Como melhorar a saúde mental das crianças no retorno às aulas presenciais
A pandemia afetou a saúde mental de muita gente e com as crianças não foi diferente. Mesmo que nem sempre compreendam com exatidão tudo o que está acontecendo, os pequenos podem ter suas emoções abaladas por conta das mudanças da rotina em casa e nos estudos, da impossibilidade de passear e brincar em lugares abertos, da falta de convivência com avós, tios, primos e amiguinhos etc.
Tudo isso pode gerar crises de estresse ou de ansiedade, birras, irritabilidade, dificuldades de socialização, maior dependência dos pais para atividades básicas e regressões nas etapas de desenvolvimento já adquiridas, como voltar a fazer xixi na cama e enfrentar distúrbios do sono. E essas condições podem ser potencializadas agora que muitas crianças estão voltando às aulas presenciais, o que exige novas adaptações na rotina dos pequenos e a retomada do convívio com "estranhos".
Com a ajuda de especialistas, damos dicas do que os responsáveis podem fazer para melhorar a saúde mental das crianças na pandemia e no retorno à escola.
1. Diminua a cobrança no retorno às aulas presenciais
É normal que os pais estejam preocupados com os atrasos na aprendizagem causados pelo ensino remoto. No entanto, ficar ansioso, cobrar e pressionar os filhos para colocar o "estudo em dia" não colabora nem contribui para que eles tenham um bom desempenho. Os pais devem atuar em parceria com as diretrizes da escola e entender que o retorno às aulas presenciais pode não ser como costumava ser ou como desejado.
O desempenho da criança na escola pode ser afetado em meio a esse cenário devido às dificuldades de concentração pela mudança de rotina e pelo estranhamento no convívio que estava interrompido.
Os cuidadores devem se atentar às formas como as crianças estão se sentindo nessa retomada, sem fazer cobranças excessivas. A hora é de solidariedade. Cabe também aos professores reconhecer gradualmente as necessidades grupais de sua turma e a parceria família-escola identificar os pontos essenciais para apoio e reforço do aprendizado.
O conteúdo virá com o tempo, as emoções e as motivações são as portas para uma boa aprendizagem. Nesse momento, o mais importante para as crianças é retomar vínculos, reestabelecer a rotina e se sentirem seguras e acolhidas no ambiente escolar.
2. Seja sensível se a criança estiver com dificuldades de socializar
Um dos principais efeitos da pandemia foi na socialização das crianças. Para algumas que já tinham problemas para se socializar, o distanciamento social e a ausência escolar foram sentidas como um alívio. Para as que não tinham, a convivência veio como perda, isolamento e tristeza.
Com a volta às aulas presenciais, as crianças estarão mais uma vez mudando de rotina e sendo estimuladas a enfrentar um novo modo de ser. Algumas vão se readaptar facilmente, outras não. Nesse sentido, pais e educadores devem estar sensíveis a esse cenário, auxiliando-as lentamente na retomada, criando ambientes confortáveis para que se expressem e interajam.
Os pais devem observar seus filhos, mas não compará-los a ninguém. Ao perceber que eles estão mais resistentes ao retorno devido a problemas de socialização, é fundamental manter conversas abertas sobre o quão desafiador pode ser esse momento. Os cuidadores devem legitimar as dificuldades da criança, não achar que é "frescura" e nem minimizar. O acolhimento faz com que ela se sinta confiante e à vontade para expor o que está sentindo e para que ela entenda que toda mudança pode ser melhor com tempo, adaptação e autoconhecimento.
3. Estimule atividades durante as pausas nas aulas online
Sem dúvida, um dos maiores impactos das aulas online foi o uso da tecnologia, com o aumento do tempo de exposição às telas, levando a problemas de acuidade visual, sedentarismo e ganho de peso. Ficar horas na frente do computador não é bom para ninguém, incluindo as crianças.
Fazer intervalos, levantar, movimentar-se, beber água, ir ao banheiro são dicas simples, mas que funcionam para trazer equilíbrio nesse cenário de sobrecarga nas telas.
