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ANÁLISE

Molnupiravir: por que os resultados contra a covid-19 trazem esperança

Na análise interina, o grupo que recebeu placebo teve quase o dobro de mortes ou hospitalizações em comparação com o grupo que recebeu a droga - iStock
Na análise interina, o grupo que recebeu placebo teve quase o dobro de mortes ou hospitalizações em comparação com o grupo que recebeu a droga Imagem: iStock

Giulia Granchi

Do VivaBem, em São Paulo

01/10/2021 14h40

Os resultados de um estudo que analisou a droga antiviral molnupiravir contra a covid-19 fizeram cientistas de várias partes do globo sentirem-se um pouco mais esperançosos.

De acordo com informações divulgadas pela MSD (Merck Sharp & Dohme, conhecida como Merck & Co. nos Estados Unidos e Canadá) e a Ridgeback Biotherapeutics, na análise interina (a análise dos dados atuais de um ensaio ainda em andamento), o molnupiravir reduziu em aproximadamente 50% o risco de hospitalização ou morte (considerado o objetivo primário do estudo quando os cientistas o planejaram) quando administrado até o quinto dia de sintomas da doença.

Os resultados foram tão significativos que o estudo foi interrompido antes da hora. Apesar de todos os dados não estarem ainda disponíveis para o público, houve a análise de um comitê externo, não ligado às empresas, que aconselhou a interrupção.

"A conduta é realmente parar o estudo e submeter os dados para aprovação com o objetivo de começar o uso emergencial, já que não seria ético manter um grupo placebo sendo que existe um medicamento com tamanho potencial", explica a epidemiologista Denise Garrett, vice-presidente do Instituto Sabin.

A submissão à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) será solicitada em breve. "Se aprovado, o medicamento pode mudar o rumo da pandemia. Nesse momento que temos vacinas que são confiáveis e seguras, o que falta é uma droga que ajude no tratamento", diz Garrett.

Qual é o mecanismo do molnupiravir no corpo

O molnupiravir, explica a epidemiologista, é um medicamento que estava originalmente sendo testado para tratar gripe.

"É uma droga sintética, que interfere na ação das enzimas que fazem parte do processo de replicação do vírus Sars-CoV-2. O medicamento introduz erros no RNA, o material genético do vírus, atrapalhando essa replicação", esclarece Garrett.

Como o estudo foi feito

O estudo foi multicêntrico (conduzido de acordo com um único protocolo, simultaneamente em vários centros de pesquisa, nacionais ou internacionais) randomizado (os participantes são sorteados para entrar em um esquema terapêutico ou no outro), duplo-cego (nem o examinador nem os pacientes sabem se estão no grupo placebo ou medicamentoso).

A análise acompanhou 775 adultos com covid-19 leve a moderada e maior risco para doenças graves em razão de comorbidades (obesidade e doença cardíaca, por exemplo). Os resultados preliminares mostram que, entre os pacientes que receberam molnupiravir, 7,3% tiveram o desfecho mais grave da doença (hospitalização ou morte) após 30 dias, comparado com 14,1% recebendo placebo. Até o 29º dia, nenhuma morte foi relatada em pacientes que receberam o remédio. Já no grupo placebo, oito pacientes faleceram.

"Mais estratégias e tratamentos são urgentemente necessários para combater a pandemia de covid-19, que se tornou uma das principais causas de morte e continua a afetar profundamente pacientes, famílias e sociedades, além de sobrecarregar os sistemas de saúde em todo o mundo. Com estes resultados, estamos otimistas de que molnupiravir pode se tornar um medicamento importante como parte do esforço global para combater a pandemia", disse Robert M. Davis, CEO e presidente da MSD, em release oficial de divulgação.

Cautela necessária

Para que os cientistas possam fazer uma análise mais completa do estudo, é necessário que as empresas liberem todos os dados da análise, e não apenas os de divulgação, como foi feito até agora.

"Não foi possível encontrar dados sobre os resultados de mortalidade e internação separados na publicação. Acho importante termos isso em mãos para ver se aconteceu o mesmo que aconteceu com o tofacitinibe - que alardearam redução do risco de morte. Na verdade, a redução ocorreu apenas quando a morte foi associada a disfunção renal e na morte isolada", comenta Rachel Riera, professora adjunta da disciplina de medicina baseada em evidências da EPM-Unifesp (Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo).

Outra questão a se ponderar é que o estudo foi realizado entre não vacinados. É ainda incerto, diz Garrett, se o FDA (órgão de controle dos EUA) vai extrapolar esses resultados para aprovar o medicamento também para os vacinados. Grávidas e crianças também não foram incluídas na análise.

Em estudos como esse, é feito também o estudo de toxicidade do medicamento —segurança e eficácia são analisados em conjunto. "Assim, se uma agência reguladora aprovar o uso, significa que esses dados mostraram resultados positivos", aponta a epidemiologista.