Estudo identifica variações em genes relacionados à covid-19 em brasileiros
Dentre as incessantemente trágicas notícias sobre a Covid-19 no Brasil, ainda causam espanto e preocupação as histórias — cada vez mais frequentes— de famílias que perderam um, dois, três, quatro, vários membros em poucos dias por causa da doença. De norte a sul do Brasil, tais relatos se multiplicam.
No começo do ano, em meio à grave crise de saúde no norte do país, sete pessoas da mesma família morreram com sintomas de covid-19 no interior do Pará.
Em março, cinco parentes faleceram por causa da doença na cidade de Cruz Alta, no Rio Grande do Sul, enquanto outros três membros da família foram internados.
Estas histórias - apesar de terem diversas possíveis explicações, como reuniões familiares ou moradias compartilhadas - fortalecem a suspeita de que talvez haja um componente genético, hereditário, que possa predispor aos sintomas graves do novo coronavírus.
Um novo estudo, com participação de pesquisadores do CEPID BRAINN, pode ajudar a esclarecer esta questão.
Publicado recentemente no periódico HGV (Human Genome Variation), o estudo "Genetic variability in COVID-19-related genes in the Brazilian population" identificou, na população brasileira, variações em genes que, acredita-se, têm influência na doença.
Essas variações — algumas similares a outras variações encontradas em populações ao redor do mundo, outras exclusivas dos brasileiros— podem resultar em taxas diferentes de contágio, infecção e de resposta do organismo à doença, e tornam-se agora alvos para estudos aprofundados sobre como o novo coronavírus afeta a população.
A influência dos genes na covid-19
Estudos prévios demonstraram que parte dos pacientes com sintomas graves de covid-19 possuía variações em um grupo de genes relacionados ao sistema imune e às proteínas de superfície de algumas células, o que poderia facilitar a entrada e multiplicação do novo coronavírus e resultar em um quadro mais severo de infecção.
Utilizando estas informações como base para as pesquisas, o trabalho publicado na HGV - e que contou com a participação dos pesquisadores Rodrigo Secolin e Iscia Lopes-Cendes, do BRAINN - analisou o genoma da população brasileira em busca de variações nestes genes de interesse.
O trabalho descreve o processo de busca, utilizando plataformas de compartilhamento de dados genéticos como o BIPMED, e os resultados: 325 variações genéticas compartilhadas com outras populações (06 delas já vinculadas a prognósticos diferenciados de covid-19) e 70 variações exclusivas até agora da população brasileira, sendo 07 delas com potencial de alterar a função de proteínas, de acordo com previsões computacionais.
"Estas descobertas podem levar a diferentes taxas de infecção ou de resposta à infecção por SARS-CoV-2, e deverão ser investigadas em pacientes com a doença", escrevem os pesquisadores.
Genética populacional no combate à pandemia
Estudos de genética populacional são cada vez mais utilizados na medicina como auxiliares na prevenção e no tratamento de doenças, desde as infecciosas, como a Covid-19, às crônicas, como obesidade e diabetes.
Ao analisar grandes bancos de dados genômicos contendo milhares de amostras de pessoas e grupos populacionais diferentes, os pesquisadores podem encontrar padrões de mutações ou variações que indiquem predisposição a doenças, ou mesmo à gravidade delas.
No caso do estudo atual sobre Covid-19, é importante frisar que as variações genéticas identificadas na população brasileira são consideradas 'raras', e portanto ainda precisam ser estudadas mais a fundo antes de servirem de base para tratamentos médicos.
"No momento, os fatores de risco já conhecidos para a covid-19, como idade, obesidade, diabetes, doenças que interferem na imunidade e o câncer, continuam sendo os principais fatores de risco que devem ser considerados pela população", afirma a pesquisadora Iscia Lopes-Cendes.
Matéria publicada originalmente no site do Cepid Brainn.
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