora da despedida
A hora da partida de um animal pode se tornar ainda mais doloroso para o dono quando não há um período prévio de preparação e a morte acontece em um acidente ou em poucos dias após descobrir uma doença, como no caso da Mel, filha de quatro patas de Dinalva.
"Os dias seguintes à morte da Mel foram de muito sofrimento para mim, não conseguia comer, não tinha forças nem para andar. O meu olhar era parado no nada e tinha visões como se ela ainda estivesse ali, afinal foram 20 anos ao meu lado. Fiquei meses sem entrar no meu quarto, porque ela sempre estava lá", recorda.
Assim como existem várias formas de viver o luto, a despedida também pode acontecer de muitas maneiras. "Não tem regra. A pessoa pode se sentir mais confortável em levar para a cremação ou enterrar, ou ela quer se livrar logo das coisas para não ficar pensando nisso", indica Veras.
A psicóloga Daiane Daumichen, especialista em terapia comportamental, pontua outros aspectos dessa despedida. "Uma coisa bastante desafiadora é o que fazer com as coisas do pet. É fácil falar para eliminar logo para não olhar e lembrar. Mas cada um tem seu jeito de lidar, há os mais práticos que não querem ter o apelo visual para despertar um sentimento, já outros precisam daquilo para passar por todo esse processo", diz.
A especialista recomenda, caso a pessoa sinta que precisa de um tempo a mais para se despedir desses objetos, pegar uma caixa e guardar em um lugar reservado. "Sempre que sentir saudade ou precisar recordar, recorra a esse espaço. É melhor do que jogar tudo fora por impulso e depois torturar-se por não ter mais nenhuma lembrança do animal de estimação", diz.
Fontes: Fabiane Curvo de Faria, psicóloga PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), especialista em terapia cognitivo comportamental e membro do Employee Assistance Program; Daiane Daumichen, psicóloga especialista em gestão estratégica de pessoas pela FGV (Fundação Getúlio Vargas); Rochelle Aweida Veras, psicanalista clínica graduada pela FMU (Faculdades Metropolistanas Unidas) e especialista pelo CEP (Centro de Estudos Psicanalitícos).
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