Topo

Hora do almoço é sagrada; entenda a importância de comer devagar e relaxar

iStock
Imagem: iStock

Bruna Alves

Do Vivabem, em São Paulo

22/09/2021 04h00

Resumo da notícia

  • O Guia Alimentar Para a População Brasileira traz três orientações básicas: comer com regularidade e atenção, em ambientes apropriados e acompanhado
  • Entre os benefícios de seguir essas orientações estão melhor digestão dos alimentos, controle da quantidade e maior interação social
  • Segundo os especialistas, não é recomendado usar celular, ver TV ou mexer em qualquer outro eletrônico durante o horário do almoço

"Vou comer aqui mesmo, rapidinho, para voltar logo ao trabalho". Quem nunca menosprezou a hora de almoço que atire a primeira pedra. Mas essa correria do dia a dia, sobretudo na hora do almoço, está longe de ser o ideal. Parar o trabalho ou o estudo e realmente ter um momento para a refeição é importante para a saúde.

Primeiro porque essa pausa é imprescindível para perceber os sinais de fome e saciedade, de acordo com Cinthia Karla Rodrigues Do Monte Guedes, professora do DNUT (Departamento de Nutrição) da UFPB (Universidade Federal da Paraíba). Parar de fazer qualquer outra coisa e prestar atenção na comida é essencial para uma escolha mais saudável dos alimentos e montagem do prato.

A ideia é realmente sentir o sabor do alimento e mastigar com calma, para que assim o mecanismo fisiológico ocorra da forma correta. De acordo com Ana Kátia Moura Lopes, nutricionista e chefe da Nutrição Clínica do Hospital Universitário Walter Cantídio (CE), o cérebro demora cerca de 16 minutos para concluir que você se alimentou.

O hormônio colecistocinina é um modulador da ingestão alimentar e, quando comemos, seu nível aumenta rapidamente com um pico de 15 minutos após a refeição. Por isso devemos comer devagar e com atenção, para dar tempo de o hormônio avisar ao cérebro que o corpo está saciado.

Deixe um tempo reservado para almoçar - iStock - iStock
Deixe um tempo reservado para almoçar
Imagem: iStock

"Têm pessoas que almoçam em 10 minutos, então ela acabou de almoçar e o cérebro não entendeu o comando. Por isso, dali meia hora vem a fome novamente", exemplifica Lopes, lembrando que é preciso saber diferenciar a fome e a vontade de comer, que são comumente confundidas.

De acordo com a recomendação do Guia Alimentar Para a População Brasileira, é importante falar também da comensalidade, que é a prática de ter companhia na mesa, ou seja, interação social com familiares, amigos ou colegas de trabalho. "O que se come é tão importante quanto com quem se come, afinal, a alimentação é um ato social de integração e uma grande fonte de prazer. Alimentar-se em (boa) companhia afeta diretamente a qualidade da dieta", diz a professora da UFPB.

"Além disso, é um momento para descansar, levantar-se da cadeira, melhorar a postura e circulação do corpo, diminuindo o estresse ou a ansiedade", diz Débora Palos, nutricionista da Clínica Maria Fernanda Barca e do Hospital 9 de Julho.

O que não deveria ser feito durante a refeição?

Usar o celular, sem dúvida, é um dos piores malefícios durante a refeição, já que essa distração impede o processo de atenção plena (mindfulness) para o comer consciente (mindfull eating). O mesmo vale para assistir à televisão, mexer no computador ou usar qualquer outro eletrônico.

Um estudo publicado em maio deste ano avaliou a percepção e a ingestão de alimentos de pessoas que comiam enquanto assistiam a outras pessoas se alimentando. O resultado não foi apenas o aumento da quantidade ingerida, mas houve também alteração na percepção do sabor dos alimentos.

"Portanto não devemos usar aparelhos eletrônicos, trabalhar ou estudar ao mesmo tempo que nos alimentamos", diz a professora da UFPB. "Isso não favorece uma atenção ao que de fato deve-se fazer naquele momento: alimentar-se bem e com qualidade", completa.

As consequências de comer correndo podem ser elencadas em curto e longo prazo. Em curto prazo pode haver um consumo de vitaminas e minerais em quantidade insuficiente para um bom funcionamento do corpo, a mastigação inadequada e, consequentemente, uma má digestão.

