Sintomas não motores de Parkinson aparecem de 10 a 15 anos antes; entenda
Quando se pensa na doença de Parkinson, logo vem à mente os famosos tremores em repouso, principalmente das mãos. No entanto, engana-se quem pensa que este é o sintoma mais representativo do quadro. De acordo com um artigo publicado no The Lancet em 2015, até 20% dos pacientes com Parkinson podem não apresentar esse sintoma.
"Apesar de ser frequente na maioria dos pacientes com doença de Parkinson, este não é o sintoma mais proeminente da doença. O tremor tende a aparecer eventualmente no curso da doença da maioria dos pacientes, mas podemos inclusive ter portadores da doença que nunca o terão", explica Marcos Eugenio Ramalho Bezerra, neurologista chefe da Unidade do Sistema Neuromuscular e do coordenador do Ambulatório de Distúrbio do Movimento, ambos do HC-UFPE (Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco), vinculado à Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares).
É importante falar sobre isso, já que existem sinais ainda mais complicados da doença. "Por outro lado a rigidez e principalmente a lentidão (bradicinesia) são sintomas até mais incapacitantes e quando se apresentam de forma isolada podem retardar o diagnóstico e o tratamento da doença", explica Carlos Melro, neurocirurgião do Hospital da PUC-Campinas (Pontifícia Universidade Católica de Campinas).
Sintomas não motores de Parkinson aparecem muito antes
Por mais que os sintomas motores já citados no começo desse texto sejam os mais característicos do Parkinson, existem outros que costumam aparecer entre 10 e 15 anos antes. "Os sintomas desta fase, conhecida como fase pré-motora, são principalmente a hiposmia (redução no olfato do paciente cronicamente), a constipação, com uma redução no número de evacuações, podendo passar vários dias sem ir ao banheiro, e o chamado transtorno comportamental do sono REM, um distúrbio do sono em que os pacientes se movimentam muito durante o sono, como se estivessem 'vivenciando os seus sonhos'", enumera Bezerra.
Ele explica que para os sintomas motores darem as caras, é preciso que mais da metade dos neurônios dopaminérgicos da substância negra cerebral tenham sido perdidos, por isso que eles demoram mais.
No entanto, o especialista nos indica que é muito raro conseguir diagnosticar o quadro sem eles. "Uma vez que, por definição, para o diagnóstico de doença de Parkinson é necessária a presença dos sintomas motores", finaliza o especialista.
Mas afinal, quais são os principais sintomas do Parkinson?
Conversamos com especialistas e listamos a seguir os principais:
1. Sintomas motores
São as alterações musculares que ocorrem nessa doença, afetando a musculatura corporal, principalmente as fibras lisas. Os principais deles são:
- Bradicinesia: lentidão geral dos movimentos e suas derivações tais como as alterações da escrita (micrografia), da fala (hipofonia), da marcha (marcha em bloco) e da mímica facial (hipomimia);
- Tremor de repouso: que ocorre quando o membro está parado e não durante uma postura ou movimento;
- Rigidez: aumento da resistência da articulação ao movimento.
Hoje, de acordo com Movement Disorders Society, o diagnóstico do Parkinson se dá obrigatoriamente com a presença da bradicinesia, acompanhada da rigidez ou do tremor em repouso.
"Isso torna o paciente com Parkinson uma pessoa mais lenta em tudo que vai fazer, o mundo do parkinsoniano é extremamente lentificado: andar, trabalhar, falar, fazer as necessidades, todos os processos de sua vida se tornam mais devagar", descreve Beny Schmidt, patologista neuromuscular e professor adjunto do Departamento de Anatomia Patológica da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
2. Dificuldades na fala e escrita
Esse sintoma, na verdade, é uma derivação da bradicinesia, já que a lentidão dos músculos da fala o deixa com a voz mais baixa, lenta e sem prosódia (ou seja, sem variação de entonação).
"Com o avançar da doença, o paciente pode desenvolver quadro de disartria, a perda progressiva na capacidade de articulação dos músculos da fala, e eventualmente, em alguns casos, pode evoluir com distúrbios cognitivos da linguagem, com prejuízo até no entendimento da fala em fases bastante avançadas", descreve Bezerra, de Pernambuco.
Esse sintoma afeta também a escrita: a letra pode se tornar cada vez menor e ter uma compreensão ainda mais difícil. Ou seja, a comunicação é dificultada de diversas maneiras.
