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Mesmo lenta, vacinação aponta para queda de mortes por covid-19 no Brasil

FELIPE RAU/ESTADÃO CONTEÚDO
Imagem: FELIPE RAU/ESTADÃO CONTEÚDO

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

04/07/2021 04h00Atualizada em 05/07/2021 18h09

Queda na média geral de mortes por covid-19, desaceleração nas internações, diminuição de óbitos entre os idosos. Depois de cinco meses e meio do início, a vacinação começa a apontar indícios de que está fazendo efeito na melhoria dos indicadores no Brasil, apesar de os índices gerais da pandemia seguirem em patamares altos.

Até o final de junho, o Brasil havia imunizado 26,27 milhões de pessoas (12,41% da população) com as duas doses ou dose única, e 73,5 milhões (35%) com a primeira dose. Para médicos e pesquisadores ouvidos pelo UOL, o avanço da vacinação, mesmo que lento, aponta para o resultado direto para a queda em indicadores, em especial dos grupos protegidos.

Eles alertam, no entanto, que a pandemia está longe de acabar. Ao comparar os óbitos da pandemia no ano passado, antes do início da imunização, em 17 de janeiro, com os deste ano, vê-se uma redução progressiva da participação dos grupos protegidos no percentual de mortes.

Em junho de 2020, idosos com 60 anos ou mais somavam 77% dos óbitos por covid-19 cadastrados no Registro Civil. A faixa etária mais atingida era dos 70 a 79 anos, com uma a cada quatro mortes (25,5%).

Em junho deste ano, a pirâmide desceu. As faixas de 60 anos ou mais tornaram-se minoria (45,7%). O intervalo de idade com mais registros mudou, então, para 50 a 59 anos, que ainda estava em processo de vacinação, com 27% dos óbitos. A taxa caiu faixa de 25,5% para 13,6% entre pessoas com 70 a 79 anos, praticamente todas imunizadas.

Gráfico mortes por covid - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

Certamente é um indício bem forte de que a vacinação está fazendo exatamente o que nós esperávamos que ela fizesse: diminuísse em especial o número de óbitos entre os grupos imunizados. No Brasil, já podemos ver isso com mais clareza, como acompanhamos antes em outros países.
Monica de Bolle, professora da Universidade Johns Hopkins (EUA)

A queda também é observada nos boletins epidemiológicos divulgados pelo Ministério da Saúde. Em 2020, idosos com 60 anos ou mais representaram 73% das mortes por SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave). Em 2021, até o meio de junho, o índice caiu para 60%.

A tendência é que este percentual caia ainda mais à medida que a população entre 60 e 69 anos seja completamente imunizada. Segundo o Vacinômetro do Ministério da Saúde, até o fim de junho, cerca de 60% deste grupo havia tomado as duas doses ou dose única. Nas faixas acima de 70 anos, a incidência sobe para quase 90%.

O óbito é a última fronteira. Os pacientes ficam internados, em média, um mês antes de falecerem. Então, ainda tem um alto número de mortes nesta faixa [60 a 69 anos] que nem chegou a tomar vacina ou que foi infectado na janela de imunização. Agora que vacinamos quase todos, em breve com a segunda dose, devemos ver a queda expressiva também entre eles.
Paulo Menezes, coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus em São Paulo

Se analisadas apenas as faixas de 70 anos para cima (quase 90% da população imunizada), em 2020 elas representaram 51% dos óbitos por SRAG. Neste ano, são 40%.

Em São Paulo, o Centro de Contingência acompanhou números parecidos, com redução tanto na proporção de óbitos quanto na de internações, na comparação com o início do ano, pré-vacinação.

Indicadores de pacientes com 60+ em São Paulo - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

"Hoje, pessoas de 50 a 59 anos estão respondendo por 27% de todos os óbitos. Essas pessoas acabaram de ser imunizadas com a primeira dose. Então, daqui para frente, eu espero ver uma redução progressiva no número de pessoas que vão a óbito. Mas demora algumas semanas, pelo menos duas", afirma Menezes.

A diminuição das mortes entre as faixas etárias superiores impacta nos indicadores do país como um todo. Na última quinta (1º), o Brasil registrou a menor média móvel de mortes por covid em 115 dias, desde 8 de março. Na sexta, todas as regiões apontavam tendência de queda, o que não acontecia desde maio.

