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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Sinceridade x grosseria: como identificar a linha tênue que as separa?

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Heloísa Noronha

Colaboração para o VivaBem

03/08/2021 04h00

Muitas pessoas dizem que têm "personalidade forte" ou que são sinceras quando, na verdade, ofendem e atacam os outros com suas colocações. E muita gente que se diz autêntica, na prática, acaba magoando os outros sem necessidade, com comentários que parecem motivadores ou críticas construtivas, mas não passam de ofensas ou opiniões grosseiras não solicitadas. Essas situações despertam algumas dúvidas, como: é possível diferenciar sinceridade e grosseria? E mais: quem age assim costuma se dar conta de que em diversos momentos machucam os outros?

Para a psicóloga e psicanalista Renata Bento, membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro e da International Psychoanalytical Association UK, por mais que haja honestidade na fala, é preciso ter empatia e respeito pelo espaço interno do outro. "É necessário refletir sobre até que ponto é possível ir para não ferir. Ser sincero ou ter personalidade forte não dá o direito de invadir o outro. Numa relação, é importante mostrar ao interlocutor sua destrutividade", observa.

Ainda segundo ela, existem muitas formas de se falar a mesma coisa sem precisar utilizar ofensas. A dificuldade está em pensar sobre isso e escolher a melhor forma. "Falar com assertividade é um exercício que deve ser praticado por quem preza por se relacionar ou as relações não irão para a frente", diz.

Na opinião de Natalia Pavani, psicóloga do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo (SP), uma comunicação violenta pode ser mascarada e justificada como autenticidade, como, por exemplo, quando ouvimos alguém dizer "eu falo o que penso, doa a quem doer". Esse tipo de posicionamento pode chegar a ser admirado, inclusive. "A questão é que existe um limite importante entre a sinceridade e a grosseria, mas que nem sempre é claro: se a sua opinião, a sua observação ou a sua análise correm o risco de incomodar, magoar ou ofender o outro, isso significa que você não deve falar. A não ser que a sua verdadeira intenção seja, de fato, machucar alguém", afirma.

De acordo com ela, pessoas autênticas, que são conhecidas pela "personalidade forte", não se preocupam em bajular ou em serem admiradas por todos o tempo todo. "Mas isso não significa que essas pessoas sejam grosseiras, mal-educadas e que digam tudo que vem à mente. Isso é sinal de alguém que tem pouca empatia e habilidade interpessoal. Pessoas autênticas costumam ser assertivas e cordiais e utilizam as palavras de forma 'cirúrgica', de tão bem colocadas. Isso é completamente diferente de comentários maldosos e pejorativos", fala.

O contexto deve ser levado em consideração. Uma opinião/fala, mesmo que não agrade ao interlocutor, pode ter o intuito de ajudar. "Ser sincero a respeito de algo pode ter uma relevância importante na vida de outra pessoa. Não é necessário ter uma relação superpróxima com o outro para emitir uma opinião sincera. Desde que seja feita com educação e com o propósito de auxiliar, a sinceridade é válida", pontua Adriane Branco, psicóloga especialista em TCC (Terapia Cognitivo-Comportamental) pelo CPCS (Centro Psicológico de Controle do Stress). Por exemplo, em vez de dizer "essa roupa deixa você desproporcional", fale "você fica muito bem com tal roupa, valoriza você". Ou, ainda, trocar "você não sabe fazer isso" por "estou vendo que essa tarefa está desafiadora, vou dar algumas dicas que podem facilitar o seu trabalho".

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É possível ser sincero e criticar alguém de forma empática
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Quando impor limites

Não é raro que a pessoa aja de forma hostil e sequer se dê conta. A psicóloga Renata Bento conta que pessoas com personalidade passivo-agressiva tendem a alfinetar sem perceber o modo destrutivo de se relacionar. "A maior parte da comunicação acontece de forma inconsciente e serve para arremessar no interlocutor sentimentos que são difíceis de sentir, como a insegurança, a raiva, a angústia. Esse comportamento só vai se modificar se começar a causar prejuízo nos relacionamentos e a pessoa sentir a necessidade de mudar ou de buscar ajuda especializada para isso", completa.

Já Adriane Branco pondera que, em alguns casos, a pessoa que ofende pode estar em um momento de vida delicado, com algum problema com ela mesma e por isso talvez nem tenha a percepção clara do que está acontecendo. "Dessa forma, acaba adotando certa agressividade na maneira de usar as palavras. Se esse for um comportamento que não é recorrente, e alguém sinalizar a essa pessoa que sua maneira de expressar ideias e opiniões está magoando a quem ouve, ela terá a oportunidade de reavaliar este comportamento e modificá-lo", avisa.

É possível que esse tipo de comportamento esteja naturalizado e que a pessoa não perceba, mas isso não a exime de responsabilidade. "A todo momento os nossos comportamentos produzem algum tipo de efeito nos demais", ressalta Pavani.

Quem é alvo de alfinetadas disfarçadas —conscientemente ou não — de sinceridade pode usar o humor como uma boa ferramenta para lidar com esse tipo de situação. Contudo, em casos em que uma pessoa é exposta com regularidade a esse tipo de comportamento, posicionar-se é obrigatório. "Quando a pessoa que é vítima da grosseria não permite essa comunicação, ou seja, ela dá o tom da conversa, o interlocutor recua. Por isso é importante definir quais são os seus limites e, de uma forma firme, anunciá-los quando for necessário", indica Bento. Não há a necessidade de usar palavras agressivas para se colocar —entrar na mesma seara verbal do outro não é uma boa ideia.