3. Redução das expressões faciais
A lentificação dos movimentos e rigidez afeta também as expressões de quem tem Parkinson. "O nome desse sintoma é a hipomimia —redução na expressão da musculatura facial, sendo classicamente comparada a uma 'face em máscara', visto que o paciente tende a perder sua expressividade espontânea e reduzir o número de piscadas", explica Bezerra.
Por sorte, tanto ele quanto Melro sinalizam que o tratamento medicamentoso para o quadro reduz bastante esse sintoma.
4. Lentificação dos pensamentos
O neurocirurgião Carlos Melro explica que essa lentificação está relacionada a alguns outros sintomas, como a dificuldade motora de se expressar, aliada à depressão (muito comum ao parkinsoniano) e à demência, que pode acompanhar o quadro, já que ele é considerado neurodegenerativo.
5. Redução do olfato
Muito antes de a covid-19 afetar a capacidade de seus pacientes sentirem odores, esse sintoma já estava associado ao Parkinson. "Ocorre por envolvimento da região chamada bulbo olfatório, sendo uma das regiões afetadas muitas vezes antes mesmo da substância negra, portanto antes do surgimento dos sintomas motores", explica Bezerra.
No entanto, ela ocorre de forma gradual e lenta, sendo imperceptível para o paciente. Na anamnese, podem ser feitos testes com estímulos como hortelã, café, chocolate e baunilha.
6. Constipação
O intestino é composto de uma musculatura lisa, que é bastante afetada pela degeneração motora causada pelo Parkinson, como explica Beny Schmidt. Além disso, o intestino possui uma quantidade de neurônios equiparável ao próprio cérebro, eles agem controlando o peristaltismo intestinal e a formação do bolo fecal.
"Na doença de Parkinson, estes neurônios intestinais também estão frequentemente afetados, levando a uma lentidão do funcionamento intestinal, e daí a constipação", explica Bezerra.
O tratamento costuma ser feito com os medicamentos pró-motores e mudanças na dieta para melhorar o quadro. Laxantes não costumam ser recomendados de forma corriqueira, pois podem piorar o quadro em longo prazo.
7. Distúrbios do sono
É normal que o paciente com Parkinson tenha sintomas que atrapalhem seu sono, como insônia e agitação extrema. "Às vezes há comportamento violento sem que a pessoa acorde ou se lembre no dia seguinte, o chamado distúrbio comportamental do sono REM", ensina Melro.
Bezerra elenca outros sintomas como:
- Noctúria: um aumento nos despertares à noite para urinar;
- Sonolência excessiva diurna;
- Síndrome das pernas inquietas: mal-estar inespecífico nas pernas durante a noite, que apenas melhoram quando o paciente se levanta e se movimenta.
8. Demência
Como o quadro de Parkinson também é neurodegenerativo, pode acontecer de a doença avançar para regiões cerebrais como o córtex, trazendo sintomas mais relacionados à demência como:
- Déficits de memória;
- Delírios e alucinações;
- Disfunção executiva;
- Apraxia;
- Distúrbios de linguagem.
O quadro, no entanto, é diferente de doenças como o Alzheimer, até porque os sintomas motores costumam aparecer primeiro
9. Depressão e ansiedade
Esses são alguns dos sintomas que mais afetam a qualidade de vida do parkinsoniano. "Transtornos do humor (depressão e distimia) e ansiedade são bastante comuns entre pacientes com doença de Parkinson, atingindo uma parcela significativa dos pacientes", explica Bezerra.
10. Hipotensão
Carlos Melro explica que a neurodegeneração pode levar a um comprometimento das regiões do sistema nervoso que regulam as funções do sistema nervoso autônomo, como a temperatura do corpo, batimentos cardíacos e pressão arterial, entre outros. "Pode ser tão intensa que provoca o desmaio (síncope) em algumas pessoas", descreve o neurocirurgião.
11. Problemas urológicos
Além da já citada noctúria, é comum que o parkinsoniano tenha incontinência urinária, urgência miccional e até problemas com ereção. Isso está muito ligado a bradicinesia, conforme explica Schmidt.
Tremores além do Parkinson
Assim como nem todo quadro de Parkinson apresenta tremor, nem todo tremor significa Parkinson. "A principal causa de tremores em adultos é o chamado tremor essencial, mais comum com o passar da idade e geralmente com um componente familiar associado", explica o neurologista Marcos Eugenio Ramalho Bezerra, de Pernambuco.
De acordo com ele, a diferença é que nesse quadro o tremor ocorre durante a execução de uma tarefa —segurando objetos, bebendo água, escrevendo— e piora quando se está nervoso.
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