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Longevidade

Práticas e atitudes para uma vida longa e saudável


Natural, mas tabu: deve-se falar ou não com o idoso sobre a própria morte?

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Imagem: iStock

Marcelo Testoni

Colaboração para VivaBem

25/06/2021 04h00

O envelhecimento é uma fase marcada por profundas transformações, reflexões e lutos relacionados a perdas variadas, reais e simbólicas: de amigos e entes queridos da mesma geração, das relações de trabalho, das funções orgânicas (declínio de visão, audição, vigor físico, beleza, potência e desejo sexual).

Tais acontecimentos acabam vivenciados, muitas vezes, concomitante ou sucessivamente, causando uma estranheza diante da finitude —que é natural do ser humano: todos vamos morrer.

É natural então que para quem tem mais de 60 anos ou convive com alguém nessa etapa da vida desponte a dúvida: "falar ou não sobre a morte?"

"No Brasil, o assunto ainda é tabu, pouco discutido por conta de uma superstição de que não é bom porque atrai. Porém, é necessário em algum momento, para esclarecer intenções e vontades, facilitar cuidados e responsabilidades, e deixar o idoso tranquilo de ver ou saber o que será cumprido", afirma Natan Chehter, geriatra da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia).

Morte sem censura

Leito de morte, leito de hospital, família junto com idoso doente no hospital - Getty Images - Getty Images
Imagem: Getty Images

Família e cuidadores devem convidar o idoso para falar a respeito do que pensa sobre o tema. Em "O Olhar do Idoso Frente ao Envelhecimento e à Morte", estudo científico publicado na Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, esse diálogo é defendido por possibilitar um maior entendimento da complexidade do homem em suas dimensões sociais, culturais, psicológicas e espirituais, e a promoção e melhora da qualidade de vida do idoso.

É uma oportunidade também para a morte inerente à idade avançada ser tratada com mais aceitação e tolerância, por ser um desfecho natural.

"Falar sobre morte não é fator para depressão. Pelo contrário, pode ser uma oportunidade para o idoso 'despertar' e aproveitar mais a vida, e a família deve desconstruir esse discurso e deixar o seu entorno mais positivista", explica Yuri Busin, psicólogo, doutor em neurociência do comportamento e diretor do CASME (Centro de Atenção à Saúde Mental - Equilíbrio), em São Paulo.

Há quem só perceba —e muitas vezes com espanto— o fim da vida quando conscientizado pela percepção exterior.

"Acontece de 'fora para dentro'. A velhice não é reconhecida pela própria pessoa de imediato, ela é algo do externo, tanto que os psicanalistas falam do 'susto ao espelho'", aponta Natália Barbieri, psicanalista e doutora em saúde coletiva pela EPM-Unifesp (Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo) em "Trabalho com velhos: algumas reflexões iniciais".

Falar, mas também escutar

Não é regra, mas falar sobre a própria morte com um idoso costuma ser mais comum quando este se encontra acamado, doente degenerativo (em início de Alzheimer, por exemplo) e preocupado com o futuro dos entes.

Cláudia Messias, psicóloga do Hospital Geral de Palmas, e que trabalha com pacientes com câncer, diz que muitos, quando sentem a necessidade de desabafar, em geral também não encontram quem esteja disposto e preparado para ouvi-los.

"Há casos em que eles tentam falar, mas são 'cortados' pelos filhos, que não sabem lidar com o sofrimento, com frases do tipo: 'não, pai, você não vai morrer, não fala isso', então já cria um bloqueio", explica.

É compreensível que os mais jovens queiram poupá-los, mas nem sempre o idoso é frágil emocionalmente como pode parecer. Pela experiência de vida, estão mais preparados para lidar com momentos difíceis e, estando com suas faculdades mentais preservadas, não devem ser privados nem mesmo de diagnósticos.

É um direito deles e necessário para que possam tomar decisões, se preparar, tirar dúvidas. Omitir é tão ruim quanto mentir, pois o idoso se sente apreensivo, triste e, se descobrir, traído.

"O idoso também sofre mais pela família, mas com a gente ele consegue se abrir, falar melhor dos seus medos, de como quer seu velório, a roupa que quer ser sepultado, para quem quer deixar tal coisa, e a gente faz essa intermediação, acolhe e prepara os filhos", diz a psicóloga.

Importante é não obrigar

Havendo interesse e abertura por parte do idoso em falar ou comentar sobre a própria morte, esteja presente e, não sabendo lidar com seus questionamentos ou com outros assuntos que ele possa abordar, não hesite em procurar ajuda profissional.

Direcionada para idosos, a terapia ajuda a compreender seus sentimentos e conflitos interiores, superar problemas, como ansiedade, medo da morte, resgatar sua identidade, melhorar sua autoestima e bem-estar.

Idoso com família - iStock - iStock
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Em casa, é preciso que os outros se atentem a sinais como apatia, isolamento, irritabilidade, angústia e tenham bom senso e respeito ao fazer algum comentário, ou repassar alguma informação, para não ofender ou entristecer esse idoso.

Se ele não gostar de falar sobre morte, tudo bem, não deve ser forçado, comenta o geriatra. Às vezes, basta sinalizar que ele tem com quem contar para conversar, caso precise e deseje.

Evite fazer comparações entre casos de falecimentos, não focar sempre no lado ruim de tudo e nem projetar as próprias emoções em relatos, ainda mais envolvendo idas ao médico ou hospital, para o idoso não se impressionar.

"Ele não tem que ficar apreensivo, achando que seu tempo está no fim. E, em se tratando dos que estão doentes, existem os cuidados paliativos e que podem prolongar a vida e a qualidade dela", complementa Messias.