"Com certeza é impacto da vacinação. Já estão aparecendo diversos estudos, como o da Universidade de Pelotas [UFPel], que mostram isso. Porque [60+] era o grupo com maior mortalidade e com consequências graves da doença. Quando você diminui os casos entre eles, tem efeito direto no todo", afirma o imunologista Juarez Cunha, presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).

Idoso recebe a primeira dose da vacina contra a covid-19 na Neo Química Arena, em Itaquera - Rivaldo Gomes/Folhapress - Rivaldo Gomes/Folhapress
Idoso recebe a primeira dose da vacina contra a covid-19 na Neo Química Arena, em Itaquera
Imagem: Rivaldo Gomes/Folhapress

O estudo feito pela UFPel em parceria com a Universidade Harvard, nos Estados Unidos, aponta que a vacinação contra a covid-19 evitou a morte de mais de 43 mil idosos de 70 a 79 anos no Brasil.

Os cientistas estimaram que o avanço das imunizações seja o fator responsável pela prevenção dos números de óbitos em um intervalo de 13 semanas, com declínio progressivo na proporção de mortes pela doença. Naquela faixa, caiu de 28% para 16%. Entre os idosos com mais de 80 anos, de 28% para 12%.

Outro estudo feito pelo Instituto Butantan em Serrana, no interior de São Paulo, para testar a eficácia da CoronaVac também revelou dados animadores. Pouco mais de 95% dos adultos da cidade foram vacinados entre fevereiro e abril.

Em junho, a cidade teve quedas de 86% nas internações e de 81% em casos sintomáticos. O número de mortes caiu de 18, em maço, para 6 — dois deles, no entanto, não tinham tomado a vacina.

Média móvel de mortes em 3 de julho - UOL - UOL
Média móvel de mortes em 3 de julho
Imagem: UOL

Pandemia segue em curso e variantes preocupam

Os pesquisadores alertam, no entanto, que a pandemia segue em patamares altos no Brasil e que, mesmo com os avanços da vacinação, uma nova onda de altas nos indicadores não pode ser descartada. Apesar da queda, o índice diário de mortes segue superior a mil há 164 dias.

Tomei vacina, significa que eu posso liberar geral? Não. Pessoas vacinadas podem ter carga viral muito alta. As chances de casos graves e óbitos diminuem, mas ainda existem. Então, os recados continuam os mesmos: continuar usando máscara, fazendo distanciamento social e evitando aglomerações."
Juarez Cunha, presidente da SBIm

O imunologista lembra que esses cuidados devem ser reforçados em especial com a circulação da variante Delta, identificada inicialmente na Índia, no Brasil. "É uma mutação com altíssimo índice de contaminação — e, hoje, vemos que uma variante que transmite com muita facilidade é até mais perigosa que uma mais letal. É só ver Manaus, que colapsou com a P.1 [Gamma]."

"Parte das vacinas já apontaram eficácia para esta variante. Da CoronaVac, ainda não temos, mas tudo indica que também seja eficaz. Ainda assim, é muito preocupante. Há estados aqui [nos EUA] em que ela se tornou responsável por 90% da contaminação da população não vacinada. É mais transmissível que a P.1? Não sabemos, mas é alarmante", afirma de Bolle.

Escolher a marca da vacina, prática que tem se popularizado nas capitais, também preocupa os pesquisadores. Os governos estaduais têm investido em campanhas e municípios estão tomando medidas para evitar os chamados "sommeliers de vacina".

Agora que a situação melhorou um pouco em termos de disponibilidade de doses, a mensagem é: se vacine com a vacina disponível. Essa história de querer escolher a vacina complica muito a estratégia de imunização, prejudica o todo, porque é uma pessoa imunizada a menos, e também deixa as próprias pessoas desprotegidas."
Monica de Bolle, professora da Universidade Johns Hopkins (EUA)

"Estamos na reta final. Os indicadores estão melhorando e apostamos que, quanto mais a vacinação adentrar em novas faixas etárias, melhor ficará. Mas isso não significa que acabou. Os cuidados seguem - inclusive para que acabe mais rápido", conclui Paulo Menezes.