Durante as pausas, os pais podem estimular os filhos com atividades criativas manuais, pintar, colorir desenhos, fazer colagem, brincar de massinha e até incluí-los, quando possível, em tarefas domésticas, como ajudar a fazer um bolo, arrumar o guarda-roupa etc.
Muito se fala sobre o tempo que as crianças ficam expostas aos dispositivos eletrônicos, no entanto, os cuidadores também devem estar atentos ao próprio uso e se não estão deixando de dedicar tempo de qualidade no convívio com as crianças.
4. Incentive o diálogo
A fala, a escuta e o acolhimento são elementos fundamentais para a saúde mental, sobretudo em tempos de crise coletiva como a que estamos vivendo na pandemia. Incentivar o diálogo com as crianças as ajuda a nomear e a compreender o que estão vivendo e sentindo, permitindo que haja maior elaboração desse período e alívio do estresse emocional.
Mesmo que não se concorde com o ponto de vista dela, podemos discordar, mas temos que respeitar as diferentes formas de sentir, pensar e refletir. Só aumentando nossa capacidade de lidar com as diferenças é que poderemos diminuir os conflitos interpessoais.
5. Reorganize a rotina de sono
A exposição excessiva às telas também pode impactar o sono das crianças, pois a luz emitida é recebida pelo cérebro como um estímulo para permanecer alerta e vigilante. Com isso, os pequenos podem começar a dormir mais tarde que o convencional e ter dificuldades para pegar no sono. O cansaço após uma noite mal dormida pode deixar a criança mais sensível e irritada. Dormir bem é tão importante como beber água, comer, ir ao banheiro, ou seja, é uma necessidade fisiológica.
Algumas dicas para reorganizar o sono: desligue os dispositivos eletrônicos no mínimo uma hora antes de dormir, estabeleça hábitos diários que tragam a sensação de organização, como não utilizar a cama para estudar ou assistir à aula, limite as sonecas da tarde, conte uma história, pergunte o que seu filho mais gostou naquele dia, incentive exercícios de mindfulness, dê um banho quente, crie um ambiente aconchegante e silencioso no quarto.
As crianças podem resistir em criar essa nova rotina de sono, mas os pais devem impor regras e podem explicar a elas os benefícios, como ajudá-las a terem mais energia para brincar e aprender na escola.
6. Está fazendo birra? Ajude a criança a identificar o que ela está sentindo
Irritabilidade, agitação e birra são expressões de comportamento que estão "dizendo" alguma coisa. Em geral, são reações a medos, ansiedade, frustrações. As crianças falam de diversas formas, dependendo da idade e da capacidade verbal ou não-verbal.
Os pais podem ajudá-las a reconhecer o que estão sentindo, ampliando o repertório de autoconhecimento e alfabetização emocional delas. Sentir raiva, por exemplo, pode deixar o coração batendo mais forte e dar vontade de gritar.
Perceber como as emoções se manifestam no corpo é o primeiro passo para compreendê-las e nomeá-las. Quando a criança sabe o que está sentindo, pode aprender a desenvolver estratégias simples de autorregulação com a ajuda dos cuidadores, como respirar fundo, dizer o que a está aborrecendo e pensar em outras maneiras de manifestar tudo isso.
Fontes: Cecy Dunshee de Abranches, psiquiatra da infância e adolescência, terapeuta familiar, membro do Departamento de Saúde Mental da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro e uma das autoras do livro "Saúde Mental da Criança e do Adolescente"; Ana Carolina C D'Agostini, psicóloga e pedagoga, mestre em psicologia da educação pela Universidade de Columbia, autora do livro didático "Se Liga na Vida", gerente editorial do Programa Semente e formadora e coordenadora de formações do Instituto Ame sua Mente; Rita Mira, pediatra, coordenadora médica do Serviço de Pediatria do Hospital Santa Izabel, na Bahia, e associada da Sociedade Baiana de Pediatria.
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