É "boca suja"? Falar palavrão alivia a dor e pode ser sinal de inteligência
Não há nada melhor do que soltar um "#@%@&*$" ou, quem sabe, "%$@# &%@ $ *%$*@" depois de acertar a quina da cama com o dedinho do pé. As palavras também podem sair assim, espontaneamente, após uma "fechada" no trânsito ou mesmo quando ouvimos uma notícia triste ou surpreendente. Se você se reconheceu em alguma dessas situações, fique tranquilo: falar palavrão é algo normal do ser humano e, acredite, pode até ser uma ferramenta para nos ajudar a lidar com a dor.
"Xingar ativa o nosso modo 'luta ou fuga', desencadeando uma cascata hormonal e psicológica com efeitos que nos ajudam a lidar com dor", afirma Timothy Jay, professor emérito de psicologia na Massachusetts College of Liberal Arts, nos Estados Unidos, e autor do livro Why We Curse? ("Por que Praguejamos?", em tradução livre). "Além disso, a fala também nos ajuda a distrair a mente da sensação desconfortável", explica.
Esse efeito foi observado em um estudo feito pela Universidade de Keele, no Reino Unido, e publicado no periódico Frontiers in Psychology em abril de 2020. Os pesquisadores analisaram a reação de 92 participantes ao ficarem com a mão em um balde de gelo. Eles só podiam falar três palavras (um palavrão "tradicional" e outros dois "falsos", como "pomba" ou "baralho").
Eles cronometraram quanto tempo levou para que os voluntários começassem a sentir dor, e sua tolerância ao incômodo foi determinada por quanto tempo eles conseguiram manter as mãos na água gelada. Observou-se que houve uma diferença de tolerância de acordo com o tipo de palavrão usado. O tradicional, no caso, aumentou a tolerância à dor em 33%, enquanto os palavrões falsos fizeram pouco nesse quesito.
De acordo com Jay, assumir a "boca suja" também pode ser considerado um sinal de inteligência. Em novembro de 2015, ele publicou um estudo que demonstrou que indivíduos com grande vocabulário também são experts em criar palavrões. "Se relacionarmos o uso da linguagem com a inteligência de alguém, então sim, a habilidade de xingar está relacionada à inteligência dessa pessoa", afirma.
Linguagem universal
Falar um palavrão pode parecer uma coisa impensada e sem significados, mas não é bem assim. "Em qualquer idioma, palavrões são considerados palavras sujas e geralmente reprimidas na linguagem", afirma Bárbara Santos, psicóloga e psicanalista na clínica Holiste Psiquiatria, em Salvador (BA).
Por isso, diz ela, faz sentido usar essas expressões em momentos de grandes explosões emocionais ou de energia represada, como é o caso quando sentimos ódio, raiva ou dor física —momentos em que, quase como em uma catarse, deixamos sair a primeira coisa que vem à mente.
Curiosamente, muitos xingamentos e palavrões de qualquer idioma estão ligados à sexualidade humana e aos fluidos corporais —assuntos que também são considerados tabu ou socialmente reprimidos na maioria das sociedades modernas. "O propósito de usar um palavrão é expressar uma emoção de grande intensidade, e o xingamento deixa isso bem claro quando é usado", acredita.
Sabendo usar, por que não?
Xingar o pé da cama que segurou nosso dedinho é uma coisa. Mas e aquele palavrão que enche a boca e sai na hora do gol durante uma ida ao estádio de futebol? E quando usamos as palavras sujas para apimentar o sexo?
Essas situações mostram que o uso dos palavrões precisa de um contexto —e saber ler essas informações é fundamental para se relacionar em sociedade com outras pessoas. "Saber quando e onde usar ou não esses xingamentos é uma habilidade cognitiva semelhante a escolher a roupa certa para cada ocasião ou local, uma ferramenta social bastante sofisticada", acredita Jay.
Se você ainda acha que é melhor riscar essas palavras do seu vocabulário, saiba que não há necessidade para isso. "Por que pararíamos com algo que tem impactos positivos na nossa vida?", questiona o pesquisador. Ou seja, você não precisa lavar a boca com sabão e se policiar para não falar: o melhor é aprender a usá-los de acordo com a pessoa, o lugar e a situação.
"É importante entender em quais situações e com quem podemos nos expressar assim", diz Santos. "Do contrário, podemos ser reprimidos, punidos e até excluídos do convívio por ofender alguém com essa forma de expressão."
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