Em frente às telas não é possível perceber a quantidade que se come - iStock - iStock
Em frente às telas não é possível perceber a quantidade que se come
Imagem: iStock

"Em longo prazo, as consequências podem ser mais drásticas, como a desregulação da percepção de fome e saciedade, podendo levar a compulsões alimentares, sobrepeso e à obesidade", descreve a professora de nutrição da UFPB.

Isso ocorre devido ao desaceleramento do metabolismo, já que o acúmulo passa a ser mais de massa gorda em detrimento da massa magra.

Outro estudo, publicado na International Journal of Environmental Research and Public Health, avaliou as escolhas alimentares de mais de 6 mil alunos, com idade entre 11 e 16 anos, além de 289 professores no País de Gales. Os especialistas concluíram que pausas mais curtas para o almoço estão associadas a escolhas de alimentos menos saudáveis.

Quanto mais rápido, mais comida

Maria Alvim, nutricionista e cientista do Nupens (Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde) da USP (Universidade de São Paulo), lembra que as pessoas tendem a comer mais que o necessário quando estão diante de grandes quantidades de alimentos ou quando há oferta de grandes porções. "Boa providência para evitar comer demais é servir-se apenas uma vez ou, pelo menos, aguardar algum tempo para se servir uma segunda vez. Frequentemente, a segunda porção excede às nossas necessidades", indica Alvim.

Portanto, ao comer fora de casa, principalmente em restaurantes de comida à vontade, é bom ter atenção. "Restaurantes onde se paga pela quantidade (comida por quilo) oferecem grande variedade de alimentos preparados na hora e são melhores alternativas para o dia a dia", acrescenta Alvim.

Em contrapartida, os chamados restaurantes fast-food não são considerados boas opções. Mas isso não é nenhum segredo, não é mesmo? Segundo os especialistas, além de oferecerem pouca ou nenhuma opção de alimentos in natura ou minimamente processados, em geral, são barulhentos e pouco confortáveis.

Experimente mudar a rotina, se possível

Um ambiente arejado, limpo, iluminado, confortável e visualmente tranquilo, como uma varanda ou sacada, por exemplo, favorece o momento da alimentação. Isso ajuda, por exemplo, uma mastigação adequada e consequentemente o melhor aproveitamento dos nutrientes presentes nos alimentos.

Além disso, para relaxar após a refeição vale tirar o famoso cochilo. Sim, mesmo que apenas por alguns minutos, esse curto período de sono está associado à melhora da saúde cognitiva, emocional e a memória, facilitando o aprendizado. O cochilo também é relacionado à diminuição da pressão arterial em quem tem hipertensão, como mostrou uma análise recente.

Mas fique atento: cochilar demais tem um efeito inverso, isto é, traz resultados negativos como declínio cognitivo, hipertensão e diabetes, principalmente em pessoas mais velhas, como destacou uma pesquisa de 2017.

Os especialistas sugerem 30 minutos de sono após a refeição para obter benefícios. Mas caso não seja possível, há outras opções. O importante é que a pausa não seja relacionada ao trabalho.

  • Ler o capítulo de um livro;
  • Ouvir música;
  • Meditar;
  • Fazer ioga ou alongamentos;
  • Conversar com colegas;
  • Arrumar o cabelo ou fazer as unhas (por que não?).
Aproveite o tempo disponível após o almoço e cuide de você - iStock - iStock
Aproveite o tempo disponível após o almoço e cuide de você
Imagem: iStock

Fontes: Ana Kátia Moura Lopes, nutricionista e chefe da Nutrição Clínica do Hospital Universitário Walter Cantídio (CE), que faz parte da Rede Ebserh; Cinthia Karla Rodrigues do Monte Guedes, professora do DNUT (Departamento de Nutrição) da UFPB (Universidade Federal da Paraíba); Débora Palos, nutricionista da Clínica Maria Fernanda Barca e do Hospital 9 de Julho, especialista em terapia nutricional, nutrição clínica e funcional; Maria Alvim, nutricionista e cientista do Nupens (Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde) da USP (Universidade de São Paulo); Maria Fernanda Barca, endocrinologia pela FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), membro da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e da SEE (Sociedade Europeia de Endocrinologia).